Elastography – a new technology associated with ultrasonography
Elastografia – una tecnología nueva asociada a ultrasonografía
Clínica Veterinária, Ano XVII, n. 104, p. 62-70, 2013
Cibele Figueira Carvalho
médica veterinária, mestre, dra. PPD do IR/FM/USP
cibelefcarvalho@gmail.com
Maria Cristina Chammas
médica, dra, diretora
Serviço de Ultrassonografia – IR/FM/USP
mcchammas@hotmail.com
Resumo: Desde os primórdios da medicina, a palpação sempre foi um meio semiológico fundamental para detectar anormalidades no exame clínico. Os atributos mecânicos dos tecidos moles estão relacionados às mudanças na sua dureza. Porém, esses e a ecogenicidade dos tecidos nem sempre estão correlacionados. A elastografia surgiu na última década como um método associado à ultrassonografia, capaz de fornecer informações sobre as propriedades acústicas (ecogenicidade e textura) e os atributos mecânicos (dureza) de uma área de interesse relacionada ao tecido adjacente. Este trabalho teve como objetivo realizar uma revisão da literatura sobre os princípios físicos desse método, assim como das diversas formas de processamento da imagem elastográfica, a fim de auxiliar a compreensão dessa nova técnica e suas potenciais aplicações na rotina veterinária.
Unitermos: elasticidade, técnicas de imagem por elasticidade, dureza, tumor
Abstract: Since the beginnings of medicine, palpation has always been the main semiological method to detect abnormalities during clinicai examination. The mechanic properties of soft tissues are usually related to changes in hardness. However, those properties and tissue echogenicity are not always correlated. Elastography has emerged in the last decade as a new ultrasonography-associated method that can provide information about both the acoustic properties (echogenicity and texture) and the mechanic attributes (hardness) of a region of interest related to the adjacent tissue. The aim of this work is to review the literature about the physical principies of this method, as well as the severa I modes of elastographic image processing, in order to help professionals understand this new technique and its potential use in the veterinary routine.
Keywords: elasticity, elasticity imaging techniques, hardness, tumor
Resumen: Desde las primeras épocas de la medicina, la palpación ha sido un medio semiológico fundamental para detectar anormalidades en el examen clínico. Las características mecánicas de los tejidos blandos están relacionadas a cambios en su consistencia o dureza. No obstante, estos cambios no siempre están correlacionados. La elastografía surgió durante la última década como un método asociado a la ultrasonografía, siendo capaz de ofrecer informaciones sobre las propiedades acústicas (ecogenicidad y textura), así como también de los atributos mecánicos (dureza) de un área de interés, en relación ai tejido adyacente. Este trabajo tuvo como objetivo realizar una revisión de la literatura sobre los principios físicos dei método, así como las diferentes formas de procesamiento de la imagen elastográfica, con el fin de ayudar a entender esta técnica nueva, y sus aplicaciones potenciales en la rutina veterinaria.
Palabras clave: elasticidad, técnicas de imagen por elasticidad, dureza, tumor
Introdução
Desde os primórdios da prática médica, a palpação é um meio semiológico utilizado para detectar a presença de anormalidades que pudessem indicar a presença de patologias. Isso se deve principalmente ao fato de as propriedades mecânicas do tecido doente serem tipicamente diferentes daquelas apresentadas pelo tecido normal adjacente. No entanto, a palpação é um meio limitado para a detecção de massas situadas mais profundamente em relação à superficie da pele. Outras propriedades associadas ao tecido doente, como a quantidade de água, a densidade do tecido e a capacidade de interação acústica, proporcionaram o surgimento da área de diagnóstico por imagem que permite a imagem diagnóstica muito além dos limites da palpação (1).
Os atributos mecânicos dos tecidos moles dependem de sua constituição molecular (gordura, fibras colágenas, elastina, água, etc.) e de sua organização estrutural micro e macroscópica. Esses atributos incluem a elasticidade, a dureza e a mobilidade apresentadas por um tecido como resposta a uma força aplicada a ele (1).
