Pesquisadores do CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais), em Campinas (SP), descobriram uma enzima que pode aumentar a produção de bioenergia . A CelOCE (Cellulose Oxidative Cleaving Enzyme), uma nova classe de biocatalisador, é capaz de acelerar a desconstrução da celulose, uma das etapas mais importantes na produção de bioenergia e bioquímicos.
A pesquisa, realizada em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisa para Agricultura, Alimentos e Meio Ambiente da França (INRAE, da Universidade Aix Marseille) e a Universidade Técnica da Dinamarca (DTU), foi publicada nesta quarta-feira (12) na revista Nature.
A enzima foi identificada a partir do material genético de bactérias encontradas em resíduos de biomassa no Brasil. Seu mecanismo inovador permite que gere seu próprio co-substrato, tornando o processo mais eficiente e produtivo. Segundo Mario Murakami, pesquisador do CNPEM e líder do estudo, essa descoberta pode transformar a forma como a celulose é degradada na natureza e impulsionar novas tecnologias para biorrefinarias.
Com a CelOCE, podemos vislumbrar novas rotas para a produção de bioenergia , bioquímicos e biomateriais a partir de biomassa vegetal, contribuindo para uma economia de base biológica, baixo carbono e circular.
Mario Murakami, pesquisador doCNPEM
Impacto na indústria de biocombustíveis
Testes realizados sob condições industriais mostraram que a CelOCE, quando combinada com enzimas já utilizadas no setor, aumentou em até 21% a liberação de glicose a partir de resíduos vegetais. Isso significa maior aproveitamento da biomassa e redução de desperdício na produção de etanol e outros biocombustíveis.
O Brasil produziu 43 bilhões de litros de etanol em 2023, de acordo com a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). Com a nova enzima, esse volume poderia crescer sem a necessidade de expandir as áreas de cultivo, pois a CelOCE permite um uso mais eficiente de resíduos agroindustriais, como bagaço de cana , palha de milho e restos de madeira.
O volume exato desse aumento ainda não pode ser determinado, pois depende da quantidade de resíduos que será destinada à produção de etanol por meio da aplicação da enzima.
Pesquisa e inovação
O desenvolvimento da CelOCE contou com técnicas avançadas disponíveis no CNPEM, incluindo cristalografia por raios-X no Sirius, o acelerador de partículas brasileiro, e ferramentas de engenharia genética como CRISPR-Cas9. Antonio José Roque da Silva, diretor-geral do CNPEM, destaca que a descoberta só foi possível graças à integração de diferentes áreas científicas e colaborações internacionais.
Com apenas 115 aminoácidos, a enzima tem uma estrutura minimalista, o que abre caminho para novos usos, incluindo o desenvolvimento de enzimas sintéticas e até aplicações na reciclagem de resíduos plásticos.
Próximos passos
A patente da CelOCE já foi depositada, e o CNPEM está em processo de licenciamento para viabilizar sua aplicação comercial. Segundo Murakami, a implementação no setor produtivo pode ocorrer entre um e quatro anos após a finalização desse processo, dependendo da tecnologia utilizada.
A descoberta reforça o potencial da biotecnologia na transição para uma economia mais sustentável, substituindo processos baseados em petróleo por alternativas renováveis e de baixo impacto ambiental.