O Ministério da Saúde anunciou um marco importante no combate à dengue: a primeira vacina nacional contra a doença. A Butantan-DV, desenvolvida pelo Instituto Butantan, trará uma série de vantagens para o enfrentamento da enfermidade no Brasil. Entre os principais avanços estão a produção integral no país, um novo esquema vacinal de dose única e a ampliação da oferta de doses. Essas mudanças, segundo especialistas, tendem a aumentar a cobertura vacinal e facilitar o acesso da população ao imunizante.
A presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), Mônica Levi, ressalta que, apesar de o volume de 60 milhões de doses previsto para o próximo ano representar um aumento expressivo em relação à previsão inicial de 2025, a quantidade ainda é insuficiente para imunizar toda a população brasileira. Dessa forma, o Programa Nacional de Imunizações precisará definir quais grupos serão priorizados para receber o imunizante.
Atualmente, a vacina aplicada nos postos de saúde é a QDenga, fabricada pela farmacêutica japonesa Takeda. O imunizante está disponível para adolescentes de 10 a 14 anos em regiões com maior incidência da doença. Exceções ocorrem quando há doses próximas do vencimento, permitindo a aplicação em outras faixas etárias.
Com a chegada da Butantan-DV, especialistas esperam que novos estudos comprovem a eficácia e a segurança do imunizante também para idosos, que compõem o grupo com maior risco de mortalidade pela doença. Segundo Mônica Levi, mesmo que os adolescentes sejam os mais acometidos por casos graves, os idosos representam a maior taxa de óbitos.
“Os adolescentes internam-se mais e desenvolvem quadros graves, mas quem mais morre são os idosos. As vacinas atualmente disponíveis não incluíram a população acima de 60 anos nos estudos. No entanto, no projeto da Butantan-DV, pesquisas contemplam outras faixas etárias. Como a vacina do Butantan foi testada entre 2 e 59 anos, é provável que, em breve, estudos abranjam também os maiores de 60 anos” , explica a especialista. Para ela, essa ampliação é fundamental, pois os idosos apresentam maior taxa de mortalidade.
Uma das principais vantagens da Butantan-DV é o fato de ser a primeira vacina contra a dengue no mundo a ser administrada em dose única. Essa característica pode impulsionar as coberturas vacinais, pois facilita a adesão da população, especialmente entre os adolescentes, um grupo que frequentemente não completa esquemas vacinais de múltiplas doses.
“Independentemente da faixa etária, sempre há uma evasão entre a primeira e a segunda dose em esquemas múltiplos. Para os adolescentes, isso é ainda mais crítico. Campanhas com vacinas de dose única são mais eficazes, pois garantem que a imunização seja completa em um único momento “, afirma Mônica Levi.
A Butantan-DV foi desenvolvida em colaboração com o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos e a farmacêutica MSD. Apesar da parceria internacional, a vacina é considerada 100% nacional, pois todas as etapas de produção serão realizadas no Brasil, em cooperação com a empresa WuXi Biologics.
Para especialistas, a produção nacional representa uma vantagem estratégica, garantindo maior segurança no fornecimento do imunizante. “Não depender de acordos com laboratórios estrangeiros reduz o risco de desabastecimento, especialmente em situações de surtos ou epidemias. Ter autonomia na produção significa garantir uma oferta adequada para a população” , destaca Mônica Levi.
O imunizante é tetravalente, ou seja, protege contra os quatro sorotipos do vírus da dengue. Em testes clínicos, apresentou uma eficácia geral de 79,6%, chegando a 89,2% entre aqueles que já tiveram a doença. No entanto, a vacina ainda está em processo de análise pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável pela autorização do uso no Brasil.
Apesar do avanço, a distribuição da Butantan-DV para a população só deve ocorrer a partir de 2026. Por isso, Mônica Levi alerta que as medidas de prevenção ambiental continuam sendo essenciais para conter a propagação do Aedes aegypti, mosquito transmissor da doença.
A médica também destaca que a vacina não oferece “imunidade de rebanho”, pois a dengue não é transmitida de pessoa para pessoa. “Menos infecções reduzem a disseminação do vírus entre os mosquitos, mas não garantem proteção coletiva para indivíduos não vacinados, como gestantes ou imunocomprometidos”, alerta.
O Painel de Monitoramento do Ministério da Saúde indica que, neste ano, já foram registrados mais de 439 mil casos prováveis de dengue no Brasil, com 177 óbitos confirmados. Embora o número de casos em janeiro tenha sido inferior ao registrado no mesmo período do ano passado, quando houve um surto expressivo, os índices ainda superam os de 2023.