Pessoas que praticam, de forma regular, exercícios físicos podem reagir melhor a infecções pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2). No entanto, a proteção extra que as práticas esportivas, como corridas, conferem ao nosso sistema imunológico pode não ser suficiente para alterar o desfecho de um caso grave da COVID-19. Uma pesquisa brasileira não encontrou diferenças no tempo de internação, na necessidade de ventilação mecânica ou de tratamento intensivo entre grupos que se exercitam frequentemente ou não.
O estudo foi feito com 209 pacientes diagnosticados com casos graves da COVID-19. Os voluntários da pesquisa estavam internados no Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) e no Hospital de Campanha do Ibirapuera, ambos na capital paulista. A conclusão do preprint — estudo ainda não avaliado por outros pesquisadores —, publicado na plataforma medRxiv, é de que o hábito de se exercitar não foi determinante para o melhor enfrentamento da doença, quando internados.
Prática de exercícios e coronavírus
“Esse estudo serve como um sinal amarelo para a população que se exercita com regularidade e, por isso, acredita estar totalmente protegida. Não encontramos diferença de prognóstico e desfecho da doença entre os pacientes graves mais ou menos ativos. Isso mostra que os benefícios da atividade física existem, mas aparentemente vão só até um ponto da gravidade da doença”, explicou o professor da FM-USP e autor do estudo, Bruno Gualano, para a Agência Fapesp.
De forma geral, a prática de atividade física tem efeito protetor contra doenças crônicas e pode fortalecer o sistema imune, o que melhora a resistência para algumas doenças respiratórias. “O exercício físico tem um efeito sistêmico. Melhora a resposta imune e as condições metabólica e cardiovasculares do indivíduo. Esses fatores podem trazer proteção contra diversos tipos de doenças crônicas e algumas infecciosas também. Mas, quando o quadro se agrava, outros preditores podem ser mais decisivos para o desfecho clínico”, afirmou o pesquisador Gualano.
No cenário dos casos graves da COVID-19, a presença de fatores de risco — como obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares e idade avançada — pode ser mais determinante do que a prática pregressa de exercícios, por exemplo. Vale destacar, no entanto, que a conclusão não descarta os benefícios das atividades físicas.
Os voluntários do estudo tiveram seu histórico de atividade física no trabalho, no esporte e no lazer avaliado assim que foram hospitalizados. Além disso, tiveram o diagnóstico da COVID-19 confirmado através de um exame do tipo RT-PCR. Para serem enquadrados em um caso grave da infecção por coronavírus, os pacientes deviam apresentar: dificuldade para respirar (mais de 24 respirações por minuto); e índice de saturação de oxigênio no organismo menor do que 93%.
O que afeta a COVID-19?
De forma complementar, uma pesquisa online — desenvolvida com 938 brasileiros que contraíram COVID-19 — apontou que a prevalência de hospitalização pela doença foi 34,3% menor entre os voluntários considerados ativos. Para entrar nessa categoria, a pessoa deveria praticar pelo menos 150 minutos por semana de atividade física aeróbica de intensidade moderada ou 75 minutos de alta intensidade.
“O nosso trabalho complementa os resultados obtidos com os casos mais leves da doença. Os estudos existentes avaliaram, principalmente, pessoas em estágios anteriores ao do nosso trabalho [em termos de progressão da doença], em que apenas a minoria dos pacientes necessitou de hospitalização”, comentou o pesquisador Gualano.
“É tudo muito novo e ainda são poucos os estudos que relacionam COVID-19, atividade física e sistema imune. No entanto, ao analisar o que temos publicado sobre o assunto, notamos que a atividade física poderia eventualmente ser considerada um bom preditor até certo estágio de gravidade da doença, prevenindo complicações. Mas isso não se revela verdadeiro nos casos mais críticos. É um recado importante para não se fiar tanto no histórico de atividade física como um fator absoluto de proteção contra a COVID-19”, explicou o professor.
Coronavírus em atletas profissionais
Agora, um grupo de pesquisadores da FM-USP investiga a resposta imune e casos da COVID-19 em atletas profissionais. “Pela condição fisiológica desses atletas de alto rendimento, é certo que eles agravam menos. No entanto, queremos entender se todos eles passam ilesos, sem sequelas, pela COVID-19”, comentou Gualano. Nessa análise, 75 jogadores serão companhados.
Esse estudo será realizado pela coalizão Esporte-Covid-19, formada por pesquisadores do Hospital das Clínicas, Hospital Israelita Albert Einstein, Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia e Núcleo de Alto Rendimento Esportivo, tem o apoio da Federação Paulista de Futebol e vai acompanhar as possíveis consequências da doença em jogadores de futebol.
Para acessar o estudo sobre casos graves da COVID-19 e a prática de exercícios, clique aqui.
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