Em entrevista ao Portal Ripa, professor de Engenharia Aeronáutica da USP de São Carlos James Rojas Waterhouse e empresário fabricante de aviões pela Aeroálcool Tecnologia, com sede em Franca (SP), e pesquisa o motor movido a álcool para aviões há sete anos.
Ripa: Quais usos dos aviões agrícolas?
JW: O avião tem diversos usos na agricultura. Para pulverizar defensivo e metarrizo (agente biológico contra a cigarrinha, que ataca a cana). Na germinação do arroz e no semeio da mucuna e outras leguminosas para fixar nitrogênio no solo, Na ferrugem asiática, fungo de grande agressividade, se tardar na pulverização, a safra quebra de 20% a 30% rapidamente.
Ripa: Há outras vantagens em relação ao trator?
JW: O trator esmaga a cultura, compacta o solo e é lento. O operador de tratores carece de instruções para lidar com agentes biológicos ou químicos de grande risco e prejudiciais à natureza. Muitas vezes, no final da operação, lavam o tanque dos tratores com água de rios e contaminam os mananciais. O avião é operado por um piloto, com formação e especialização para realizar o trabalho.
Ripa: Como aumentar o uso dos aviões no agronegócio?
JW: O uso é muito baixo, mas com a tecnologia do uso do álcool poderíamos fazer aviões menores. Com custo de R$ 18 por hectare, o avião é inviável para propriedades abaixo de cinqüenta hectares. Os Estados Unidos combatem mosquitos com o avião. No Brasil não se combate o mosquito da dengue com avião. Não adianta usar o avião uma vez por mês.
Ripa: Quanto a safra de grãos poderia ser ampliada com o uso do avião?
JW: Se tirarmos o avião, podem ocorrer quebras de safra da ordem de 50%. Toda a soja do planalto central é pulverizada com o avião. O mundo precisa de comida e energia (biomassa). Na Flórida, os americanos pulverizam com avião a laranja, que tem vazão (quantidade de produto por hectare) acima de 50 litros por hectare. Para o reflorestamento é uma mina de ouro por meio da fertilização.
Ripa: Qual é a capacidade de vôo de um avião agrícola?
JW: Os aviões brasileiros voam com 600 quilos em média de carga. A distância é sempre curta. As pistas são dentro da própria lavoura. Em caso de fertilização, o avião joga a carga em cerca de 30 segundos. Consome bastante combustível, mas tem que levar a carga.
Ripa: Como ocorreu o primeiro vôo comercial de uma aeronave movida a álcool?
JW: O primeiro avião movido a álcool foi produzido pelo Centro Técnico Aeroespacial. A tecnologia era “crua”. Em 1998, vi a possibilidade de fabricar aviões movidos a álcool. No final de 2001, fizemos o primeiro vôo comercial, na área de cana-de-açúcar, na cidade de Colina (SP). Demos início ao primeiro processo de certificação, antes da Embraer. O processo ficou incompleto por falta de capital.
Ripa: Como está a pesquisa com motor bicombustível para aviões?
JW: A pesquisa anda devagar, com capital próprio. Proporemos um projeto à Fapesp e à Finep. A viabilidade desse projeto passa pela melhoria em software e hardware, que exercem funções vitais dentro de um avião. O motor flex tem que ser inteligente, com software seguro, que ainda não sabemos fazer.
Ripa: Qual é a vantagem do motor bicombustível em aeronaves?
JW: Temos de desenvolver uma tecnologia que consuma gasolina ou álcool. Como em alguns lugares ele é mais barato, as pessoas buscam álcool onde conseguirem. A implantação de uma matriz de distribuição seria uma tarefa do governo, assim como fez com o automóvel. As condições tecnológicas acontecerão quando for rentável vender álcool nos aeroportos.
Ripa: Como é a formação de recursos humanos no setor aeronáutico?
JW: A USP formados 40 engenheiros por ano. Na Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte, o curso de engenharia mecânica tende para a engenharia aeronáutica. O Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), voltado para o meio militar, forma pouca gente. O mercado financeiro drena um número grande de engenheiros formados pelo ITA. Poucos cursos no Brasil têm nível elevado para formar bons técnicos e pilotos. Na década de 1940, se formava piloto em aeroclubes a custo e nível baixos, subsidiado pelo estado. Para os mecânicos, há disponível apenas uma bibliografia básica e mal traduzida no passado. Já a Federal Aviation Administration (FAA) norte-americana tem milhares de páginas na internet e centenas de livros.
Ripa: Como as autoridades vêem isso?
JW: Falta visão na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) A incompetência da matriz aeronáutica reflete na sociedade. Se o avião é caro porque a mecânica é ruim, há risco de cair e as seguradoras aumentam os prêmios. Tudo reflete no preço das passagens.