As alterações patológicas geralmente estão correlacionadas às mudanças na dureza do tecido. Em muitos casos, apesar da diferença de dureza ou de mobilidade, o tamanho diminuto de uma lesão e/ou sua localização mais profunda impedem sua detecção ou avaliação por meio da palpação. Além disso, as lesões podem ou não ter propriedades acústicas que as tornem detectáveis ultrassonograficamente. Os atributos mecânicos e a ecogenicidade dos tecidos nem sempre estão correlacionados. Assim, se somadas as informações dessas propriedades em um determinado tecido, espera-se que as imagens resultantes estejam relacionadas à estrutura tecidual e à patologia, proporcionando maior acurácia diagnóstica. Por exemplo, os tumores prostáticos podem ser pouco visibilizados ou até mesmo nem ser observados no exame ultrassonográfico habitual, mesmo tendo áreas mais duras em relação ao tecido adjacente. Isso também acontece em casos de doenças difusas, como na cirrose hepática, que aumenta consideravelmente a dureza do tecido hepático, embora em alguns estágios iniciais da enfermidade as imagens se apresentem dentro dos limites da normalidade no exame ultrassonográfico convencional (1).
A elastografia surgiu na última década como um método de imagem muito promissor associado à ultrassonografia, pelo fato de fornecer em conjunto as informações sobre as propriedades acústicas e os atributos mecânicos de uma área de interesse em relação ao tecido adjacente (2). A adequada interpretação das imagens geradas com esse recurso tecnológico requer a compreensão dos atributos mecânicos do tecido, ou seja, da relação de dureza e elasticidade, assim como o conhecimento dos diversos métodos de processamento da imagem elastográfica (2).
Assim, este trabalho tem como objetivo realizar uma revisão da literatura publicada sobre os princípios físicos de formação da imagem, a fim de auxiliar na compreensão de potenciais aplicações dessa nova ferramenta diagnóstica.
Princípios físicos da elastografia
A elastografia é baseada nos princípios físicos relacionados aos conceitos de força de compressão, tração e tensão ou elasticidade, ou seja, as propriedades mecânicas dos tecidos. Até um limite, dependendo do material (tecido vivo) e da temperatura, as tensões aplicadas ao meio são aproximadamente proporcionais às deformações. A razão de proporcionalidade entre elas (tensão/deformação) é chamada módulo de elasticidade ou módulo de Young (3). O módulo de elasticidade pode ser entendido também como resultado de uma equação matemática que calcula a capacidade viscoelástica do tecido em relação a uma força aplicada (equação viscoelástica dinâmica).
Para compreender a aplicação desses princípios físicos à elastografia, é importante também entender que (4):
• a força aplicada no tecido é considerada estática. Ou seja, o tempo de aquisição dos dados é muito curto se comparado ao tempo em que a força atua ocasionando mudanças. Assim, essa força pode ser considerada constante durante a aquisição dos dados;
• uma vez que a força aplicada é estática, reduz-se assim a complexidade da equação viscoelástica dinâmica resultante;
• o deslocamento axial (na direção do eixo principal do feixe sonoro) no tecido é muito pequeno (da ordem de menos de 1%), e portanto a equação resultante é considerada sobre uma força linear.
Quando um meio elástico sofre a compressão exercida por uma força uniaxial constante, todos os pontos experimentam um nível de deslocamento longitudinal, cujos componentes principais se dispõem ao longo do eixo de compressão e movimento. Se um ou mais elementos do tecido tem parâmetro de dureza diferente em relação aos outros, o nível de deslocamento resultante desse elemento será maior ou meno (4,5). Um elemento tecidual mais duro sofrerá menor deformidade quando submetido a compressão em relação aos outros elementos de menor dureza ou mais moles.
O deslocamento longitudinal (axial ou lateral) desses elementos é estimado por meio da análise dos sinais ecográficos obtidos de um equipamento de ultrassonografia diagnóstica convencional associado ao recurso de elastografia por meio de um software específico. O software específico do aparelho calcula a elasticidade do meio a ser estudado, sabendo qual a tensão necessária para que se obtenha certo grau de deformação do meio. Quanto maior esse módulo, maior a tensão necessária para deformação do meio e, portanto, mais rígido é o material. A relação linear entre esses parâmetros (tensão/ deformação) é conhecida como lei de Hooke (4).
