O pesquisador do Museu Nacional de História Natural do Smithsonian, Murilo Pastana, e seus colegas descobriram e descreveram duas novas espécies de peixes amazônicos – uma com impressionantes barbatanas vermelho-alaranjadas e a outra tão pequena que é tecnicamente considerada uma espécie de peixe em miniatura – em um artigo publicado hoje, 16 de maio, no Jornal Zoológico da Sociedade Linnean.
Ambas as espécies habitam águas localizadas no limite da invasão humana na floresta amazônica, cerca de 40 quilômetros ao norte da cidade brasileira de Apuí. Pastana e seus coautores, Willian Ohara, da Universidade Federal de Rondônia e Priscila Camelier, da Universidade Federal da Bahia, disseram que o desmatamento em curso na região coloca esses peixes de cerca de um centímetro de comprimento, parte de um grupo conhecido coloquialmente como o peixe sul-americano darters, em perigo iminente de extinção. Em particular, a mais colorida das duas espécies, Poecilocharax callipterusestá em risco porque seu alcance conhecido é limitado a um único córrego compreendendo aproximadamente 1,5 milhas quadradas de habitat.
“Foi emocionante encontrar novas espécies”, disse Pastana. “Mas no campo, vimos a floresta pegando fogo, caminhões madeireiros carregando árvores enormes e trechos desmatados transformados em pastagem de gado. Isso nos fez sentir muita urgência em documentar essas espécies e publicar este artigo o mais rápido possível.”
Como cientista nascido no Brasil, Pastana é apaixonado por preservar o patrimônio biológico do país, e sua esperança é que nomear e descrever essas espécies possa motivar o governo brasileiro a proteger e conservar esses peixes recém-descobertos e ameaçados de extinção.
A pequena subfamília à qual pertencem essas espécies de peixes anteriormente desconhecidas também é altamente desejável no mercado de aquaristas. Pastana, cujo trabalho é apoiado pela bolsa de pós-doutorado em Ictiologia Sistemática Sara E. e Bruce B. Collette do Smithsonian, disse que o comércio de peixes exóticos de aquário pode representar mais uma ameaça para essas duas novas espécies, mesmo que os cientistas estejam primeiro identificando-as formalmente e aprendendo de sua existência.
As expedições que descobriram essas novas espécies de água doce ocorreram entre 2015 e 2016. Pastana disse que o objetivo geral dessas incursões na Amazônia brasileira é buscar os tesouros biológicos ainda desconhecidos dos muitos cursos d’água da Bacia do Rio Madeira, a mais rica do rio no mundo em termos de biodiversidade de peixes de acordo com uma estimativa de 2019.
“Fomos para provar lugares que nunca foram visitados por cientistas”, disse Pastana. “Esta área é muito importante porque esta é uma das fronteiras onde o desmatamento está se movendo para o norte – a fronteira entre as novas cidades e a floresta nativa.”
A região de Apuí, onde esses levantamentos científicos foram realizados, está em segundo lugar na lista recente dos municípios brasileiros com as maiores taxas de desmatamento. Ironicamente, as mesmas estradas que facilitam a perda acelerada de habitat da região também facilitaram o acesso a riachos, lagoas e afluentes anteriormente inacessíveis para Pastana e seus colegas.
Assim, em 2015 e 2016, Pastana e outros acamparam ao longo de uma estrada chamada AM-174 e coletaram peixes usando redes, armadilhas e outros métodos. Todos os espécimes foram fotografados, catalogados e preservados para posterior estudo no Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo.
Um desses espécimes tem barbatanas vermelho-alaranjadas vívidas e uma mancha escura distinta na frente de sua cauda. Este peixe se destacou imediatamente como uma nova espécie, disse Pastana. O peixe, que agora recebeu o nome de P. callipterus, habita as margens do que os cientistas chamam de córrego de água negra, assim chamado porque suas águas são manchadas da cor do café pelos taninos lixiviados das folhas caídas. Os machos da espécie possuem coloração ainda mais intensa e ostentam barbatanas dorsais que podem ultrapassar a metade do comprimento do corpo, em média pouco mais de um centímetro. Apesar dos esforços direcionados para procurar essa espécie nas redondezas na viagem de volta de 2016, Pastana e seus colegas só conseguiram encontrar P. callipterus no córrego em que foi descoberto pela primeira vez.
Os pesquisadores encontraram a segunda nova espécie documentada nessas expedições de campo entre emaranhados de raízes de árvores que se projetavam das margens de riachos de água lamacenta – distintos dos relativamente translúcidos, embora manchados de escuro, riachos de água preta. Com o nome científico P. rhizophilus por seu amor (fil) de raízes (riz), esta espécie é amarelo âmbar com os machos possuindo estrias escuras nas barbatanas dorsal e anal. Mas talvez a qualidade mais distintiva dessa nova espécie seja que ela é tão pequena que os cientistas a consideram uma miniatura, uma designação dada a qualquer peixe que tenha menos de uma polegada de comprimento quando maduro, disse Pastana. Ele acrescentou que o estudo de laboratório revelou que nestes peixes de três quartos de polegada de comprimento, partes do esqueleto que normalmente são ossos são feitas de cartilagem.
Investigações genéticas confirmaram a relação evolutiva dessas duas novas espécies intimamente relacionadas e seus parentes, elevando o número total de espécies em sua pequena subfamília (Crenuchinae) para cinco. Esta é a primeira adição de uma nova espécie ao grupo em 57 anos.
Esses peixes, disse Pastana, são como obras de arte e “perder qualquer uma dessas espécies seria como perder obras-primas de valor inestimável”. Como obras-primas de Monet ou Picasso, cada espécie está cheia de detalhes insubstituíveis que podem ter alguma semelhança com outras criaturas da Terra, mas em conjunto são totalmente únicos. A extinção faria com que todos esses detalhes, forjados ao longo de milhões de anos de evolução, desaparecessem. “Você perderia tudo sobre essas espécies”, disse ele.
O financiamento e o apoio para esta pesquisa foram fornecidos pelo Smithsonian e pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo.