Notícia

Correio Popular (Campinas, SP)

Dinheiro em árvores e terras (1 notícias)

Publicado em 25 de maio de 2021

Por Adilson Roberto Gonçalves

A atividade científica é dependente de políticas públicas e, portanto, de recursos. O industrial brasileiro preconiza um estado mínimo — na verdade, um estado omisso-, mas pouco faz para investir no desenvolvimento científico e tecnológico. A origem colonial de parte de nosso povo e cultura faz com que a dependência externa seja preponderante. E pouco sustentável, portanto. No Estado de São Paulo, a situação somente não é pior porque o orçamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e das universidades estaduais são garantidos pela Constituição e, mesmo assim, investidas acontecem, tais como a de José Serra, com seu decreto declaratório, e no governo Geraldo Alckmin, pela transferência de recursos da Fapesp para institutos de pesquisa, que ficaram sem parte significativa de seu próprio orçamento.

Mais recentemente, houve as duas mudanças no orçamento para a pesquisa científica feitas por João Doria, que levaram a forte mobilização da comunidade acadêmica para diminuir os danos. A própria existência dos institutos de pesquisa do Estado de São Paulo está ameaçada e já colocada em curso em alguns casos. Hoje, o governador usa o Instituto Butantan como a joia da coroa como contraponto ao governo federal em relação à acertada política de fabricação de vacinas, porém, o Butantan estava na lista de privatizações até outro dia. As mais diversas formas de atuação em relação à defesa dessas instituições são para garantir o patrimônio dos paulistas, não apenas o material, mas também o imaterial. Ciência, educação e cultura são os maiores vetores de desenvolvimento e estão continuamente ameaçados. O mau gestor vê apenas as questões financeiras imediatas, dentro de seu mandato, ignorando que sustentável significa a longo prazo.

A inquisição palaciana ao conhecimento e à ciência já está plenamente estabelecida no âmbito federal e procura-se reduzi-la no estadual. No âmbito municipal não são raras as investidas contra a lógica, o bom senso e a preservação de nossos patrimônios. A luta cidadã é uma luta política. O Instituto Agronômico volta à discussão em Campinas, com informações desencontradas de que o prédio da sede na Avenida Barão de Itapura estaria sendo transferido para o Município. A área da Fazenda Santa Elisa é perene objeto de cobiça para empreendimentos imobiliários que devastariam a nobre área de plantio e desenvolvimento dos mais diversos tipos de cultivares com a finalidade de implementar condomínios. Isso é público e um dia aquilo deixará de existir. Inserções e construções acontecem a todo instante, além de incêndios criminosos na área, como já relatamos e divulgamos, ainda que veladamente.

Ficamos na letra e na denúncia, porém, sabemos que o capital imobiliário é grande, uma vez que consegue produzir capital praticamente a partir do nada. Um terreno que hoje vale R$ 1,8 mil por metro quadrado (preço médio na Vila Nova), de um dia para outro, passa a valer mais de R$ 5 mil pela mesma área, simplesmente porque foi transformado em lote com capacidade de construção. Sem contar o valor final de uma área construída, que pode até deca duplicar esses números. Não é à toa que a especulação imobiliária é o principal vilão da preservação ambiental, histórica e cultural. Ou seja, dinheiro não dá em árvores, dá em terras. E E Adilson Roberto Gonçalves é pesquisador da Unesp, membro do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas, da Academia de Letras de Lorena e da Academia Campineira de Letras e Artes.