A região central de São Paulo tem a maior concentração de moradores que foram hospitalizados pelo novo coronavírus ou por síndrome respiratória aguda grave (SRAG). É o que indica um estudo feito por pesquisadores do LabCidade, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), em parceria com o Instituto Pólis. A pesquisa analisou a capital e mais 25 cidades da região metropolitana e os dados se referem aos números capitados até o dia 18 de maio.
Os pesquisadores cruzaram informações do DataSUS sobre pessoas hospitalizadas em hospitais públicos e privados, através do CEP residencial fornecidas por elas aos sistema de saúde. A partir dessas informações, eles elaboraram um mapa que indica quais são as ruas e os bairros com maior concentração de pessoas hospitalizadas por Covid-19 ou SRAG. No mapa da FAU-USP, quanto mais escura a mancha, maior a concentração de hospitalizações num raio de um quilômetro.
O mapa não mostra o número exato de cada rua, mas sim aproximado. O entorno do Largo do Arouche em um raio de um quilômetro — entre os bairros de Santa Cecília, República e Higienópolis —, é a região com maior concentração de moradores dali que foram hospitalizados por problemas notificadas como Covid-19 ou SRAG.
Os pesquisadores só conseguem ter o número exato de internações por CEP analisado. Mas eles estimam que, dentro desse raio do Largo do Arouche, tenham sido cerca de 200 pessoas hospitalizadas.
Esse índice foi medido desde a primeira hospitalização, em fevereiro, até o dia 18 de maio. O estudo não foi atualizado após essa data pois o Ministério da Saúde tirou recentemente de sua base de dados, entre informações como o CEP das pessoas hospitalizadas.
"Infelizmente continuar a pesquisa ficou inviável. A base que utilizamos foi modificada para esconder a informação sobre o CEP", explica Pedro Henrique Mendonça, estudante de Arquitetura e Urbanismo da USP que elaborou os mapas do estudo.
"Essa pesquisa mostra que o vírus não se comporta de forma igual, pois a cidade de São Paulo é muito grande. Quando vemos quais são os pontos com mais moradores hospitalizados, podemos pensar em políticas de prevenção mais localizadas, e não tão genéricas", afirma a coordenadora do LabCidade e professora da FAU-USP, Raquel Rolnik.
A região da Brasilândia também tem alta concentração de hospitalizações: são cerca de 110 casos a partir do epicentro da região —ou seja, a partir do CEP número de pessoas hospitalizadas dentro da região. “Diferente da região central, que teve mais internações em março e abril, os casos da Brasilândia começaram um pouco mais tarde, e estão se mantendo ao longo do tempo, ou seja, continuam acontecendo”, explica Mendonça. "Cruzar as hospitalizações com o CEP residencial é importante, pois são pessoas que moram na mesma rua, frequentam o mesmo mercado, por exemplo", aponta o estudante.
A prefeitura da capital já divulga a divisão do número de infectados por Covid-19 por distritos. "Mas cada distrito tem o tamanho de uma cidade. A gente não conseguia dizer se, em um distrito, a concentração estava em um bairro mais nobre ou em uma favela", explica o estudante Mendonça. "Já é costume tentar explicar esses fenômenos a partir da pobreza, mas isso não necessariamente se mostrou verdade", aponta Mendonça.
Algumas regiões com habitações mais precárias não registraram números altos de hospitalizações por corona. O raio em torno do pior epicentro do distrito de São Rafael, por exemplo, teve apenas cerca de 20 hospitalizações estimadas. Do outro lado, em um raio medido do epicentro da Pompeia, bairro nobre da Zona Oeste de SP, foram cerca de 100 hospitalizações. "Esse foi um dos dados que confirmou nossa hipótese de que não necessariamente há uma relação entre o tipo de habitação e os índices de coronavírus", diz ele.
Santa Cecília
Algumas hipóteses do motivo do bairro de Santa Cecília, por exemplo, estar entre as localidades com alta concentração de hospitalizados é o grande número de profissionais da saúde que moram nesse bairro, segundo os pesquisadores. Eles também trabalham com a hipótese de que a proximidade com terminais de transporte público pode afetar mais os moradores dessas regiões.
"Esse eixo ainda está sendo estudado, e, se for comprovado, pode ajudar a pensar em políticas públicas para melhorar a situação do transporte na cidade com a pandemia", explica Rolink, professora da FAU-USP.
O estudo considera, além dos hospitalizados por Covid-19, aqueles hospitalizados por SRAG. Isso se deve à subnotificação dos casos de coronavírus. "Percebemos que os locais com mais hospitalizações por Covid-19 também são os locais com mais hospitalizações por SRAG. Acreditamos que pelo menos parte dos casos de SRAG podem ser, na verdade, Covid-19", diz a coordenadora do LabCidade.
Rolnik ressalta a importância do retorno dos dados divulgados pelo Ministério da Saúde. "Tudo que desapareceu precisa voltar o quanto antes. Precisamos tratar de coronavírus com precisão", afirma ela.