No lugar de gráficos desenhados na lousa, maquetes em três dimensões que podem ser tocadas pelos alunos. Feitas em materiais acessíveis como barbante, arame, massa de modelar, plástico, isopor e pregos, elas podem ser facilmente adotadas pelas escolas para facilitar o aprendizado de estudantes com deficiência visual.
Embora simples, a ideia extremamente original é produto de um longo estudo elaborado pelo professor de educação para a ciência Eder Pires de Camargo, formado pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Bauru, campus onde ainda ministra aulas.
A pesquisa, iniciada em 2005 durante o curso de pós-doutorado, resultou na publicação do livro “Saberes docentes para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de física”, lançado em 2013.
Ainda que tenha como foco a educação inclusiva de temas como óptica, eletromagnetismo, mecânica, termodinâmica e física moderna, a pesquisa possui um sentido mais abrangente, na medida em que busca caminhos para driblar as estratégias tradicionais de ensino, onde o professor usa, majoritariamente, a fala e a informação visual para se comunicar com os alunos.
E, ao transferir o conteúdo da lousa para modelos táteis, a pesquisa demonstrou que estas ferramentas não apenas incluem os alunos cegos nas aulas, mas também facilitam o processo de aprendizado dos demais estudantes, além de incentivar a interação entre os colegas de sala.
“Foi algo que constatamos junto a um grupo de 35 alunos do ensino médio de Bauru, sendo dois deles cegos, que fizeram parte do estudo”, pontua Camargo, que também é deficiente visual.
Novas estratégias
Nascido em Lençóis Paulista, Camargo começou a perder a visão aos 9 anos de idade e foram as dificuldades enfrentadas por ele que o motivaram a estudar novas formas de ensinar os alunos.
“Por sorte, encontrei pelo caminho muitos professores dispostos a me ajudar. Mas não havia método específico, as adaptações curriculares eram feitas de maneira mais instintiva do que planejada”, salienta.
O pesquisador destaca que, pelo método tradicional de ensino, mais de 90% da comunicação entre professores e alunos ocorre por meio da fala, audição e visão. Por este motivo, o estudante cego acaba recebendo apenas parte do conteúdo e, assim, fica impedido de aprender adequadamente e até mesmo formular perguntas sobre aquilo que está sendo ensinado.
Mas Camargo ressalta que as soluções apresentadas pelo estudo, embora representem um avanço, não são definitivas e precisam ser acompanhadas de novas formas de pensar, planejar e aplicar as aulas.
Estudo
Para encontrar mecanismos que possibilitassem a educação inclusiva de alunos deficientes visuais, o professor Eder Pires de Camargo passou um ano coletando dados com a ajuda de 20 estudantes de licenciatura em física da Unesp de Bauru e uma sala de 35 alunos do ensino médio de uma escola da cidade.
Na primeira etapa, os futuros professores de física foram desafiados a planejar materiais e atividades de ensino que permitissem a participação de alunos com e sem deficiência visual.
“Depois, esses futuros professores deram aulas de física para estes alunos. Para tanto, se dividiram em cinco grupos, de acordo com os temas: óptica, eletromagnetismo, mecânica, termodinâmica e física moderna”, detalha.
Segundo Camargo, os resultados foram surpreendentes. “A pesquisa mostrou que, em muitos momentos, o professor precisa, sim, utilizar estratégias específicas para os cegos, como o braile e as provas adaptadas. Mas ele também pode desenvolver técnicas multissensoriais que são adequadas para ensinar os dois tipos de alunos”, frisa.
Livro gratuito
Lançado em 2013 pela Editora Unesp, o livro “Saberes docentes para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de física” pode ser baixado gratuitamente no site www.editoraunesp.com.br.
A pesquisa que resultou na obra foi objeto do pós-doutorado do professor Eder Pires de Camargo, sob a supervisão do professor Roberto Nardi e com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Este é o terceiro livro escrito pelo autor sobre educação inclusiva para deficientes visuais e a versão impressa também pode ser comprada no site da editora pelo preço de R$ 30,42. Segundo Camargo, já há planos para a publicação de sua quarta obra, que deve propor modelos teóricos para melhorar a formação dos professores nesta área.