De que adianta discutir educação ambiental se a comunidade em geral não se sente parte integrante da questão? Diante disso e no esforço de motivar a comunidade, alunos e professores das Faculdades de Educação e Saúde Pública, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz e do Instituto Agronômico de Campinas uniram-se aos moradores de duas cidades do interior paulista no projeto temático Educação Ambiental e Representações da População, para pesquisar e difundir elementos sobre o ambiente dos municípios de Espírito Santo do Turvo e Vera Cruz.
Com o apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), o projeto vem há um ano fazendo o levantamento da fauna e flora dessas regiões. Nele são realizados estudos aerofotográficos das bacias hidrográficas e análises das condições de solo, entre outras coisas, contando sempre com a participação das comunidades locais. Um auxílio que não se restringe somente à coleta de dados, mas engloba principalmente a transmissão das informações colhidas, por meio das escolas e das associações municipais. "Nossa idéia básica é fazer com que a população participe conosco da coleta de elementos para análise sistêmica do ambiente. Só assim a preocupação com o ambiente, a vivência harmônica entre o indivíduo e o seu meio, que nós estamos esperando que ocorra, se fará de forma completa", explica a professora Myriam Krasilchik, diretora da Faculdade de Educação e uma das coordenadoras do projeto. A professora vai falar desse projeto nos debates do dia 14, na Sala do Conselho Universitário.
Sob a orientação de seus professores, os alunos de graduação têm realizado discussões e dado aulas para os moradores locais. Experiência que apresenta mão dupla no trânsito de conhecimentos, pois estudantes e moradores permutam vivências, problemas e soluções. "'Queremos avaliar o quanto o envolvimento da população realmente serve de base para uma ação ambiental sólida, que envolva não só a comunidade escolar mas as pessoas em geral", ressalta Myriam. Ainda em sua fase inicial, o projeto deve durar mais dois anos.
Afinal, o que é educação ambiental
A Constituição Federal, ao se referir ao meio ambiente, diz que cabe ao "Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e as futuras gerações". Contudo, como fazer isso? Procurando em escolas e sites na Internet, pode-se observar que muitas são as modalidades de educação ambiental. Suas atividades englobam desde a plantação de hortas até visitas a zoológicos e reservas ambientais.
Além disso, há uma eterna discussão sobre a concepção de educação ambiental. Para alguns, ela teria o sentido de ecologia; para outros, seria algo bem mais amplo, envolvendo noções de cidadania e direitos humanos. As correntes mais radicais pregam o idilismo, pelo qual todas as coisas devem permanecer como são na natureza; ou o catastrofismo, segundo o qual, se não forem tomadas certas medidas, o meio ambiente vai ficar completamente deteriorado e a vida vai se tornar impossível.
"Acho que educação ambiental é estabelecer um meio-termo entre essas visões, para que o sujeito possa compreender que ele pode viver de forma harmônica com o seu ambiente", define Myriam.
Em casa e nas escolas
Uma outra discussão diz respeito ao caráter disciplinar da educação ambiental. Ainda não se chegou a um consenso sobre qual a melhor forma de abordagem: transformar o tema em matéria obrigatória ou deixá-la difundida pelas demais disciplinas. "Essa é uma briga: saber se ela é de todos ou de ninguém", afirma a diretora. Segundo ela, ambas as posições apresentam virtudes e defeitos. Pertencendo ao currículo, a educação ambiental passa a ter seu próprio horário e professores responsáveis por ela, porém perde a amplitude interdisciplinar. Por outro lado, ao ser concebida como item de outras matérias, fica dependendo muito das pessoas e de sua disposição em inserir o tema. "Apesar de ser um pouco precoce, talvez a escola primária seja o lugar de criar um problema; a hora de mostrá-lo para as crianças e chamar a atenção delas para as questões ambientais. Fazer com que tenham a consciência de que estão dentro de um certo espaço e que há uma inter-relação entre elas e esse ambiente", ressalta Myriam.
Também os pais podem ajudar nesse processo de conscientização, fazendo com que seus filhos percebam a importância de viver em harmonia com o meio que os cerca. "O grande problema tanto em casa quanto na escola é manter uma coerência entre o que se diz e o que se faz. Depende do comportamento dos pais muito mais no agir do que no falar", alerta Myriam.
Universidades, ONGs e mídia
Desde a proliferação de temas relacionados à questão ambiental nos anos 70, são as Organizações Não-Governamentais (ONGs) que vêm desempenhando um papel fundamental. Trabalhando em parceria com o governo e instituições de ensino e pesquisa, elas promovem campanhas e discussões sobre, por exemplo, as relações entre homem e ambiente. "As universidades também têm sido importantes, mas não tanto quanto deveriam, principalmente no papel de influenciar as ONGs", reflete a diretora.
Um exemplo de empenho acadêmico foi a análise feita na Universidade de São Paulo pelos alunos da Faculdade de Educação sobre as condições ecológicas do campus da capital. Para Myriam, "essa é uma atividade importante para que, quando esses alunos forem professores, possam recompor semelhante experiência".
A professora destaca ainda o papel da mídia no que se refere às questões ambientais. De acordo com ela, a imprensa tem desempenhado uma importante função ao levantar os problemas. "A grande falha, no entanto, é que boa parte dessas questões aparecem contaminadas por aspectos puramente ecológicos e preservacionistas, perdendo-se assim a amplitude do problema. Além disso, muitas vezes se transmite noções errôneas, como a de que uma epidemia foi causada por um cachorro, quando na verdade se deveria apontar a falta de saneamento básico. A educação ambiental é importante até para que a pessoa possa decodificar o que está vendo na mídia."
Um outro equívoco bastante comum é o de achar que ambiente diz respeito somente a árvores e bichos. Os moradores das cidades estão num ambiente urbano e possuem problemas específicos de poluição, espaço, nutrição, transporte, saneamento básico etc. E lidar com tudo isso é também tema da educação ambiental.
"Uma boa educação ambiental faz com que o indivíduo tenha consciência sobre o ambiente em que vive e desenvolva valores em relação a esse meio: o que é realmente viver em harmonia com o ambiente? O que ele deve fazer para preservar essa harmonia? Mais ainda, educação ambiental não pode se limitar a um processo retórico. É necessário fazer com que esse indivíduo aja para manter, preservar e restaurar o seu ambiente", finaliza Myriam.
Notícia
Jornal da USP