Você acha que a tecnologia é pensada apenas em grandes corporações? Pois saiba que, no Brasil, os pequenos empresários mantêm o cérebro funcionando. Com o auxilio de incubadoras de base tecnológica geralmente liga das a universidades ou a órgãos de fomento — eles são responsáveis pela criação de produtos inovadores que estão ganhando o mercado.
O economista José Perez, de São Paulo, é uma dessas cabeças pensantes. Em 1993, ele atuava co mo representante de produtos químicos de uma empresa do setor. Com anos de experiência de campo, desenvolveu um produto agroquímico contra pragas que atacam plantações de cacau e café. A novidade funcionava como fungicida e bactericida, se causar danos ao meio ambiente.
Entusiasmado com a descoberta, Perez decidiu, estruturar a parte comercial e técnica do produto.
Nasceu então a PRTrade, uma pequena empresa que apesar de possuir um plano de negócios desde o,início, encontrou dificuldades para entrar, de fato, setor de defensivos agrícolas.
Tudo poderia não ter passado de um sonho, não fosse o empenho de Perez. Afinal, o novo produto — o Fegatex — precisou ser registrado em três ministérios. A primeira certificação saiu apenas em 2001. Dois anos depois, a empresa obteve mais um registro para a utilização do produto em outras culturas e iniciou um processo de profissionalização.
Para isso, contou com a ajuda do Centro Incubador de Empresas Tecnológicas (Cietec), ligado à Universidade de São Paulo (USP). Nos últimos cinco anos, a PRTrade saltou de 5 para 30 profissionais, entre sócios, colaboradores, bolsistas e representantes", comemora Marcelo Claro, gerente administrativo da empresa, que trabalha com ingredientes ativos inéditos em outros países. "Crescemos a uma média de 50% ao ano", comemora.
A história da PRTrade é um exemplo de como pode ser difícil — mas não impossível — produzir tecnologia no Brasil. Um dos desafios é transformar o conhecimento técnico em produtos que se adaptem as necessidades do mercado.
Em casos assim, o incentivo de entidades de fomento à pesquisa e ao empreendedorismo, além do trabalho das incubadoras, 4 fundamental. Nelas, as empresas recebei* suporte, orientação, apoio financeiro, de certo modo, "tempo para respirar". Não é à toa que o Brasil tem hoje 320 centros incubadores que abrigam mais de três mil empresas — 110 incubadoras atuam exclusivamente na produção de tecnologia.
"Os segmentos que têm se destacado são os de biotecnologia, softwares, jogos para celulares e games", afirma Tales Andreassi, professor de empreendedorismo da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FCV-SP). Segundo ele, as incubadoras e as entidades de apoio ao empreendedor são fundamentais para reduzir o índice de mortalidade e impulsionar os negócios.
Em São Paulo, o Cietec reúne 115 negócios em fase de desenvolvimento. "Cerca de 40% dos nossos gastos já são bancados pela geração de lucros internos", diz o diretor Sérgio Risola, que oferece às empresas suporte de marketing e de propriedade intelectual, consultoria financeira, de gestão e facilidades operacionais. Tudo isso permite que os empreendedores possam se concentrar nas pesquisas e no desenvolvimento de novas tecnologias. "Coro o suporte, há empresas incubadas faturando cifras acima do R$ 1 milhão", revela Risola. Juntas, as empresas do Cietec registraram, em 2005, uni faturamento total de R$ 25,6 milhões.
Investimentos — O grande problema continua sendo o capital. Na prática, investir em tecnologia custa caro e o retorno nem sempre é imediato. Para driblar a dificuldade, vale a pena buscar o apoio das incubadoras. "Investimos R$ 200 mil no início das atividades, em 2002, mas durante os vários estágios da empresa aplicamos outros R$ 500 mil, pois o negócio exige isso", afirma o empresário Willian Carnicelli, da Alpha Produtos Químicos, uma empresa que ficou incubada por três anos no Cietec e caminha com as próprias pernas há um ano.
Hoje com capacidade para produzir cerca de 150 quilos de matérias-primas para a indústria farmacêutica, a Alpha funciona numa área de 280 metros quadrados e já está de olho no mercado externo. "Em 2005, o faturamento dobrou e agora estamos preparando um crescimento da produção em escala para o ano que vem", diz Carnicelli, Incubada desde janeiro de 2003 no Cietec, a Exon Biotecnologia é outra empresa que aposta lia inovação. Utilizando um novo conceito de biologia molecular, realiza testes de consagüinidade por DNA para avestruzes, além de exames de sexagem (identificação do sexo) em aves silvestres. Mas isso dá dinheiro?
"Crescemos cerca de 200% ao ano", come mora Juliana Paz, coordenadora de marketing e vendas. Atualmente, a marca pratica preços até 40% menores q a concorrência — que utiliza outros métodos — e possui um total de dez produtos para aves, ovinos e caprinos. Também de São Paulo, a BCE Médica aposta na tecnologia para ganhar o mercado saúde. Em 2003, a empresa conseguiu as licenças para comercializar um localizador de nervos para anestesias locais — que aumenta índice de acerto das agulhadas —, além de um monitor de bloqueio neuromuscular para anestesias gerais.
Segundo José Carlos Borges, gerente geral da BCE, a pesquisa de novas tecnologias não o único desafio para o negócio. "Para quem tem formação técnica, a gestão é muito com plicada. Por isso tenho uma sócia com forma Ç lia área administrativa", diz.