Esses dados são obtidos, basicamente na seguinte ordem (5,6);
1) adquire-se uma amostra de ecos de radiofrequência digitalizados da região de interesse no tecido em estudo;
2) realiza-se uma pequena compressão no tecido com o transdutor ao longo da mesma direção do feixe sonoro;
3) por fim, adquire-se uma segunda amostra de ecos de radiofrequência lineares (na mesma direção do feixe sonoro) após a compressão na mesma região de interesse.
Esses dados são comparados usando-se técnicas de correlação cruzada, em que os ecos lineares congruentes são subdivididos em pequenas janelas temporais e pareados (5). Assim, torna-se matematicamente possível calcular a mudança ocasionada na região de interesse após a compressão em vários pontos daquela área (5).
Propriedade mecânica dos tecidos
Os tecidos podem apresentar comportamento viscoelástico maior ou menor, dependendo da presença e da quantidade de alguns componentes, como o fluxo de líquidos no local e a capacidade de relaxação das fibras ao estresse. Nos tecidos vivos, esses fatores diferentes geralmente estão combinados. Para que um recurso capaz de transformar matematicamente essa análise de resultados (descrevendo o comportamento mecânico do tecido analisado) seja utilizável em uma situação em tempo real (como ocorre com a imagem ultrassonográfica), é desejável que o resultado final seja de uma simplicidade considerável e de leitura facilmente realizada durante o próprio exame ultrassonográfico (4).
Assim, parte-se do princípio de que, ao se aplicar uma força mecânica de estresse, grande parte dos tecidos moles (de interesse) se apresenta isotrópica (4,6,7), ou seja, em uniformidade de comportamento responsivo a uma determinada força aplicada, embora haja evidências de propriedades anisotrópicas mecânicas (heterogeneidade de resposta) e ultrassonográficas em alguns tecidos moles, como, por exemplo, os músculos (8).
Há dois tipos de ondas que viajam através de um meio: as ondas de compressão e as de deformação. Com as ondas de compressão, as partículas de um meio oscilam na direção do movimento. Com as ondas de deformação, as partículas oscilam perpendicularmente à direção do movimento. As ondas de deformação são importantes para a elastografia, uma vez que o cálculo de dureza se faz por meio de uma fórmula matemática (módulo de Young), e esta necessita dos dados de velocidade das ondas para tal estimativa (9). À medida que as ondas de deformação passam através de um tecido, ele se desloca. Esses deslocamentos causam mudanças no padrão de eco que retoma com o tempo, o que deve ser monitorado por meio de técnicas de correlação de imagem axial.
Porém, isso requer que o tempo entre os pulsos subsequentes de ultrassom seja menor do que 0,5 milissegundo, ou seja, uma frequência de repetição de pulso (FRP) mínima de 2.000Hz. Isso pode ser facilmente ajustado em aparelhos que produzam imagem unidimensional (por exemplo, em modo- M). No entanto, para produzir imagem bidimensional multiaxial, é necessário uma FRP que não pode ser obtida em aparelhos de tecnologia convencional (2,8,9). Os aparelhos modernos com tecnologia Doppler possuem esse recurso ajustável.
Uma vez que os diversos tecidos possuem várias funções mecânicas distintas, suas propriedades mecânicas diferem substancialmente. Além disso, a estimativa e a imagem do deslocamento do tecido é, por definição, um problema tridimensional. Quando o tecido é deformado, a aparente falta de compressibilidade proximal da maior parte dos tecidos moles significa que os componentes tensores são gerados em todas as direções simultaneamente (8-10).
Atualmente, os sistemas comercialmente viáveis nos aparelhos de ultrassonografia podem ser classificados de acordo com a sua capacidade de emissão e detecção de ondas para cálculos do deslocamento do tecido (5,6,11,12), inferindo a elasticidade resultante de três maneiras: I) indução de ondas de deformação usando um agente mecânico externo; 2) sonoelastografia por indução automática de ondas de deformação; e 3) indução de ondas de deformação usando força de radiação acústica ou de cisalhamento associada a imagem em modo-B.
