Referimo-nos ao Editorial da ''Tribuna Impressa" publicado no domingo 16 de maio do corrente. Trata-se, sem dúvidas, de um questionamento pertinente, expressão das inquietações que se impõem, com freqüência, quando se discute a relação entre a produção acadêmica e o interesse social.
O severo julgamento do Editorial retrata, talvez, tempos outros. Olhares preconcebidos ou, quem sabe, desinformados. Talvez decorrentes da falta ou insuficiente política de comunicação sobre o que vem sendo feito, na área da produção do conhecimento com retorno social em Araraquara.
Felizmente, os tempos em que se tentava, sem sucesso, a construção de elos entre a universidade e a sociedade mudaram. Nossas instituições de ensino superior, continuadamente avaliadas por índices de produtividade científica pelas agências de fomento podem, erroneamente, parecer, para uns e outros, como centros de conhecimento isolados em torres de marfim, como se ficassem à margem da vida. Entretanto, temos em nosso passado, em nosso presente, inúmeras expressões de que nossa comunidade acadêmica tem respondido, no plano do conhecimento, aos desafios trazidos pela sociedade em movimento. Além de vir crescentemente atendendo aos apelos da prestação de serviços fundamentais, sendo carros-chefe em parcerias firmadas com a prefeitura para atender às necessidades vitais da população, as universidades hoje desenvolvem também ações que as colocam como participantes indispensáveis do processo de desenvolvimento nacional. Nesse sentido, vem sendo aceita, por parte da comunidade acadêmica, a idéia de que a pesquisa universitária pode, ou melhor deve, interessar tanto aos poderes públicos quanto às empresas, não apenas porque seus resultados possam ser diretamente aplicáveis, mas porque ela treina pesquisadores e alunos na direção da concepção de novas tecnologias e de novas formas de gestão.
De fato, a crise da sociedade que temos atravessado tem imposto duros golpes ao financiamento da pesquisa mas, por outro lado, tem exigido dos pesquisadores mais e mais, o compromisso de produzir conhecimento com retorno social.
Para não ficarmos em retóricas que poderiam ser evasivas, lançamos mão de exemplos de nossa própria trajetória acadêmica. Comecemos pela Unesp, olhada neste mais de meio século de existência com pré-julgamentos e, porque não dizer, preconceitos por parte da sociedade e, em contrapartida tendo, comprovadamente, nas varias áreas do conhecimento, um notório reconhecimento. Não apenas pelos prêmios acadêmicos, pelos livros publicados, pelas inúmeras vezes que seus pesquisadores levaram o nome de Araraquara para outras partes do mundo. Uma brevíssima referência nos leva a ressaltar pesquisas na área das Ciências Farmacêuticas e Bioquímicas, importantíssimas para o início do diagnóstico da Aids na cidade, no atendimento realizado pelo Hemocentro, na produção alternativa de medicamentos. Nesta mesma área desenvolve-se importante segmento do projeto Genoma Funcional, apoiado pela FAPESP, que vem apresentando avanços significativos no conhecimento científico com retorno social.
A tradição do Instituto de Química em aproximar a ciência dos interesses sociais por meio da interação da Universidade-Empresa data de longo tempo. Podem ser citados como alguns poucos exemplos destas ações geradoras de inovações, de transferência de tecnologias com bons frutos tanto para as empresas como para as universidades, pesquisas nas áreas de resistência de materiais, monitoramento de gasolina, resíduos sólidos, resíduos de pesticidas, análise de águas. Mais recentemente, destacam-se estudos de novas ligas de alumínio, desenvolvimento de fibras ópticas, transformação do lixo orgânico, dentre outros. Nossa contestação ao editorial não se resume ao que vem sendo produzido, em muitas outras áreas do saber, às universidades públicas. Reportamo-nos, no presente, ao Centro Universitário de Araraquara, UNIARA, no qual estamos na coordenação de um Programa de Mestrado Multidisciplinar em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente, recomendado pela Capes. Sem falsas modéstias, as pesquisas emergentes neste mestrado, na área das políticas públicas, na gestão de recursos hídricos e sólidos, nas novas relações construídas entre o mundo empresarial e as dimensões ambientais apontam para um caminho frutífero de parcerias e de efetiva constituição de uma agenda regional de desenvolvimento. As dissertações de mestrado em preparação e as já defendidas pelos alunos têm revelado efetivas ligações com a realidade social. Cabe destacar dentre os projetos docentes, projeto relacionado ao Estudo de Assentamentos Rurais como estratégia de geração de trabalho e renda, financiado pelo CNPq, projeto de Desenvolvimento Regional e Políticas Públicas, voltado para a construção de políticas públicas de caráter regional, financiado pela FAPESP e realizado em parceria com o Departamento de Administração Pública da UNESP, e um projeto referente ao estudo de organismos vivos em águas superficiais, ligado ao projeto BIOTA, também financiado pela FAPESP. Todos podem ser considerados exemplos de geração de conhecimento, produção científica e elevado interesse social.
Ainda com relação a UNIARA, nas áreas de Fisioterapia, Fonoaudiologia, das Ciências Biológicas, da Nutrição e Direito e das Engenharias, há pesquisas diretamente relacionadas aos interesses da comunidade. Muitas delas realizam-se por meio do Programa de Iniciação Científica em desenvolvimento na instituição desde 1999.
Podemos ainda tomar como exemplos recentes temas que estão na vanguarda de uma agenda de pesquisas voltada à área ambiental, como a oficina de reciclagem de lixo e as parcerias de coleta seletiva. Essas experiências no limite de suas possibilidades envolvem alguma forma de desenvolvimento tecnológico e científico, além de seu caráter educativo. Particularmente na área da Saúde, cabe destacar experiências voltadas ao controle da obesidade, à mastectomia nas quais há comprovadamente produção de um saber. Há ainda um projeto voltado ao atendimento da criança com comprometimento de crescimento e desenvolvimento, que envolve profissionais de diversas áreas do conhecimento e tem gerado, além de atendimento à comunidade, artigos científicos publicados em revistas especializadas de âmbito nacional.
Sem pretender transformar esta resposta ao Editorial em uma discussão teórica, gostaríamos de tão somente destacar a importância e a compreensão do significado da produção científica enquanto processo de geração e ampliação de conhecimentos que envolvem não apenas objetivos imediatos. A pesquisa básica, muitas vezes identificada como de pouca aplicabilidade, pode ser fundamental a processos posteriores de geração de inovações e de tecnologias.
É claro que a UNIARA ainda está em uma trajetória inicial de pesquisa. Mas para que não sejamos acusados de cometer o "pecado do distanciamento da comunicação" (sic) gostaríamos de convidá-los a conhecer nossas experiências de pesquisa e os frutos da produção do conhecimento aqui semeados.
Profas.Dras. Vera Lúcia S. Botta Feirante e Helena Carvalho de Lorenzo - Coordenadora e Vice Coordenadora do Mestrado em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente - UNIARA
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