Mesmo sem nunca ter tido contato com os pais, leitões originados de machos que passaram quatro semanas em celas apresentaram mais sinais de estresse, como aumento de níveis de cortisol; filhos de animais que tiveram espaço, banhos e estímulos táteis lidaram melhor com situações estressantes
Estudo apoiado pela FAPESP e publicado na revista Frontiers in Animal Science aponta que o modo de confinamento dos suínos machos – e não apenas das fêmeas, como se sabia – afeta profundamente a forma como os filhotes lidam com estresse, o que interfere no bem-estar desses animais.
Uma série de experimentos realizados na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP), em Pirassununga, mostrou que quatro semanas vivendo em celas são suficientes para que os machos tenham filhotes com alterações emocionais ligadas a medo e ansiedade, além de níveis elevados de cortisol na saliva quando expostos a desafios.
“Enquanto os óvulos são formados ainda na vida intrauterina da fêmea, os espermatozoides se formam a partir da puberdade e de forma contínua. Os machos, portanto, podem servir como sentinelas do que está acontecendo, dando a possibilidade de intervir para obter leitões com maior bem-estar”, explica Adroaldo José Zanella, professor da FMVZ-USP que coordenou o estudo.
O trabalho integra o projeto “A contribuição do macho para o desenvolvimento de fenótipos robustos e o papel mitigador do bem-estar das fêmeas suínas”, apoiado pela FAPESP e coordenado por Zanella.
Nos experimentos, 138 leitões com 25 dias de vida foram submetidos a testes comportamentais, para avaliar a emocionalidade, e análises de saliva, a fim de verificar níveis de cortisol, um indicador de estresse.
Apenas após a realização dos experimentos foram feitos testes de paternidade para determinar de qual tratamento veio o pai de cada leitão. Isso porque o sêmen dos animais em condições contrastantes foi misturado antes de inseminar as fêmeas, portanto, cada fêmea gestou leitões de vários pais.
Os doadores do sêmen que deu origem aos porquinhos foram submetidos, por quatro semanas, a um de três tipos de tratamento: ficaram em celas em que apenas se levantavam e deitavam, condições de alojamento utilizadas em criações comerciais; em baias individuais, com mais espaço; ou em baias individuais enriquecidas.
Nesta última, recebiam um banho diário e estímulos táteis: eram escovados diariamente e tinham acesso a feno para mastigar ou se deitar. Alimentação e disponibilidade de água foram iguais para todos os tratamentos.
Os pesquisadores demonstraram que as condições de alojamento dos pais influenciaram os comportamentos da prole. Em todos os testes comportamentais, filhotes dos machos suínos criados nas celas apresentaram modificações nos estados emocionais indicativos de ansiedade e medo.
Testes de saliva mostraram, ainda, um aumento dos níveis de cortisol após a aplicação dos testes comportamentais nos filhotes dos machos criados em celas e baias. Nos leitões cujos pais viveram em baias enriquecidas não houve diferença nas medições antes e depois dos testes.
Os resultados são condizentes com outro estudo do grupo, que usou os mesmos animais e tratamentos. No artigo, os pesquisadores mostram que os machos criados nas baias enriquecidas deram origem a mais leitões vivos e que sobreviveram ao primeiro mês de vida.
Além disso, os leitões originados dos machos suínos alojados nas celas tinham uma percepção maior da dor, um indicador de que o ambiente ao qual o pai é exposto alterou a percepção do filho, o que pode influenciar em seu bem-estar.