Em setembro, Vamberto Castro, servidor público aposentado de 63 anos, sentia dores nos ossos, usava a dose máxima de morfina e havia perdido peso. Morador de Belo Horizonte, ele chegou ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP em estado grave, com um linfoma não Hodgkins avançado. Um mês depois, ele se tornou o primeiro paciente da América Latina que conseguiu resultados muito positivos em um tratamento inovador contra o câncer.
Rosemary Castro, mulher de Vamberto, contou à EPTV que a doença chegou como uma grande surpresa para a família, pois o idoso sempre praticou esportes, não tinha vícios e tinha uma saúde "impecável". "A gente não imagina nunca que de repente possa aparecer uma doença dessa, que de minuto para outro, desestrutura tudo na vida da gente".
De acordo com o Jornal da USP, Vamberto lutava contra o câncer desde 2017, passando por radioterapia e quimioterapia, sem sucesso. A família do paciente então descobriu o nome de Renato Cunha, médico responsável pelo caso, porque ele havia ganhado um prêmio da Sociedade Americana de Hematologia (ASH, em inglês) para desenvolver o processo de produção de células CAR T no Brasil.
O aposentado e o filho vieram a Ribeirão Preto conversar com Cunha e seguiram em contato com o médico depois. Eles tentaram o tratamento com uso compassivo de um medicamento chamado Polatuzumab, porém, quando o câncer se espalhou ainda mais, decidiram insistir na possibilidade do CAR compassivo. Por sorte, a equipe de Cunha havia recém-finalizado as etapas de validação laboratorial do processo de produção das células.
CAR T-cell, do inglês, significa "célula T com receptor de antígeno quimérico". O complicado nome indica que o tratamento usa células geneticamente modificadas.
"O câncer, todo mundo sabe, é um desafio. Os tratamentos têm melhorado muito e esse tratamento com as células CAR T é um dos mais promissores que existem no momento. É um tratamento disponível em poucos países", afirma o médico hematologista Dimas Tadeu Covas, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e coordenador do CTC.
"Nós desenvolvemos uma tecnologia toda nossa, toda nacional, dentro de um instituto público, dentro de um hospital público, apoiado pela USP, pela Fapesp, pelo CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico] e pelo Ministério da Saúde. Portanto, (é) um tratamento que se destina aos nossos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS)", completa o professor.
Agora a família se prepara para voltar para casa, em BH, ainda no mês de outubro. "A todo momento, até aqui nesse momento, ele só dizia 'eu quero viver'. Graças a Deus, a gente conseguiu", comemora Rosemary.
Custo elevado
O principal problema da terapia com células CAR T é o custo. Segundo Covas, nos EUA, a produção das células e as despesas hospitalares, juntas, podem chegar a US$ 1 milhão (mais de R$ 4 milhões). Covas calcula que a plataforma brasileira poderá baratear o tratamento em até 20 vezes, na comparação com o custo de um produto comercial. Além disso, a ideia é que o CTC mantenha aberto o protocolo de produção de células CAR T, permitindo que outros laboratórios reproduzam as técnicas para cuidar de mais pacientes.
"Representa um grande avanço científico, porque é um tratamento muito recente, uma tecnologia protegida por segredos industriais. E, por outro lado, é um grande avanço em termos sociais. Vamos poder oferecer isso, daqui a algum tempo, para a nossa população", comemora o coordenador do CTC.
LEIA TAMBÉM
Hemocentro de Ribeirão reverte câncer com tratamento inovador