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Em entrevista, Glauco Arbix discute nova mentalidade empresarial (1 notícias)

Publicado em 30 de outubro de 2006

Por Fábio de Castro

Uma nova mentalidade empresarial está nascendo no Brasil, com maior disposição das companhias para a inovação tecnológica e para a diferenciação de produtos. Para o professor do Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo (USP) Glauco Arbix, a tendência pode impulsionar a inovação no país e indicar o caminho para um novo modelo de pesquisa e desenvolvimento.
A reflexão feita por Arbix se baseia na recente Pesquisa sobre Atitudes Empresariais para Desenvolvimento e Inovação (Paedi), realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) e pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). A pesquisa, que será divulgada dentro de alguns dias, destaca empresas que adotaram práticas produtivas inovadoras com influência positiva no seu desempenho.
O levantamento se baseou em entrevistas com empresários. "Os dados sugerem a existência de uma nova mentalidade empresarial, indicando um comportamento diferente, mais orientado para a inovação tecnológica", afirma Arbix.
Os resultados foram apresentados durante a 30ª reunião anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), por Arbix e pelos coordenadores da pesquisa, Álvaro Comin (Cebrap) e Lenita Turchi (Ipea).
Em entrevista à Agência FAPESP, o professor da USP, que foi presidente do Ipea até maio de 2006, comentou as perspectivas abertas pelo surgimento do que classificou como um "novo empreendedorismo".
Agência FAPESP - Os dados obtidos pela pesquisa feita pelo Ipea e Cebrap podem ajudar a formular um novo modelo de inovação tecnológica no Brasil?
Glauco Arbix - Sim. A partir dela observamos os países que avançaram no sentido de melhorar a produtividade de seu parque industrial e deram saltos na capacidade produtiva. Países que requalificaram suas empresas e ajudaram a gerar novas companhias, com maior ênfase no conhecimento e capazes de agregar mais valor e, portanto, de trazer mais divisas para o país, melhorando a vida das pessoas e os salários. Todos esses países tiveram suas experiências sustentadas em processos de inovação.
Agência FAPESP - O que caracteriza um processo de inovação eficiente?
Arbix - A presença da pequena, da média e da grande inovação, que consigam marcar um diferencial para as empresas ao fazer com que elas apresentem algo distinto nos mercados e nos sistemas de comercialização. São esses processos que estabelecem a dinâmica da sociedade moderna. São processos embebidos de conhecimento. Temos obrigação de prestar atenção a eles, de nos preocuparmos com a melhoria do país em todos os níveis e, em última instância, com a melhoria da qualidade de vida da população.
Agência FAPESP - Ou seja, todos os atores sociais precisam participar.
Arbix - Quando se caracteriza um ambiente desse tipo, com políticas orientadas para estimular a inovação, está se alertando as autoridades públicas e sinalizando para as universidades, de forma que elas comecem a olhar com mais cuidado para a necessidade de fomentar, estimular, organizar, estruturar e implementar políticas que ajudem as empresas a inovar. Essa é a questão principal desse processo.
Agência FAPESP - Como é o perfil desse novo empreendedor?
Arbix - Os dados coletados na Pesquisa sobre Atitudes Empresariais para Desenvolvimento e Inovação são muito relevantes e mostram alterações comportamentais e estratégicas. Esse é um comportamento novo que nos chamou a atenção. Ao olhar com mais detalhes os dados, notamos que podemos caracterizar um corpo de novos empresários que entraram em cena a partir de 1985. Eles não foram acostumados a subsídios estatais, não viveram uma economia protegida, com empresas baseadas em auxílios governamentais. Eles criaram, com esforço próprio, novas maneiras de vencer nos mercados, aqui e fora do Brasil. Eles prospectam tendências e buscam conhecimento em universidades e centros de pesquisa do país e do exterior. Esse comportamento, que nos chamou a atenção, é o que chamamos de "novo empreendedorismo". Não queremos fazer com isso nenhuma definição rígida de conceito. É um processo que ainda estamos estudando, mas com certeza há alguma coisa nova no Brasil, que merece nossa atenção como pesquisadores e a atenção do Estado brasileiro, pois pode servir para alavancar nosso sistema produtivo.
Agência FAPESP - Qual é o papel da universidade nesse processo inovativo?
Arbix - Mais do que nunca essa questão está colocada para as instituições do ensino superior no Brasil. Não como uma forma de colocá-las como caudatárias das empresas ou algo do tipo. A universidade é autônoma e independente, tem que seguir seus próprios caminhos e estabelecer suas linhas de pesquisa. Mas é fundamental que ela esteja sintonizada com os esforços que o país faz para superar o atraso e subdesenvolvimento. Então, se as instituições estão sintonizadas - e isso depende de cada um acho que podemos dar um grande passo à frente.
Agência FAPESP - Pode-se dizer que é preciso, então, criar uma cultura de inovação?
Arbix - Exato. Sou totalmente contra qualquer idéia de intervenção, de definição ou de pauta vinda de fora, mas é fundamental que se amplie essa reflexão inclusive com os alunos. É a mesma necessidade que existe no meio empresarial: as empresas brasileiras inovam pouco por não terem uma cultura voltada para isso.