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Descoberta sugere um novo alvo para terapias contra o tabagismo

Publicado em 02 fevereiro 2011

Cientistas do Instituto de Pesquisa Scripps, na Flórida (Estados Unidos), identificaram uma via cerebral que regula a vulnerabilidade dos indivíduos às propriedades da nicotina que causam dependência. A descoberta sugere um novo alvo para terapias contra o tabagismo.

A pesquisa teve seus resultados publicados na edição on-line da revista Nature no domingo (30/1).

O trabalho examinou os efeitos de parte de um receptor - uma proteína à qual se ligam determinadas moléculas sinalizadoras - que responde à nicotina no cérebro.

Os pesquisadores descobriram que os modelos animais com uma mutação genética que inibe essa subunidade do receptor consumiram muito mais nicotina do que o normal. Este efeito pode ser revertido com o aumento da expressão da mesma subunidade.

``Acreditamos que esses novos dados estabelecem um novo cenário para a compreensão das variáveis que motivam o consumo de nicotina e também das vias cerebrais que regulam a vulnerabilidade à dependência do tabaco``, disse o coordenador do estudo, Paul Kenny.

``Essa descoberta também abre caminho a alvos promissores para o desenvolvimentos de potenciais terapias contra o tabagismo.``

O novo estudo teve foco, especificamente, na subunidade a5 do receptor de nicotina, em uma via discreta do cérebro conhecida como trato habenulo-interpeduncular.

A descoberta sugere que a nicotina ativa os receptores nicotínicos que contêm essa subunidade na habênula, desencadeando uma resposta que atua para diminuir o desejo de consumir mais a droga.

``Não era esperado que a habênula e as estruturas cerebrais nas quais ela se projeta, tivessem um papel tão profundo no controle do desejo de consumir nicotina``, disse Christie Fowler, primeira autora do estudo e pesquisadora do laboratório de Kenny.

``A habênula parece ser ativada pela nicotina quando o consumo da droga alcança um nível adverso. Mas, se as vias não funcionarem devidamente, o indivíduo simplesmente consome mais``, disse ela.

Os resultados, de acordo com Christie, podem explicar dados recentes que mostram como indivíduos com variação genética na subunidade a5 do receptor nicotínico são muito mais vulneráveis à nicotina e, também, muito mais propensos a desenvolver doenças associadas ao fumo, como câncer de pulmão e doença pulmonar obstrutiva crônica.

Fumar tabaco é uma das principais causas de óbito em todo o mundo, matando mais de 5 milhões de pessoas anualmente, de acordo com estatísticas citadas no estudo. O tabagismo é considerado a causa de mais de 90% das mortes por câncer de pulmão.

Os cientistas determinaram que uma tendência a fumar pode ser herdada: mais de 60% do risco de se tornar dependente da nicotina pode ser atribuído a fatores genéticos.

A nicotina age no cérebro estimulando proteínas denominadas receptores nicotínicos de acetilcolina (nAChRs).

Esses receptores são compostos por diversos tipos de subunidades, entre elas a subunidade a5, foco do novo estudo. No experimento, os autores procuraram determinar o papel das subunidades que continham nAChRs (a5* nAChRs) na regulação do consumo de nicotina.

Em primeiro lugar, avaliaram as propriedades que causam dependência na nicotina em camundongos geneticamente alterados para terem limitação de a5* nAChRs.

Os resultados mostraram que, quando os camundongos com as subunidades ``desligadas`` recebiam altas doses de nicotina, consumiam quantidades muito maiores que os camundongos normais.

Em seguida, para determinar se a subunidade era responsável pela mudança súbita no apetite por nicotina, os cientistas utilizaram um vírus que ``resgatava`` a expressão de a5* nAChRs apenas na habênula medial e áreas do cérebro em que ela se projeta. Os resultados mostram que os padrões de consumo de nicotina dos camundongos com as subunidades ``desligadas`` retornavam a uma escala normal.

Os pesquisadores repetiram o experimento com ratos e produziram resultados semelhantes. Neste caso, utilizaram um vírus para ``desligar`` as subunidades a5 nAChR na habênula medial.

Qaundo a a5* nAChRs era diminuída, os animais se tornavam mais agressivos, buscando doses mais altas de nicotina. Quando a subunidade permanecia inalterada, os animais se mostravam mais contidos.

O grupo passou a trabalhar com os mecanismos bioquímicos por meio dos quais a a5* nAChRs opera na habênula medial para controlar as propriedades da nicotina.

Descobriram que a a5* nAChRs regula o quanto a habênula responde à nicotina e que a habênula está envolvida em algumas das respostas negativas ao consumo da droga.

Assim, quando a a5* nAChRs não funciona direito, a habênula responde menos à nicotina e uma quantidade muito maior da droga pode ser consumida sem uma reação negativa do cérebro.

Os pesquisadores estão otimistas com a possibilidade da descoberta vir a auxiliar, um dia, os fumantes que querem abandonar o hábito.

Com base nas novas descobertas, o grupo do Instituto Scripps iniciou um novo programa de pesquisa, em colaboração com colegas da Universidade da Pensilvânia, para desenvolver novas drogas que estimulem a sinalização de a5* nAChR e diminuam as propriedades da nicotina que causam dependência.

O artigo Habenular a5 Nicotinic Receptor Signaling Regulates Nicotine Intake (doi: 10.1038/nature09797), de Christie D. Fowler e outros, pode ser lido por assinantes da Nature em www.nature.com.

(Agência FAPESP)