São Paulo. (AE) - Pesquisadores do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP) descobriram a causa genética de uma forma raríssima de doença neuromuscular que, pelo que se sabe, ocorre apenas em um grupo de famílias brasileiras. A mutação teria surgido mais de um século atrás, em Minas Gerais, e passada de pai para filho desde então. Hoje está distribuída pela árvore genealógica de pelo menos sete grandes famílias de vários Estados.
"Fizemos o mapeamento do genoma e encontramos a mesma mutação em todas elas", diz a pesquisadora Agnes Nishimura, principal autora do estudo. "Ainda não conseguimos ligar todas as pessoas, mas sabemos que têm um ancestral comum." A mutação está localizada no cromossomo 20 e já apareceu cm pelo menos 200 das mais de 1.500 pessoas das sete famílias reunidas. Tanto em homens quanto em mulheres.
Um aspecto importante identificado pela pesquisa é que a modificação, apesar de ser idêntica para todos, pode dar origem a três doenças diferentes: atrofia espinhal progressiva e duas formas (típica e atípica) de esclerose lateral amiotrófica (ELA) - doença que afeta o físico Stephen Hawking. Duas delas tem progressão mais lenta e sobrevida que pode chegar a 20 anos após o aparecimento dos primeiros sintomas, enquanto a ELA típica leva à morte em dois ou três anos. Todas envolvem degeneração dos neurônios motores.
"Se conseguirmos entender o que protege algumas pessoas portadoras da mutação de ter uma evolução rápida, poderemos ter pistas muito importantes para um futuro tratamento", disse a geneticista Mayana Zatz, diretora do centro e orientadora da pesquisa.
Diagnóstico
Por enquanto não há cura, mas só a identificação da mutação já é um avanço tremendo para os integrantes das famílias. "Desde pequena eu sabia que havia uma doença na família e que eu poderia ter, mas não sabíamos o que era", conta a médica Silvia Beatriz Costa Valle, de Brasília. "Até ter o diagnóstico foi muito angustiante. Eu sentia os sintomas e procurava os médicos, mas ninguém descobria nada. Agora sei que a realidade é essa e posso me preparar."
Com 48 anos e mãe de dois filhos, Silvia tem também a tranqüilidade de saber que, caso eles sejam portadores, poderão optar por uma técnica de fertilização in vitro e evitar que a mutação seja passada para seus netos, por meio da seleção de embriões. Ou, quem sabe, se beneficiar de um futuro tratamento.
Os cientistas agora estudam como a proteína defeituosa produzida pelo gene imitado, chamado VAP-B, atua nas células nervosas. A pesquisa indica que elas se prendem a outras proteínas e formam pequenos aglomerados, que acabam danificando o neurônio. "Se pudermos evitar o acúmulo dessas proteínas, pode ser uma forma de controlar a doença", explica Agnes. Ela aponta ainda que o mecanismo pode ser importante em outras doenças do neurônio motor. A mutação identificada foi batizada de ELA-X, dentro das nove formas genéticas conhecidas da doença.
O trabalho, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), está publicado na versão online da revista "American Journal of Human Genetics".
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O Imparcial (Presidente Prudente, SP)