A linguística é uma ciência que surgiu no Brasil na metade do século passado, observa Maria Estela Maiello Modena, que trabalha justamente com esse estudo da língua falada, os desdobramentos da oralidade e a forma como ela acontece. Por ser um estudo recente por aqui, é uma área que ainda tem muito a ser explorada e, ao escolher um tema original para sua pesquisa de mestrado, a sorocabana Maria Estela contribui para que esse seja um campo de estudo cada vez mais extenso no Brasil. Ela avaliou quinze entrevistas do premiado documentário cinematográfico Edifício Master, dirigido por Eduardo Coutinho e lançado em 2002. O fruto da pesquisa de mestrado, feita sob a orientação do Professor Doutor Dino Preti, no programa de Pós-graduação em Língua Portuguesa da PUC-SP, é o livro Edifício Master – Um estudo sobre face em entrevistas de cinema documentário, lançado no mês passado.
A tese foi defendida em 2009 e Maria Estela optou por abordar nesse projeto a linguagem de documentário cinematográfico que tanto interesse lhe desperta. Maria Estela enumera os motivos pelos quais optou por pesquisar o filme Edifício Master, que mostra depoimentos de dezenas de moradores desse famoso prédio de Copacabana, no Rio de Janeiro, onde residem cerca de 500 moradores de classe média. “Primeiro porque os trabalhos de Eduardo Coutinho são calcados na conversação, com gravação em câmera fixa, e a oralidade em seus documentários é essencial. Segundo porque ele não explora imagens e pessoas e por isso é reconhecido por manter um respeito, uma ética em relação a seus entrevistados. E terceiro porque esse documentário apresenta pessoas falando de si mesmas, de suas questões pessoais e a única relação entre elas é o morar naquele prédio.”
Em seu trabalho, Maria Estela analisou a forma como elas se representaram socialmente. “Fiz uma análise linguística que leva em consideração o lugar em que esses entrevistados estão, a situação que estão vivendo naquele momento, a preocupação com a própria imagem, como eles querem conciliar o que estão falando com a própria imagem”, explicou. A questão não é avaliar se são ou não depoimentos naturais, espontâneos. “Relevante é a decisão das pessoas de contar fatos socialmente não agradáveis, como casos de estupro e prostituição.” Relevante, Maria Estela reforça e explica, é ver que elas usam mecanismos de exibição e de proteção da câmera, que assume um papel revelador e ao mesmo tempo ameaçador, como se naquele instante da entrevista houvesse um desejo de exibição e uma necessidade de proteção. “Observa-se tentativas de se eximir de responsabilidades quando uma das entrevistadas assumi ser prostituta e logo em seguida se protege ao dar justificativas do porquê seguiu por esse caminho.”
O livro Edifício Master – Um estudo sobre face em entrevistas de cinema documentário tem uma estrutura acadêmica em termos de construção de teorias e análises e inclusive foi editado pela Educ (editora da PUC-SP), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), duas instituições acadêmicas, “mas a linguagem não é formal, não é pesada”, avisa Maria Estela, de forma que o livro não fica restrito a um público específico e nem a uma linguagem técnica. “É para quem gosta do tema, para quem gosta de Eduardo Coutinho, quem estuda psicologia, já que entre os termos abordados estão alguns estudados por profissionais desse ramo.” Com 206 páginas, a publicação custa R$ 35 e pode ser comprado pela internet em sites de várias livrarias, entre elas a Livraria Cultura (www.livrariacultura.com.br), a Livraria Cortez (www.livrariacortez. com.br) e na Loja da PUC-SP (www.pucsp.br/loja).