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A Tribuna (Santos, SP)

Estudo inédito quer avaliar larvas (1 notícias)

Publicado em 17 de maio de 2004

A zona costeira sofre, historicamente, diversos tipos de impactos humanos (antrópicos), tais como a expansão imobiliária, esgotos não tratados, despejos de substâncias tóxicas, lixo entre outras. Isso sem falar na coleta de moluscos ou crustáceos, seja para isca de pesca ou, em certas áreas, para consumo humano. Na região da Baixada Santista, por exemplo, é muita conhecida a presença de um pequeno crustáceo apelidado popularmente de 'corrupto' (Callichirus sp). A sua captura, aliás, está proibida em todo o litoral paulista, em decorrência de sua coleta indiscriminada. Os corruptos também são crustáceos decápodes, parentes do ponto de vista evolutivo das tatuíras. São criaturas com características muito curiosas. Segundo o professor de Ecologia dos Ambientes Bentônicos (fundo do mar), Antonio Augusto Flores, da Universidade Estadual Paulista (Unesp — Campus São Vicente), os corruptos (como as tatuíras) vivem na chamada zona de areia das praias constantemente invadida pelo mar, no seu processo de subida e descida das marés. Machos e fêmeas não vivem juntos. Eles ocupam posições verticalmente diferentes na faixa de areia, uns mais acima dos outros. Só se encontram nos períodos de acasalamento, quando os túneis que constroem acabam se interconectando. Tirar um corrupto de seu túnel é morte certa, segundo Flores. "É nesses buracos que ele vive por toda a vida. Se for retirado, não conseguirá fazer novo túnel e morrerá", explica o pesquisador da Unesp-SV. De ré Os corruptos andam 'de ré', se alimentam por meio de antenas cheias de 'cerdas' que captam o fitoplâneton em suspensão na água. De acordo com a literatura científica, algumas espécies de corruptos medem poucos milímetros, enquanto outras, como as que habitam lagoas formadas por corais, chegam a medir até 30 centímetros. O gênero Callichirus possui cerca de 90 espécies no mundo, sendo que só na Austrália foram registradas cerca de 60 espécies. No Atlântico Ocidental são cerca de seis espécies. Por ser um animal que se alimenta filtrando nutrientes da água do mar, o corrupto não é aconselhável em termos de alimentação, pois junto com o alimento pode também reter partículas poluentes, inclusive metais pesados (substâncias tóxicas, cancerígenas e mutagênicas). Larvas As fêmeas dos 'corruptos' produzem cerca de 40 mil ovos a cada acasalamento, que eclodem em cerca de 30 dias. As larvas, diminutas, são levadas pelas correntes e dispersas ao longo das praias. Há um ano, o professor Flores, natural de Lisboa (Portugal), dedica-se ao estudo da variabilidade da produção e assentamento de larvas nas praias. O projeto é realizado em Ubatuba, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (Fapesp). O seu objetivo é tentar entender os mecanismos que regulam o suprimento dessas larvas, tais como os ventos e as correntes marinhas. "Entender os processos físicos que levam vida às zonas costeiras é importante não só para a pesca, como também para a manutenção das comunidades marinhas", explica Flores. O estudo, que deve estar concluído até 2007, é pioneiro no litoral paulista. As evidências encontradas sejam no trabalho do professor Flores ou da pesquisadora carioca Valeria Gomes Veloso, serão fundamentais para orientar ações futuras. Por isso, da próxima vez que estiver passeando pela praia, lembre-se que sob seus pés há vida, muita vida. Conhecer detalhadamente o que afeta essas criaturas, desvendar as inúmeras variáveis que comprometem o seu equilíbrio é, também, garantir a nossa qualidade de vida.