Processamento da imagem elastográfica
A avaliação quantitativa dos parâmetros mecânicos dos tecidos tem resultado em uma grande diversidade de valores (7). A maioria dessas pesquisas foi realizada em tecidos submetidos a uma força de tensão (músculos, artérias, pulmões, tendões, ossos, pele, ureter). Em contrapartida, uma pequena quantidade de informação tem sido coletada sobre os atributos de compressão desses tecidos dentro dos órgãos. Foi encontrado apenas um estudo que mediu as resultantes elásticas desses tecidos in vitro (7). Alguns estudos in vivo foram realizados e concluíram que as propriedades mecânicas dos tecidos apresentam diferenças significantes em condições normais e na presença de lesões tumorais (10).
A existência dessas diferenças significantes nas respostas dos tecidos normais e anormais a um estímulo mecânico permitiu o desenvolvimento de técnicas de imagem que demonstram os atributos mecânicos de um tecido ou de uma área de interesse dentro de um tecido (11, 12).
Atualmente existem diferentes técnicas que estudam como essas propriedades mecânicas podem ser processadas em formato de imagem e utilizadas como ferramenta diagnóstica. Os métodos comercialmente viáveis podem ser subdivididos em dois tipos principais: a elastografia qualitativa (strain elastography) ou por ondas de compressão, e a elastometria ou elastografia quantitativa (shear wave elastography), realizada por emissão de ondas de cisalhamento.
Na elastografia qualitativa, o tecido é submetido a uma força e o sistema de imagem mede a resposta do tecido a essa força. Há basicamente duas técnicas, ambas fundamentadas na compressão do tecido: uma, denominada elastografia qualitativa (A-fine correlation) ou elastografia estática, ocorre pela movimentação do transdutor ao longo de um eixo; a outra técnica é denominada imagem sonoelástica (sonoelastic imaging) e envolve a aplicação de uma energia vibracional de baixa frequência no tecido, também denominada transient elastography ou Fibroscan, na qual ocorre uma detecção simultânea de ondas Doppler ultrassonográficas que demonstram essa perturbação hemodinâmica ocasionada pelas vibrações (11). Nesse último caso, os dados obtidos com a ferramenta Doppler resultam em uma imagem que demonstra o módulo elástico calculado do comprimento de onda no local da vibração, ou seja, somente a amplitude de deslocamento relacionada à elasticidade desse módulo também ao longo de um eixo axial (9).
A técnica denominada elastografia qualitativa adquire a resposta local de um tecido submetido a uma força, transformando em imagem os cálculos de deslocamento longitudinal (axial) dos componentes envolvidos em diferentes pontos de um mesmo tecido. A imagem resultante é conhecida como elastograma. Essas técnicas são capazes de detectar tanto a movimentação quanto a compressão e a extensão do tecido ao longo do eixo e são usadas especialmente em tempo real (9) na rotina clínica. Podem ser realizadas em tempo real ou não, por meio de aparelhos ultrassonográficos equipados com um software específico, capaz de avaliar as propriedades físicas de um tecido, determinando seu grau de dureza em relação ao tecido adjacente, por meio da compressão do local avaliado (12).
Na elastografia estática (qualitativa), o feixe sonoro é emitido pelo transdutor, ao mesmo tempo que uma leve compressão manual mecânica é realizada. A imagem elastográfica é gerada a partir da deformação dos tecidos, sendo que o software realiza a análise comparativa entre o momento da compressão e o resultado dela. Os tecidos mais duros se deformam menos diante de uma compressão, enquanto os mais suscetíveis à compressão apresentam maior deformação (13). Essa deformidade sofrida pelo tecido é representada em uma escala de cores, conforme a variação elástica: o vermelho corresponde a tecidos mais macios, o verde a tecidos que apresentam deformidade intermediária, e o azul corresponde àqueles com menor deformação, ou seja, maior dureza (13).
É importante notar que a elastografia qualitativa não é uma imagem exata e matemática do módulo elástico propriamente. Nessas técnicas, um índice de dureza pode ser estimado comparando-se a dureza da lesão com a de uma região adjacente de referência. Assim, o operador deve lembrar que essa medida é sensível ao posicionamento da região de referência, e esta deve estar à mesma profundidade que a lesão em estudo para que se obtenha um índice calculado confiável. Isso porque o estresse ocasionado pela compressão (ou seja, força por unidade de área) geralmente muda de acordo com a profundidade. Em um tecido uniforme como o figado ou em um phantom (modelo in vitro comercialmente encontrado), o estresse e a elasticidade diminuem à medida que aumenta a profundidade (9). Assim, a profundidade torna-se uma limitação, pois lesões a uma profundidade maior que 5cm não são comprimidas o suficiente para serem avaliadas por essa técnica de imagem. Isso ocorre principalmente em órgãos localizados em regiões mais profundas ou em pacientes obesos (9). Ressalta-se que no caso da elastografia qualitativa, ou seja, na qual se exerce uma força mecânica manual sobre um tecido ou área de interesse, não adiantaria modificar a frequência do transdutor, pois órgãos como o figado se encontram contidos pelo arcabouço costal.
