Geógrafa e pós-doutora Maria Encarnação Beltrão Sposito explicou ao g1 que o processo se refere à tendência de composição da cidade de modo menos integrado do que no passado.
Estudo analisa fragmentação espacial em dez cidades brasileiras — Foto: Equipe FragUrb (financiamento FAPESP)
Ao estudar dez áreas urbanas brasileiras, entre elas, oito cidades médias e dois distritos urbanos da Região Metropolitana de São Paulo (SP) , a pesquisa intitulada “Fragmentação Socioespacial e Urbanização Brasileira: Escalas, Vetores, Ritmos, Formas e Conteúdos”, coordenada pela pós-doutora e professora titular da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp) em Presidente Prudente (SP) , Maria Encarnação Beltrão Sposito, realiza, nesta sexta-feira (18), um de encerramento com os membros da equipe em um evento fechado, no próprio , que contará com diferentes atividades ao longo do dia. Já no dia 6 de novembro , o estudo será apresentado em um congresso da Universidade de Lisboa, em Portugal.
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Ao g1 , a pesquisadora explicou que o processo estudado foi o de fragmentação socioespacial, que se refere à tendência de composição da cidade e da vida urbana de modo menos integrado do que no passado
Desta forma, o estudo visou a compreender, no plano da cidade e do urbano, como este processo altera o conteúdo da diferenciação e das desigualdades, redefinindo os sentidos do direito à cidade.
Maria Encarnação afirmou que o processo de fragmentação socioespacial pode ocorrer de três modos diferentes, por meio de:
dispersão do tecido urbano: a cidade cresce em território mais do que em população, aumentam os terrenos não ocupados e ao mesmo tempo a cidade fica marcada por descontinuidades;
práticas espaciais: os moradores vão se separando social e espacialmente em seus cotidianos, diminuindo os espaços que são compartilhados por diferentes classes sociais; e
imaginários sociais : modos como representamos coletivamente o que são os espaços bons e os demais nas cidades gerando práticas de evitação, segregação ou estigmatização territorial.
Segundo a geógrafa, a ideia para o estudo também surgiu de outras pesquisas realizadas anteriormente: uma primeira sobre espaços residenciais fechados e controlados por sistemas de segurança (o que, popularmente, são chamados de condomínios, embora nem todos sejam juridicamente condominiais); e uma segunda sobre as mudanças no comércio e no consumo, com o aumento da presença de shopping centers , hipermercados, lojas de franquias ou de grandes redes comerciais e de serviços.
“Nestas duas pesquisas, já emergiam observações claras de que há cada vez maior separação entre os grupos sociais nas cidades”, pontuou a pesquisadora ao g1
Geógrafa e professora pós-doutora Maria Encarnação Beltrão Sposito atua no campus da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Presidente Prudente (SP) — Foto: Redes sociais
Ao todo, participaram da pesquisa 130 pessoas , que integram diferentes universidades brasileiras:
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa);
Universidade Estadual do Ceará (Uece);
Universidade Federal da Grande (UFGD);
Universidade Federal Fluminense (UFF);
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS);
Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ);
Universidade Federal do ABC (UFABC);
Universidade Federal de Uberlândia (UFU);
Universidade do Estado do Amazonas (UEA)
Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS);
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); e
Universidade Estadual Paulista (Unesp).
Além da Université de Paris e da The London School of Economics and Political Science.
Maria Encarnação pontuou que a maior parte dos pesquisadores doutores e estudantes que integraram o estudo foram do da Unesp, em Presidente Prudente, que sediou e coordenou a pesquisa.
Ela também explicou que os alunos eram, principalmente, do curso de geografia , mas o trabalho também contou com a participação de estudantes de arquitetura e urbanismo
Para pesquisa, a geógrafa afirmou que foram analisadas as cidades de:
- Chapecó (SC),
- Dourados (MS),
- Ituiutaba (MG),
- Marabá (PA),
- Maringá (PR),
- Mossoró (RN),
- Presidente Prudente,
- Ribeirão Preto (SP),
e os distritos urbanos de:
- Cidade de Tiradentes, em São Paulo (SP), e
- Pimentas, em Guarulhos (SP).