Das 110 empresas incubadas no Cietec, 30 estão voltadas para a pesquisa nas áreas de reciclagem, preservação da água, gerenciamento de resíduos e fontes alternativas de energia. A Brasil Ozônio, que está no mercado há 18 meses, investiu em uni nicho ainda pouco explorado no País: o do uso de ozônio como unia espécie de "desinfetante natural"
A empresa fabrica um aparelho gerador de ozônio — o BRO3-3 — que substitui o uso de desinfetantes e bactericidas como o cloro. O produto é usado no tratamento da água de piscinas, poços artesianos, caixas d'água e efluentes industriais. Samy Menascc, diretor da empresa, afirma que a Brasil Ozônio cresce a uma velocidade de 25% ao mês. Além de contar com um sistema administrativo totalmente informatizado, o negócio está na etapa final do processo de certificação ISO 9000.
Crescimento — A Adespec, de São Paulo, é uru dos exemplos mais concretos do sucesso de empresas que produzem tecnologia. E há três anos no mercado, ela começou a dar seus primeiros passos dentro do Cictec. Já em 2004, conquistou o Prêmio Anprotec, oferecido pela Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores, e no ano seguinte o Prêmio Finep, da Financiadora de Estudos e Projetos, ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Em 2005, também levou, o prêmio de melhor empresa New Venture Brasil, pela sua contribuição para o negócio sustentável no Brasil.
Com um faturamento registrado em 2005 de cerca de R$ 500 mil, a Adespec enfrentou diversas dificuldades antes de se firmar. Segundo a diretora Wang Sim Chen, o maior desafio foi comercializar os produtos. "As exigências dos canais de distribuição demandam alto capital de giro para concessão de créditos, prazo de pagamento e comunicação. Esse capital de giro é escasso e difícil de ser obtido por empresas de pequeno porte", lamenta.
Fabricante de adesivos e selantes de alta performance, sem o uso de solventes, Adespec contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq) e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Em presas (Sebrae), além da estrutura do Cietec.
Wang afirma que o sucesso da empresa está ligado à inovação e à oportunidade oferecidas pelo mercado. Com um portfólio de 15 produtos, a empresa agora procura clientes em outros países. "Estamos com nossos produtos em fase de teste lia Alemanha e com consultas para representação em países africanos e também na Austrália", diz.
Tecnologia da informação — A aceitação das novas tecnologias pelo mercado permite que empresas como a Brasil Ozônio, a Adespec e da Alpha registrem crescimentos acima da média. Ao mesmo tempo, a criação de produtos inovadores impulsiona as regiões inteiras.
No Rio Grande do Sul, as companhias de desenvolvimento de softwares e de serviços de conectividade, outsourcing (terceirização) e suporte técnico são as que mais cresceu. Neste setor, cerca de 63% das empresas que atuam no Estado têm pequeno porte e, no máximo, três colaboradores, "E cada "ex mais elas estão segmenta a área em que atuam,", com pie ta Renato 'Turk Varia, presidente cio Sindicato das Empresas de Informática do Rio Grande do Sul (Seprorgs).
Ao contrário do que ocorre nos parques tecnológicos paulistas, as empresas de biotecnologia do Rio Grande rio Sul ainda têm atuação restrita. As empresas de software gaúchas, por sua vez, já são líderes no mercado, o que leva o Estado a ser um dos maiores em número de parques tecnológicos.
Segundo o primeiro Censo de TI do Rio Grande do Sul, organizado pelo Seprorgs, o Estado ten, 9.755 empreendimentos neste ramo —79,1% fia área de serviços. É o caso da Perseus, que atua no mercado de softwares para instituições de ensino.
A empresa iniciou suas atividades dentro da Incubadora Empresarial e Tecnológica de Canoas (lECan), em 1998. No início, a falta de capital de giro e de clientes para manter os custos levou os sócios a manter atividades profissionais paralelas. A dificuldade de acesso a financiamentos também, atrapalhou. "Mas a estada lia incubadora nos ajudou a manter uma estrutura de custos reduzida, com aluguei barato, acesso a internet, energia elétrica, tele fone fixo e capital a fundo perdido através do Sebrae [Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas]", afirma o diretor—presidente Camilo Bornia.
Quando a Perseus começou a atuar no mercado, havia poucos concorrentes diretos e o setor era praticamente in explorado. "Hoje, já há disputa por preços, e o grau de exigência dos clientes é alto diante do excesso de oferta ",lamenta Bornia.
E a tecnologia desenvolvida na empresa que a mantém firme no setor. Atualmente, os softwares Perseus Atlieus e Perseus i—School atendem instituições de ensino superior - e educação básica. A empresa não revela o faturamento e ostenta muitas vitórias. Em 2006, recebeu unia distinção do "3" Re conhecimento Nacional às Micro e Pequenas Empresas", concedida pelo Movimento Brasil Competitivo (MBC), rm Brasília.
"Empresas como essa, quando estão dentro da incubadora, fazem, um caminho estrutura do no que diz respeito à gestão. Elas recebem incentivos para investir e ficam focadas rio desenvolvimento de tecnologia", justifica Jorge Luiz da Rocha Pereira, consultor e especialista em TI do Sebrae-SP.
Segundo ele, os setores de biotecnologia e, principalmente, de tecnologia da informação (TI) são promissores no País. "Estão sendo cria dos vários 'Vales do Silício' no Brasil", afirma o consultor, numa referência à região norte-americana que abrange cidades do Estado da Califórnia famosas por reunir empresas de tecnologia de ponta. "Mas o empresário brasileiro ainda precisa ter, além de uma idéia genial, linhas de crédito e investimento em capacitação", alerta. Criatividade é o que não falta.
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