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Disputa na Internet abre mercado para advogados (1 notícias)

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Por Daniela Christovão - de São Paulo
A disputa pela utilização de marcas na Internet e o aumento do uso da rede de computadores na venda de produtos está criando um promissor mercado para os escritórios de advocacia. Bancas especializadas em propriedade intelectual têm ampliado o número de profissionais que operam exclusivamente com problemas surgidos em torno da Internet. A falta de uma legislação específica que proteja as empresas dos chamados ciber-posseiros - pessoas e empresas que criam sites com homes de empresas e marcas conhecidas - ajuda à expansão desse mercado. Apesar das marcas muitas vezes já estarem registradas no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), a criação de um site com um nome conhecido é fácil. A entidade responsável pela inscrição dos domínios ".br" no País, a Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de São Paulo (Fapesp), impede apenas o registro de 200 nomes considerados notórios pelo INPI. "Hoje é muito comum uma empresa tentar registrar seu site e constatar que já existe um domínio com seu nome na Internet", diz o advogado Eduardo Machado, do escritório Montauri, Pimenta, Machado e Lioce Advogados. "Isso inicia uma negociação com a pessoa que registrou o site e, se não houver êxito, muitas vezes o caso acaba na Justiça." O escritório Veirano Advogados, que tem o maior departamento de propriedade intelectual dentre os escritórios de advocacia geral, ampliou esse seu setor principalmente por conta da rede mundial de computadores. São 25 pessoas, sendo oito advogados, dois engenheiros e assistentes de diversas áreas. O Veirano representou a empresa Ayrton Senna Promoções e Eventos (Aspe), que surpreendeu-se com a existência dos sites "asenna.com.br" é "ayrtonsenna.com.br" quando quis registrar-se na Internet. As Justiças estaduais do Paraná e de Minas Gerais foram favoráveis à Aspe na disputa sobre a veiculação do nome do piloto de Fórmula-1 na rede mundial de computadores. Duas empresas, uma de Curitiba, e outra de Belo horizonte, já haviam registrado os domínios na Internet. O advogado do Veirano, Fernando Jucá, conta que tentou-se um acordo amigável, notificando-se extrajudicialmente as empresas. Sem sucesso, foram propostas as ações judiciais. Em ambos os casos a Aspe conseguiu a tutela antecipada em mandado de segurança proporcionando a sustação dos registros dos domínios na Fapesp. Ontem, finalmente foi feito um acordo com a África System, de Belo Horizonte, em que a empresa comprometeu-se a cancelar o domínio "asenna.com.br" em 30 dias. A Aspe, por sua vez, abriu mão da indenização que pedia na Justiça. "A disputa pelo domínio é essencial para os clientes que começam a atuar junto ao comércio eletrônico", diz o advogado Eduardo Machado. Ele diz ser essa a primeira preocupação das empresas que o procuram quando vão atuar na Internet. Seu escritório atua exclusivamente no ramo de propriedade intelectual e dos 14 advogados contratados, quatro só cuidam de Direito da rede mundial de computadores. "Um de nossos sócios freqüenta todo os anos cursos de Direito da Internet da International Trade Market Association, nos Estados Unidos, para atualizar-se", diz. Machado conta que em janeiro a American on Line (AOL), maior provedor de Internet do mundo e cliente do escritório no País, conseguiu na Justiça brasileira livrar seu nome de um ciber-posseiro que havia registrado o domínio "aol.com.br". "Nas negociações, a pessoa que registrou a marca pediu R$ 4 milhões para liberar o domínio para a AOL", afirma Machado, lembrando que, com o fracasso da transação, a empresa resolveu entrar na Justiça e conseguiu uma liminar para que usasse a sua marca AOL. "De acordo com as duas regulações do Comitê Gestor (CG) órgão ligado aos Ministérios da Ciência e Tecnologia e das Telecomunicações, a primeira pessoa que faz o registro é a dona do domínio", admite o coordenador de rede na Fapesp, professor Hartmut Richard Glaser. "A única exceção realmente feita por nós é a lista de cerca de duzentos nomes notórios, fornecida pelo INPI", afirma. Segundo Eduardo Machado, a posição da Fapesp lembra a forma como o INPI lidava com marcas e patentes internacionais há 40 anos. "Essa