As variações da técnica elastográfica descritas na literatura, como a elastografia em tempo real e a elastografia transitória (transient elastography), são resultado do desenvolvimento tecnológico, cuja finalidade é encontrar o método ideal para as diferentes indicações clínicas (9).
A outra técnica descrita na literatura é baseada na propagação de uma força de radiação acústica (acoustic radiation force impulse – Arfi) ou de uma forma de onda de cisalhamento. Essa força é capaz de ocasionar o deslocamento do tecido sem a necessidade de compressão manual. Essa técnica pode fornecer informações qualitativas e quantitativas. Esse deslocamento ocasionado pela onda de cisalhamento é mínimo, porém o foco de um pulso de alto índice mecânico (o índice mecânico relaciona a potência com a frequência da onda sonora) pode produzir deslocamentos de até 20µm, com o tecido retomando à sua posição inicial em 5 milissegundos (11). Nos aparelhos mais modernos, o índice mecânico pode ser ajustado. Esse deslocamento é suficiente para ser detectado com a técnica de elastografia qualitativa, e uma vez que a força se origina diretamente da região focal do transdutor, é possível ser usada a profundidades maiores. Além disso, com esse método, as mensurações deixam de ser subjetivas – ou seja, deixam de resultar da variação da força de compressão aplicada pelo operador. Assim, o método torna-se mais exato, com menor variação interobservador e maior reprodutibilidade (12).
A elastografia quantitativa representa um avanço na reconstrução do módulo elástico resultante do deslocamento axial em tempo real, mensurando as ondas capazes de ocasionar deformação elástica na direção do movimento; assim, é possível calcular os dados de dureza obtidos na região de interesse (14). Uma análise teórica, simulações e resultados experimentais em diversos tecidos foram utilizados na intenção de demonstrar a precisão das estimativas do deslocamento dessas ondas de deslocamento (15). A elastografia quantitativa (shear wave elastography) é realizada atualmente por mecanismos que se baseiam na propagação de ondas focalizadas de ultrassom para gerar ondas marginais e ortogonais (ou de cisalhamento) dentro do órgão. Esse processo pode ser realizado por dois tipos diferentes de equipamentos: acoustic radiation force impulse (Arfi) imaging e supersonic shear wave imaging (15).
Principais aplicações da elastografia
Dentre as principais aplicações do método, é importante ressaltar o uso da chamada elastografia transitória, realizada por um aparelho especificamente desenvolvido para quantificar fibrose hepática, denominado Fibrosca®. Esse aparelho tem a capacidade de enviar ondas elásticas (ondas mecânicas com capacidade de deslocar temporariamente as moléculas do tecido) em conjunto com o feixe sonoro. Estas caminham pelo tecido em velocidades diretamente proporcionais à sua dureza. A técnica oferece vantagens em relação à biópsia convencional para quantificar a fibrose hepática: não oferece riscos ao paciente, é indolor e avalia o tecido hepático correspondente a um fragmento cilíndrico de 1cm de espessura e 2cm de profundidade, que, comparativamente, é 100 vezes maior que o fragmento retirado por biópsia (16,17). No entanto, vários estudos comprovam que algumas condições associadas a hepatopatias crônicas – como, por exemplo, a inflamação e a congestão hepática, a obstrução biliar e a hipertensão portal – podem aumentar a elasticidade e tomar o método inconclusivo em 20% dos casos (18-20). Além disso, algumas dificuldades técnicas são desvantajosas, como o alto custo do equipamento, a longa curva de aprendizado e a impossibilidade de execução na presença de ascite e em pacientes obesos, limitando o uso do método (9).
