Mesmo rodeadas de inúmeros conflitos e preconceitos, mulheres vivendo em 2023, num país em construção social, projetam um futuro com mais oportunidades do que tiveram as suas ancestrais. A maior presença das mulheres nos negócios trouxe ganhos para a sociedade, a economia e as empresas, reduzindo, por meio do empreendedorismo feminino, as diferenças entre oportunidades profissionais para homens e mulheres e reforçando a diversidade no ambiente laboral.
De acordo com o relatório do Fórum Econômico Mundial de 2022, em meio a crises em larga escala, com o aumento do custo de vida, a pandemia da Covid 19, a emergência climática, entre outros fatores, o progresso em direção à paridade de gênero está estacionando. Para que a aceleração dessa paridade siga adiante, ela deve ser parte central da agenda pública e privada.
Estatísticas apontam que milhões de mulheres e meninas estão perdendo acesso a oportunidades, o que pode ser uma catástrofe para o futuro das economias, sociedades e comunidades. Um recorte estatístico com mulheres travestis e transexuais mostra que apenas 13,9% delas possuem empregos formais, segundo informações da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). O ingresso ou recolocação no mercado de trabalho é um desafio maior para essas pessoas, conforme mostra o mais recente relatório da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (Antra), apontando que 88% das pessoas acreditam que as empresas não estão prontas para a contratação de profissionais trans. Além disso, de acordo com a mesma pesquisa, 20% da população transexual está fora do mercado de trabalho.
A capacitação profissional é ferramenta que abre portas para o empreendedorismo, a redução do desemprego e a geração de renda, ampliando, assim, a diversidade e a inclusão no mercado de trabalho. Diferentes projetos vêm sendo implementados no país com foco nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 5 (ODS 5), da Organização das Nações Unidas (ONU), voltados para a igualdade de gênero e empoderamento de mulheres e meninas.
Qualificação para mulheres trans e travestis
É com essa perspectiva que o projeto Tecido Transformador, realizado em Salvador (BA) e patrocinado pela Fundação Toyota do Brasil, oferece cursos de corte e costura para 40 mulheres trans e travestis de baixa renda, sem necessidade de experiência prévia. O projeto visa desenvolver habilidades práticas, que impactarão na autoestima dessas mulheres, promovendo acolhimento e mudança de vida. O início das aulas está previsto para abril, ministradas ao longo de dois meses, com aulas de corte e costura e de empreendedorismo.
Para a líder do projeto, Bruna Fonseca, que também atua como apoiadora de projetos na instituição Mães do Arco-Íris, oportunidades como essa são importantes, já que muitos espaços, especialmente o do mercado de trabalho, não são inclusivos.
“O Tecido Transformador é um projeto extremamente importante porque não pára apenas na aula prática, mas também qualifica e ensina sobre empreendedorismo. Pessoas trans e travestis são marginalizadas pela sociedade. Por isso, conhecimento e emancipação, além, claro, de uma mudança gradativa da sociedade, são a chave para uma verdadeira inclusão”, disse ela.
Ao final do curso, as mulheres selecionadas participarão de uma feira de artesanato para terem experiência prática de venda e de relacionamento com o público.
Ocupando todos os espaços
As disparidades de gênero na área profissional devem-se a muitos e diferentes fatores, incluindo barreiras estruturais de longa data, transformações socioeconômicas e tecnológicas, além de crises econômicas.
Ainda assim, mais mulheres estão migrando para o trabalho remunerado e, cada vez mais, em posições de liderança, travando batalhas para ocuparem profissões consideradas para homens.
Em São Paulo, o Programa PotencializEE tem como meta a maior participação de mulheres na, tradicionalmente masculina, área da engenharia especializada em eficiência energética. Um exemplo disso, é o projeto “ Mentoria das Mulheres da Eficiência Energética. Nele, foram incluídas 30 engenheiras no curso que contemplou aulas sobre desenvolvimento pessoal, profissional e com foco em liderança, além de palestras com mulheres inspiradoras e mentoria individual para aplicação dos conceitos oferecidos em sala e elaboração de um plano de carreira.
Para democratizar o acesso a esse conhecimento, o programa vai disponibilizar em seu site, a partir deste mês, conteúdos que permitem aumentar oportunidades para outras mulheres e auxiliá-las na superação de barreiras pessoais e profissionais. O espaço, além de reunir o conteúdo da Mentoria, vai trazer um fórum para troca de experiências e circulação de oportunidades de empregos no segmento.
A iniciativa do PotencializEE, coordenado pela Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ), em parceria com o MME, SENAI-SP, BNDES, tem como objetivo fomentar o protagonismo feminino na transição energética, em especial na área de eficiência energética.
“Queremos garantir o acesso e o empoderamento das mulheres no setor, por isso a ideia de colocar o conteúdo da mentoria acessível a todas as mulheres que se interessarem. O PotencializEE busca estar cada vez mais alinhado com a ODS 5, contribuindo para que a sociedade alcance a igualdade de gênero e empoderando todas as mulheres e meninas até 2030", afirmou Joice Pereira, engenheira de energia e assessora técnica do PotencializEE pela GIZ.
Assim como na área de eficiência energética, cada vez mais mulheres estão interessadas em mecânica automotiva, outra área majoritariamente masculina. Para atender a essa demanda crescente, o projeto Elas Podem, apoiado pela Fundação Toyota do Brasil, vai qualificar 20 mulheres cis e trans que vivem em Campinas (SP) e região para atuarem com mecânica automotiva. Organizado pela OSC Associação de Assistência Social São João Vianney, o projeto oferecerá aulas em mecânica, gestão e empreendedorismo e palestras para comunidade do entorno da instituição, impactando cerca de 400 pessoas, ajudando mulheres em situação de vulnerabilidade a ter um projeto de vida, trabalhando suas autoestimas e fornecendo apoio socioassistencial.
Apoio a mulheres refugiadas
A luta pela inserção plena na sociedade ganha contornos ainda mais urgentes quando se trata de mulheres que precisaram abandonar os seus países de origem para se refugiarem no Brasil, devido ao agravamento de crises econômica e social em várias partes do mundo.
A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), o Pacto Global da ONU no Brasil e a ONU Mulheres, por meio do projeto Empoderando Refugiadas, promove, desde 2016, qualificação, empregabilidade e interiorização de mulheres refugiadas e migrantes que buscam oportunidades de trabalho no Brasil. Na última edição do projeto, na cidade de Boa Vista, em Roraima, 80 mulheres refugiadas participaram de capacitação profissional e 40 delas já foram absorvidas no mercado de trabalho por nove empresas parceiras.
Em Paconé, no Mato Grosso, com o projeto Crochetando o Futuro, (foto acima) 60 mulheres ganharam a oportunidade de conquistarem a sua independência financeira e ampliarem as suas atividades com a produção de ‘souvenirs’ para os turistas que visitam o distrito na região. A capacitação foi desenvolvida pela Chalana Esperança, da ONG Instituto Espaço Silvestre. O projeto foi um dos três selecionados no último edital da Fundação Toyota do Brasil (FTB) para receber um aporte financeiro de R$100 mil, para o fortalecimento de suas atividades na região
A igualdade de gênero está em processo de construção. Mesmo que de forma lenta, o protagonismo feminino na liderança empresarial ou em novos modelos de trabalho já é uma realidade. Agora, elas estão em todos os espaços, servindo de inspiração para que outras continuem essa luta diária.
Especial para Plurale