Nessa quinta-feira (1), o Instituto Butantan publicou no New England Journal of Medicine os primeiros resultados do ensaio clínico da fase 3 da sua vacina contra a dengue. O imunizante feito com os quatro vírus atenuados evitou a doença em 79,6% dos vacinados em um período de dois anos, protegendo tanto quem teve dengue quanto aqueles sem infecção prévia. A publicação traz os resultados detalhados de eficácia após a imunização, divulgados no final do ano passado.
Trata-se de uma nova perspectiva para o combate da doença em meio ao aumento de casos no Brasil: nas quatro primeiras semanas de 2024, foram identificados 217.841 casos de dengue, com 15 mortes confirmadas e 149 sob investigação. Em 2023, foram registrados 1,6 milhão de casos até novembro, segundo o Ministério da Saúde. Além disso, a divulgação do estudo fortalece a possibilidade de aprovação da vacina pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
“Os dados de fase 3 são muito animadores. A publicação reforça a qualidade dos ensaios clínicos conduzidos pelo Butantan, a capacidade dos centros de pesquisa e cientistas envolvidos no projeto e o reconhecimento internacional do Instituto. Tudo isso só foi possível graças à colaboração generosa dos participantes que se voluntariaram para o estudo”, afirma Esper Kallás, diretor do Butantan e investigador principal.
A análise de eficácia do imunizante foi feita ao longo de dois anos de acompanhamento de 16.235 voluntários de todo o Brasil, com idades de dois a 59 anos, em 16 centros de pesquisa. Durante esse período, foram notificados apenas alguns casos de dengue entre os participantes. O estudo, que iniciou o recrutamento em 2016, segue até que todos os voluntários completem cinco anos de acompanhamento.
A proteção foi observada em todas as faixas etárias: 90% de 18 a 59 anos, 77,8% de sete a 17 e 80,1% de dois a seis anos. Em pessoas que já apresentavam anticorpos para a dengue, a proteção foi de 89,2%. Naqueles que nunca tiveram contato com o vírus, a eficácia foi de 73,6%. O imunizante teve o mesmo perfil de segurança em ambos os grupos, uma vantagem em relação aos disponíveis no mercado privado.
A tecnologia da vacina foi licenciada em 2009 pelo Instituto Nacional de Saúde Americano, que cedeu patentes e materiais biológicos referentes às quatro cepas virais que compõem o imunizante, permitindo que ele seja produzido e distribuído no Brasil. Em 2018, o Butantan assinou um acordo com a multinacional MSD, que trabalha em uma vacina análoga, em uma ação conjunta para acelerar os estudos e registro do produto.
As fases 1 e 2 do ensaio clínico, desenvolvidas entre 2010 e 2015 mostraram que a vacina induz produção de anticorpos contra os quatro sorotipos do vírus. Para os sorotipos 1 e 2, que circularam no período do estudo, a eficácia foi de 89,5% e 69,6%. Em relação à segurança, a maioria das reações adversas foi de leve a moderada: dor e vermelhidão no local da injeção, dor de cabeça e fadiga. Eventos adversos sérios foram registrados em menos de 0,1% dos vacinados, e todos se recuperaram totalmente.
Uma grande vantagem potencial da candidata a imunizante do Butantan é que uma dose foi suficiente para fornecer uma proteção robusta contra a dengue, enquanto que outras vacinas aprovadas exigem duas ou três doses. O esquema de dose única é muito mais favorável, principalmente durante epidemias, pois induz a proteção da população em um curto espaço de tempo, ajuda a alcançar uma maior cobertura vacinal e traz vantagens logísticas e econômicas.