A elastografia em tempo real propõe o uso de equipamentos ultrassonográficos que possuem software específico e realizam o exame com as vantagens de menor custo e fácil execução. É o método mais difundido entre os fabricantes de aparelhos. Apesar das vantagens, é um método considerado dependente do operador, por exigir aplicação manual da força, razão pela qual sua reprodutividade é baixa. A literatura veterinária demonstra (2, 14, 17, 21-23) que esse tipo de elastografia tem sido utilizado como método auxiliar da imagem sonográfica convencional, na diferenciação de lesões focais malignas e benignas em diversos órgãos; e na medicina humana tem sido usado nas glândulas mamárias e na tireoide (24). Em relação ao fígado, estudos preliminares buscam padronizar a técnica e avaliar o diagnóstico de lesões focais e difusas, com o intuito de diferenciar processos malignos e benignos (21-23), assim como processos degenerativos e inflamatórios (25), e ainda quantificar a fibrose em pacientes humanos (26) e em cães (17). Por esses motivos, muitas expectativas têm sido geradas em relação a essa nova técnica (12).
Por fim, a técnica que se baseia na propagação de ondas de cisalhamento (Arfi e supersonic shear wave) apresenta diversas vantagens em relação às outras: permite combinar o procedimento com a rotina ultrassonográfica em tempo real, inclusive quando se trata de pacientes obesos ou com ascite, pois produz maior penetração da onda mecânica. Além disso, fornece maior precisão no cálculo da elasticidade do tecido e melhor reprodutibilidade, pois o resultado independe da habilidade do operador (27-29). As principais desvantagens dessa técnica estão relacionadas ao custo do aparelho, que dificulta sua utilização além dos centros de referência. Outra desvantagem desse método é o tamanho da amostra mensurada, considerado pequeno e nem sempre significativo em relação a todo o órgão em casos de doenças que não tenham característica de infiltração difusa no parênquima (18). Nessa técnica, os estudos ainda são muito recentes e não há padrões de referência estabelecidos na literatura veterinária.
Considerações finais
Os principais desafios que ainda dificultam a difusão dessa nova modalidade de imagem na rotina tanto da medicina humana (24) quanto na da veterinária são: 1) a dificuldade de acesso em pacientes obesos e em órgãos como o figado, devido ao arcabouço costal, principalmente no caso da medicina veterinária, pois algumas raças de cães possuem tórax profundo em formato de quilha, dificultando a avaliação hepática; 2) a necessidade de aparelhos que suportem a nova tecnologia e ao mesmo tempo sejam acessíveis economicamente.
No entanto, as técnicas de imagem elastográfica apresentam um futuro promissor, graças a sua reprodutibilidade e segurança, associadas à boa resolução de imagem dos atuais aparelhos de ultrassonografia diagnóstica convencionais (24).
Com isso, as principais áreas nas quais podemos esperar progressos significantes para a aplicação dessa técnica seriam (1):
• a caracterização da imagem da dureza de tecidos com lesões estruturais em órgãos;
• o acompanhamento de processos de fibrose tecidual em diversos órgãos;
• a caracterização de tumores baseada no padrão de imagem associado às suas propriedades mecânicas (como dureza e mobilidade);
• a detecção precoce de lesões malignas com caracterização tridimensional da área afetada;
• as aplicações em nível celular por meio do uso de transdutores de alta frequência para pequenos órgãos. Esses são alguns dos exemplos das numerosas possibilidades de aplicações clínicas que as diversas modalidades de elastografia poderão fornecer nos próximos anos à medicina veterinária.
Agradecimentos
Agradecimentos especiais à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pelo apoio financeiro à execução dos trabalhos na linha de pesquisa da ultrassonografia elastográfica realizada pelas autoras. Agradecemos ainda ao Dr. Hector Mario Gomez pela ajuda no trabalho de tradução do resumo desta revisão para a língua espanhola; ao dr. Fernando Linhares, pelo apoio na execução do filme disponível na versão digital do artigo; ao dr. Túlio Macedo, pelo material didático fornecido; e ao Dr. Edgar Luiz Sommer e a toda equipe do serviço de diagnóstico por imagem do Provet – Medicina Veterinária Diagnóstica, pelo apoio e incentivo em implantar ideias inovadoras.
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