Constatação foi feita em ensaio clínico com 465 pacientes atendidos em 28 hospitais de seis países, inclusive o Brasil
O anticoagulante heparina reduz em 78% o risco de morrer por complicações da Covid-19, se administrado em dose terapêutica assim que o paciente chega ao hospital com sinais de insuficiência respiratória.
Atualmente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda para esses casos apenas uma dose profilática do medicamento (indicado para prevenir trombose), e foi constatado que essa única dose é quatro vezes menor que a dose terapêutica e não mostrou benefícios no ensaio clínico. A pesquisa envolveu 465 pacientes atendidos em 28 hospitais de seis países, entre eles o Brasil.
Elnara Negri, coautora do artigo e integrante das equipes do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP) e do Hospital Sírio-Libanês, disse que os procedimentos devem mudar. “A gente acredita que esses resultados devem mudar a prática clínica”, disse a pesquisadora.
Ela destaca ainda que a recomendação não vale para todo mundo que for diagnosticado com a doença. “O tratamento é indicado apenas para quem for internado e somente sob supervisão médica. Se uma pessoa tomar anticoagulante sem necessidade ou orientação pode sangrar até morrer”, advertiu.
A pesquisa
Participaram do ensaio clínico pacientes de ambos os sexos, com idade média de 60 anos, que deram entrada no hospital com saturação de oxigênio igual ou inferior a 93%. O objetivo foi avaliar o efeito da heparina sobre vários possíveis desfechos da infecção pelo Sars-Cov-2.
Os voluntários foram divididos em dois grupos, um tratado com a dose terapêutica e outro que recebeu apenas a dose profilática. O efeitos foram avaliados 28 dias após a administração da medicação.
Os resultados evidenciam ainda que, para trazer benefícios, a heparina deve ser administrada entre o sétimo e o 14.o dia após o início dos sintomas. Estudos anteriores já haviam mostrado que a anticoagulação não traz resultados importantes quando é feita após a internação em UTI.
A médica destaca que os benefícios nessa fase da doença foram observados apenas com o uso de heparina injetável. Anticoagulantes ministrados por via oral não surtiram efeito. “Isso possivelmente se deve ao fato de esse fármaco também ter efeitos antivirais e anti-inflamatórios já confirmados no contexto da Covid-19. A boa notícia é que se trata de uma droga barata e disponível no Sistema Único de Saúde (Sus).
Primeiras evidências
Em parceria com os colegas do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Elnara Negri foi uma das primeiras pessoas no mundo a levantar a hipótese de que distúrbios de coagulação sanguínea estariam na base dos sintomas mais graves da Covid-19 – entre eles insuficiência respiratória e fibrose pulmonar.
“A heparina ajuda a evitar que isso ocorra por dois mecanismos: o medicamento desfaz os microtrombos que impedem o oxigênio de passar do alvéolo para as pequenas artérias pulmonares e, além disso, ajuda na recuperação do endotélio vascular”, completa a pesquisadora.
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