Além disso, foram priorizados quatro temas centrais:
centro, centralidade e mobilidade urbana;
práticas espaciais e cotidiano;
espaços públicos; e
produção da habitação.
Mapa produzido sobre a cidade de Presidente Prudente (SP) — Foto: Equipe FragUrb (financiamento FAPESP)
Assim, pelos resultados de três frentes metodológicas diferentes, sendo elas grupos focais, entrevistas e percursos, foi analisado que a mobilidade urbana em Presidente Prudente sofreu retrocessos nos últimos anos.
“De um lado, os mais pobres foram morar ainda mais longe, de outro, o transporte coletivo não oferece a cobertura espacial e a frequência necessária aos deslocamentos. Assim, o transporte coletivo vai sendo substituído pelo individual, como carros, motos, Uber e outros aplicativos. Em algumas situações, os que moram mais distantes se movimentam menos, ou seja, ficam mais circunscritos a seus bairros periféricos. Em outras situações, aumenta o peso do custo do transporte nas despesas mensais das famílias. Essa tendência amplia a separação socioespacial entre o Norte e o Leste da cidade, onde moram os estratos sociais de menor poder aquisitivo, e o Sul e o Oeste, onde estão a classe média, a elite, sendo essa é uma das expressões da fragmentação socioespacial”, contextualizou a pesquisadora ao g1
Além disso, Maria Encarnação ressaltou que a pesquisa não é voltada ao planejamento da cidade e, por isso, não teve o objetivo de oferecer ideias ou propostas. Entretanto, ela disse que isso acaba ocorrendo e destacou alguns pontos para a melhora da mobilidade urbana:
a necessidade de revisão total do sistema de transporte urbano, hoje, ainda organizado por linhas centro-periféricas, ainda sem articulação entre modais e com conforto reduzido em terminais urbanos; a importância de valorização de espaços públicos, tanto os mais importantes da cidade, com destaque para o Parque do Povo, mas também os periféricos. Nestes espaços, a vida urbana ocorre e há possibilidade de encontro entre os diferentes, se forem espaços bem cuidados, equipados e que sejam atendidos por programas esportivos e culturais; e o desenvolvimento de políticas públicas que sejam capazes de promover equidade territorial (mais investimentos nas áreas mais pobres, para compensar as dificuldades de renda das famílias).
Ao g1 , a geógrafa destacou a importância em falar sobre a mobilidade urbana e o que ela representa para uma cidade.
“A mobilidade urbana é essencial. Por meio dela é que podemos viver a cidade de modo pleno. Realizar percursos que conectam as áreas residenciais ao trabalho, ao lazer, ao consumo, enfim, à vida social, política e econômica. Quando a mobilidade urbana se realiza de forma adequada, podemos considerar que há justiça espacial, ou seja, estão oferecidas as condições para todos, independentemente das condições socioeconômicas, ir e vir, apropriar-se de tudo que a cidade oferece”, explicou Maria Encarnação.
Ela também complementou que o transporte individual pode ampliar problemas sociais e ambientais
“A opção pelo transporte individual amplia as diferenças sociais, aumenta o tráfego e traz problemas ambientais. Valorizar o transporte público de qualidade, favorecer a circulação por bikes ou para pedestres são as formas mais avançadas observadas em cidades em que se considera que a qualidade de vida é essencial ", pontuou ao g1
A pós-doutora informou que os resultados da pesquisa serão publicados em quatro livros que já estão sendo encaminhados para a editora.
Além disso, foram publicados artigos e apresentados os resultados em congressos científicos no Brasil e no exterior.
Para tornar mais acessível esses dados, a especialista explicou que o grupo está providenciando a disponibilização de vídeos curtos, de cinco minutos cada, com os resultados das pesquisas de todos os participantes. E que, a partir do começo de novembro, eles estarão já no , que já conta com as publicações sobre o tema em cada cidade.
Além disso, Maria Encarnação ressaltou que o estudo já está sendo apresentado em vários congressos.
“O relatório final será encaminhado no começo de novembro à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), que financiou o estudo e que ofereceu dezenas de bolsas para estudantes de vários níveis”, finalizou a especialista ao g1