atitude dá vazão a atuação dos ciber-posseiros, que afastam a segurança e o uso da Internet pelas empresas", diz o advogado. Para ele, se a Fapesp tivesse acesso aos arquivos do INPI e não registrasse domínios para pessoas que não são as detentoras da marca ou nome, essas questões sobre domínio não estariam chegando ao Judiciário. "A falta de legislação específica para resolver os problemas envolvendo a rede é um dos principais problemas para o avanço de novos serviços que podem ser oferecidos pela inovação tecnológica nos meios eletrônicos", afirma a advogada do Citibank, Sandra Gouveia. Entre eles, ela lembra a assinatura de contratos pela Internet, que poderiam ser protegidos através de um sistema de criptografia (proteção de dados). Na experiência do advogado Otto Licks, do tradicional escritório de propriedade intelectual Momsen,, Leonardos & Cia, a pirataria de domínios, utilizando marcas já existentes, não é um bom negócio para os ciber-posseiros. "As disputas pelos domínios costumam ser resolvidas por acordos extrajudiciais", diz. Os clientes assistidos por Licks são orientados a não pagar "resgate" por um direito que consideram seu. "E muitas vezes o 'pirata' faz um ressarcimento por eventuais danos causados ao cliente dono da marca", afirma, sem dar maiores detalhes sobre as transações, alegando a existência de cláusulas de sigilo impostas pelos clientes assistidos. Esses acordos costumam dar certo porque os ciber-posseiros assustam-se ante à ameaça de uma ação judicial, e o ônus que um processo pode significar, conta Licks. O avanço dessas questões na Internet e também de novas tecnologias fez o Momsen, Leonardos & Cia. criar uma divisão específica. De 200 pessoas (entre advogados, consultores e técnicos) que trabalham no escritório, cerca de 35 estão ligadas às novas tecnologias. Não são porém apenas os direitos de uso de nome na Internet que estão ampliando o mercado para os escritórios. O advogado Waldir Vaz, do Veirano, afirma que os clientes - geralmente empresas multinacionais - que entram no ramo ao comercio eletrônico através da rede de computadores consultam seus serviços para analisar os contratos de compra e venda virtuais. "No Brasil esses contratos têm valor desde que provada a existência do contratante", lembra. Apesar de o meio de venda ser a Internet, o direito do consumidor na compra é protegido pelo Código de Defesa do Consumidor, diz o advogado Eduardo Machado. E disputas de concorrência são regidas pelas leis específicas. "A Internet é apenas um novo meio para se fazer negócios. As regras, por analogia, são as mesmas, enquanto não houver legislação específica", opina. As consultas envolvem também questões complexas de direito internacional privado. "Se houver alguma quebra de contrato, é complicado decidir de qual país seria a lei ou o foro competente, se a empresa vendedora fica na Argentina, o distribuidor é europeu e o comprador brasileiro," explica Vaz. Profissionais com formação diferenciada A atuação dos escritórios na Internet e nas novas tecnologias está requisitando a contratação de advogados com uma formação diferente da tradicional. "Precisamos de profissionais capacitados, que conheçam essa linguagem e entendam suas inovações", diz o advogado do escritório Momsen, Leonardos & Cia., Otto Licks. Ele mesmo é um ex-estudante de engenharia que acabou formando-se em Direito. A maior parte dos advogados que atua em novas tecnologias tem algum vínculo com Ciências Exatas diz. "A especialização é necessária em uma área em que a comparação entre programas de computador é essencial para averiguar a existência de plágio entre softwares, por exemplo", afirma Licks. Somente a partir de uma constatação desse tipo é possível entrar com uma ação de indenização ou requerimento de multa por quebra de contrato. Apesar de poder contar com peritos na área, é essencial que o advogado entenda os laudos e conheça a linguagem tecnológica. A advogada do Citibank, Sandra Gouveia, autora do livro "Direito na Era Digital", sua tese de pós-graduação na Escola de Magistratura do Rio de Janeiro, acredita que o interesse pelo setor, principalmente dos jovens, tem crescido muito. Ela afirma que recebe de 15 a 20 e-mails por semana de estudantes e advogados perguntando sobre como operar com novas tecnologias e pedindo ajuda para monografias e teses. (D.C.)