A ascensão da IA (Inteligência Artificial) não traz apenas novas tecnologias e soluções, há ainda muitas questões a serem respondidas, especialmente sobre o futuro dessa área e seus desafios éticos.
A Academia Brasileira de Ciência s lançou em 9 de novembro o documento . A publicação foi feita por um grupo de trabalho formado por 16 pesquisadores de diversas áreas do conhecimento.
O objetivo foi mapear os desafios para o desenvolvimento da IA no Brasil e apontar caminhos para seu uso responsável em todos os setores da sociedade onde a IA possa ser aplicada.
O diretor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, André Carlos Ponce de Leon Ferreira Carvalho, está no seleto time escalado para essa missão.
Coordenador da Rede de Inteligência Artificial Aplicada para Cidades Inteligentes e Sustentáveis IARA, e de várias pesquisas em IA, André conta que, em maio deste ano, o diretor da ABC e responsável por coordenar o grupo, Virgílio Almeida, formou o GT. “Foram chamados membros da ABC, pesquisadores de renome e coordenadores de centros de pesquisa em IA para elaborar esse documento cuja proposta era fazer uma análise inicial, detalhada, do estado atual da IA no país, do panorama internacional e dos investimentos necessários para avançar o conhecimento e uso da IA no Brasil, e de como a IA pode apoiar diferentes áreas de conhecimento”, disse.
Segundo André, foram feitas várias reuniões semanais até chegar a esse documento. “Além de um olhar profundo para a situação atual no país, estudamos a área no resto do mundo para saber qual a posição que estamos ocupando e o quanto o nosso país é competitivo, tanto na pesquisa quanto no seu uso pelo governo e pelas empresas brasileiras. Discutimos como a IA e suas aplicações podem beneficiar o país, nos aspectos sociais, econômicos e tecnológicos, cobrindo áreas como Saúde, Energia, Finanças, Clima, Biotecnologia, Educação, dentre outras”.
Apontamentos O futuro da sociedade brasileira será moldado pelas escolhas que o governo e a sociedade fizerem em relação à pesquisa, ao desenvolvimento e ao uso IA. E o cenário atual traz um alerta: sem investimento adequado na área, o Brasil pode ter um declínio tecnológico com impactos sem precedentes, porque a lacuna entre os países na vanguarda dos investimentos na tecnologia e os demais cresce com uma velocidade cada vez maior. Essa é uma das conclusões apontadas pelo relatório.
“É imperativo que o Brasil estabeleça políticas públicas e investimentos para reverter essa tendência sem demora. Se persistir a inércia, o impacto negativo será sentido a curto prazo na educação, nos demais índices sociais e na economia, com a consequente falta de competitividade empresarial em todas as áreas”, destaca o documento.
Durante o evento de lançamento, em um evento presencial e com transmissão pelo YouTube da ABC ( ), outros apontamentos foram discutidos pelos participantes.
Foram citados três pontos principais para o desenvolvimento do país nessa fronteira tecnológica: formação de pessoal qualificado, geração e armazenamento de dados de qualidade e criação de uma infraestrutura computacional adequada.
Segundo eles, o Brasil atualmente peca no primeiro e terceiro ponto, mas tem uma vantagem comparativa no segundo.
Os pesquisadores avaliam que o país precisa aprimorar o armazenamento de dados, com a criação de bancos de dados melhores, mais interligados e que sejam de fácil acesso e navegação.
Virgílio Almeida fez um alerta: “Utilizar IA apenas para substituir pessoas não é o que o país precisa. Devemos focar no aprimoramento das capacidades humanas, e não em sua substituição”.
Sobre a necessidade de investimentos, André lamentou que o Brasil não tenha empresas com protagonismo internacional, e chances de ser referência na área de IA. “O Brasil investe muito menos em relação a outros países do mundo. Está muito atrás dos Estados Unidos, da União Europeia, da China e do Japão. A menos que alguma coisa seja feita, o Brasil vai ficar para trás na corrida IA. E se tornar um mero consumidor de tecnologias desenvolvidas no exterior”, alertou.
Quanto à formação de recursos humanos qualificados, os especialistas reafirmaram durante o evento que o país sofre por ser um país em desenvolvimento. O Brasil atualmente perde muitos talentos na área, uma vez que a remuneração na academia não consegue competir com empresas e instituições estrangeiras. Muitos de nossos melhores alunos estão indo trabalhar no exterior.
“Fizemos recomendações no relatório sobre como podemos estimular a pesquisa brasileira, a importância de serem criados centros de pesquisa de excelência, manter no país, e até mesmo trazer do exterior, recursos humanos de alto nível e como melhorar a colaboração entre empresas, universidades e governo”, disse André.
“O Brasil terá de formular uma posição mais concreta, já que assume a presidência do G20 em 2024. Esperamos que o documento da ABC seja uma contribuição nesse sentido”, concluiu o coordenador do grupo, Virgílio Almeida.
Fazem parte do GT, junto com Almeida, os cientistas Adalberto Fazzio (USP), Altigran Soares da Silva (UFAM), Anderson da Silva Soares (UFG), André Carlos Ponce de Leon Ferreira de Carvalho (USP), Edmundo Albuquerque de Souza e Silva (UFRJ), Elisa Reis (UFRJ), Fabio Gagliardi Cozman (USP), Helder Nakaya (Hospital Israelita Albert Einstein), José Roberto Boisson de Marca (PUC-Rio), Luís Lamb (UFRGS), Mário Veiga Ferraz Pereira (PSR), Nivio Ziviani (UFMG), Soraia Raupp Musse (PUC-RS), Teresa Bernarda Ludermir (UFPE) e Wagner Meira Júnior (UFMG).
Texto: Raquel Vieira