Embora seja uma doença muito antiga, a malária ainda é um dos maiores problemas de saúde pública do mundo. A cada ano, mata cerca de dois milhões de pessoas, sendo 90% dos casos registrados na África. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), essa é a doença tropical e parasitária que mais causa problemas sociais e econômicos, sendo um risco de infecção para cerca de 40% (2,5 bilhões de indivíduos) da população mundial. No Brasil, só no ano passado foram quase 500 mil casos da doença, sendo 99,8% registrados na região da Amazônia Legal, composta pelos estados do Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.
Esta realidade fez com que a Fundação de Amparo à pesquisa do Amazonas (Fapeam) sugerisse a criação de uma Rede Nacional de estudos sobre a doença. A Fapemig e as Fundações de Amparo à Pesquisa do Pará (Fapespa), Maranhão (Fapema), Mato Grosso (Fapemat), São Paulo (Fapesp) e Rio de Janeiro (Faperj) se uniram à Fapeam para a concepção do projeto.
No dia 17 de novembro, as sete FAPs participantes se reuniram com o Ministério da Saúde e o CNPq a fim de efetivar uma parceria e avançar no processo de criação e implementação da rede. Após esse encontro, o Ministério da Saúde anunciou o investimento de R$ 10 milhões na rede de pesquisa. A Rede Nacional de Malária terá, assim, R$ 30 milhões para financiar as primeiras pesquisas integradas sobre a doença, que serão prioritariamente voltadas ao desenvolvimento de vacinas e no mapeamento genético dos vetores, além do aprimoramento de serviços de atendimento à população.
Contribuição mineira
“A Fapemig vai entrar com investimentos da ordem de três milhões de reais, sendo um milhão de reais por ano”, declara o presidente da fundação, Mario Neto Borges. Ele destaca duas grandes razões para a participação de Minas Gerais na rede. A primeira é por se tratar de uma doença negligenciada, ou seja, que afeta milhares de pessoas ao redor do mundo e mesmo assim não dispõem de tratamentos eficazes. E a segunda é que o Estado possui pesquisadores de alto nível nesta área. Uma prova disto é que duas pesquisadoras mineiras, indicadas pela Fapemig, estão fazendo parte do comitê técnico da Rede de Malária. São elas, Antoniana Ursini Krettli e Luzia Helena Carvalho, do Centro de Pesquisas René Rachou.
Em Minas Gerais, assim como no resto do Sudeste, Sul e parte do Centro-Oeste, a doença foi erradicada. Mesmo assim, é muito importante a participação do Estado na Rede de Malária, já que as pesquisas desenvolvidas aqui serão de grande contribuição para a investigação da doença.
“O mosquito transmissor da malária está presente em todo o país, mas o doente não. O problema é que quando um sujeito viaja para a região amazônica e volta para casa contaminado, ele infecta o mosquito, iniciando assim um ciclo de transmissão”, explica a pesquisadora do René Rachou, Luzia Helena Carvalho, uma das integrantes do comitê técnico da rede. Segundo ela, este fato explica o surto de malária que ocorreu em Belo Horizonte no ano de 2003, e por isso pode-se dizer que a população de risco está em todas as regiões do Brasil.
Luzia Helena trabalha com pesquisa em malária há mais de 20 anos, sendo a representante da América Latina no MR4 - Malaria Research and Reference Reagent Resource Center – Centro de Referência e Investigação de reagentes da malária. O centro foi criado para ser uma referência de qualidade em pesquisas de malária e fonte oficial de informações de seus reagentes para a comunidade internacional de pesquisadores que estudam a doença.
A pesquisadora aponta a importância da criação da rede como uma forma de integrar grupos de estudo presentes em todas as regiões do Brasil.”Uma rede de pesquisa possibilita a troca de experiências de pesquisadores do país inteiro, difunde o conhecimento e forma uma massa crítica de estudiosos”, diz. Ela afirma que Minas Gerais possui grupos tradicionais de pesquisa sobre a doença, o que demonstra que o Estado tem muito a contribuir para o desenvolvimento da Rede Malária.
O René Rachou, do qual Luzia faz parte, é um dos mais antigos, possuindo mais de 30 anos de experiência na investigação da doença. Ao longo destes anos, o Laboratório de Malária do Centro de Pesquisas tem se dedicado à pesquisa básica e aplicada, estudando principalmente a interação dos plasmódios com seus hospedeiros. As principais linhas de estudos incluem a busca de novas drogas antimaláricas, desenvolvimento de marcadores que possam identificar indivíduos susceptíveis à doença e o aprimoramento de técnicas para diagnosticar indivíduos assintomáticos, ou seja, pessoas que possuem a doença mas não manifestam os sintomas.
Do ponto de vista da saúde pública, esta última linha de investigação é de grande importância, pois os indivíduos assintomáticos oferecem alto risco aos bancos de sangue, que não estão preparados para identificar este tipo de doente em seus exames de rotina. Essas pessoas podem ser fonte de infecção para os mosquitos. Luzia Helena também afirma que a formação de uma rede permite otimizar recursos, capacitar pessoal e ainda estimular pesquisas em locais que as desenvolvem. “Podemos dizer que a criação da Rede Malária é um momento histórico, principalmente para nós pesquisadores que temos dedicado nossas vidas ao estudo desta doença.”, completa a pesquisadora.
Entendendo a Malária
A palavra malária é originada do italiano mala aria, que significa “ar ruim”. Mas o surgimento da doença aconteceu bem longe dali, no continente africano. É uma doença infecciosa, causada por um protozoário unicelular, do gênero Plasmodium e transmitida de uma pessoa para outra, através da picada de um mosquito do gênero Anopheles, ou por transfusão de sangue infectado com plasmódios. Os sintomas da doença são intenso calafrio seguido de febre alta, vômitos, dores de cabeça e no corpo.
A malária é uma das principais doenças parasitárias e uma das mais freqüentes causas de morte em crianças com menos de 5 anos em países africanos. Entre as medidas que podem ser aplicadas para combater a malária estão o uso de repelentes e a utilização de tela nas janelas que impedem a aproximação dos mosquitos; a educação sanitária e o tratamento dos enfermos com medicamento.