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Jornal da Cidade (Bauru, SP) online

Em projeto inédito no País, FOB/USP terá ‘casa’ para tratar sequela de AVC (1 notícias)

Publicado em 29 de setembro de 2016

Por Cinthia Milanez

Uma casa formada por duas salas de reuniões, um banheiro, uma sala de estar, uma cozinha e um escritório. Tudo isso dentro de três contêineres de aproximadamente 70 metros quadrados. Aconchegante, o ambiente será o cenário de um projeto inédito no Brasil, que está em fase de execução por parte da Faculdade de Odontologia (FOB/USP) de Bauru. O objetivo é tratar, de forma intensiva, uma das sequelas de pacientes que já tiveram Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Coordenadora da iniciativa, Magali de Lourdes Caldana, que também é fonoaudióloga e livre-docente da USP de Bauru, explica que a ideia partiu da pesquisadora norte-americana Janet Whiteside. Inclusive, ela a colocou em prática na faculdade onde atua, na Universidade da Flórida Central (UCF é a sigla em inglês), desde junho de 2010: é a chamada “Aphasia House” ou “Casa da Afasia”, em português.

O nome dado à residência é homônimo ao da sequela que será tratada dentro do novo espaço. “Construiremos uma casa de verdade. O objetivo é trabalhar a comunicação no ambiente mais próximo possível do familiar. Como ainda é um projeto, utilizaremos contêineres, porque não demora a construir. Depois, a ideia é implantar na nossa clínica de fonoaudiologia”, justifica.

Magali frisa que a afasia corresponde à alteração de comunicação decorrente de uma lesão, como o AVC, podendo afetar a expressão e a compreensão dos pacientes. Para tanto, há terapia, porém, no País, ele ocorre, em média, duas vezes por semana. A proposta é ampliar essa frequência, fato que a torna inédita.

A ideia é de que a “Casa da Afasia” fique dentro da FOB, perto da Clínica de Fonoaudiologia. Magali pretende realizar um tratamento de quatro horas diárias, durante cinco semanas. Tudo gratuito. O público-alvo só será selecionado em janeiro do ano que vem, faltando um mês para o início da parte prática do projeto, mas ela já adianta: para participar dessa fase de pesquisas, os pacientes deverão ter tido lesões recentes, ter sido acometidos por diferentes tipos de afasia pós-AVC e não poderão ter feito terapia anteriormente.

Por outro lado, Magali pontua que a “Casa da Afasia” possui um contraponto, que é a adesão propriamente dita dos pacientes. “Gente de fora de Bauru não tem como ficar viajando ou onde dormir e se alimentar, por exemplo. A iniciativa é gratuita, mas não banca viagem, hospedagem e alimentação. É um ponto que analisaremos bastante para verificar a viabilidade do projeto, assim que ele for concluído, em maio de 2018”, destaca.

Primeiro contato

Segundo a coordenadora da “Casa da Afasia”, já existe um convênio entre a UCF e a FOB. Em 2012, alguns professores de odontologia e fonoaudiologia da universidade bauruense visitaram a instituição norte-americana para formar possíveis parcerias.

Magali integrou esse grupo e teve o primeiro contato com o trabalho da pesquisadora Janet Whiteside. “Nos interessamos pela iniciativa, por ser inovadora no Brasil e porque acreditamos que a terapia fonoaudiológica deva ocorrer dessa maneira”, pontua.

Em 2014, as fonoaudiólogas Natalia Gutierrez Carleto e Elen Caroline Franco ficaram quatro meses na Flórida, acompanhando de perto o programa. “Em cima disso, elaboramos o nosso projeto, que foi aprovado pelo órgão de fomento”, revela.

E o dinheiro?

Segundo a coordenadora do projeto, ele foi aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em junho deste ano. O órgão de fomento, inclusive, já liberou a verba para sua execução, que totaliza aproximadamente R$ 179 mil.

Equipe

As fonoaudiólogas e doutorandas Natalia Favoretto e Cristina do Espírito Santo também integram o projeto, que tem uma parceria com a Unesp de Botucatu. De lá, participam um fonoaudiólogo, um fisioterapeuta e os neurologistas Luiz Eduardo Betting, Rodrigo Bazan e Gabriel Pereira Braga.

O professor da FOB José Roberto de Magalhães Bastos, a psicóloga Marina Bighetti Godoy e a enfermeira Vanessa Clivelaro Bertassi Panes também fazem parte da equipe.

Paciente vê projeto ‘com bons olhos’

O advogado Roberto Luiz Mattar, de 69 anos, teve um AVC em junho de 2013. “Senti tontura e comecei a vomitar. Em seguida, perdi o equilíbrio e minha fala ficou ‘amarrada’. Desde então, faço tratamento fonoaudiológico”, relata. Inclusive, a terapia de Mattar já dura mais de dois anos. Quando informado sobre a “Casa da Afasia”, o paciente ficou surpreso e viu “com bons olhos” a ideia de proporcionar um tratamento intensivo.

Mattar acabou se afastando da profissão que tanto o fazia feliz. “Também tenho dificuldade de escrever e achei por bem parar de advogar. Porém, a terapia ajuda muito, já estou quase 100%”, elogia.