Estudos recentes exploram pitangas, cerejas e canelas brasileiras para o uso como produtos farmacêuticos.
“O que a gente faz é buscar a inspiração na natureza”, assim definiu o pesquisador André Gustavo Tempone, do Centro de Parasitologia e Micologia do Instituto Adolfo Lutz sobre o objetivo do seu trabalho. Ele é um dos responsáveis por uma ação em prol da saúde humana utilizando como base compostos encontrados na natureza.
Com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, a Fapesp, eles estudam e exploram o potencial da canela-branca ou canela-seca (Nectandra lanceolata) no combate à leishmaniose e à doença de Chagas. O trabalho foi iniciado em 2014, quando os pesquisadores isolaram o composto ativo e descobriram essa atividade potente, capaz de atingir as células do parasita e matá-lo através do bloqueio da produção de energia.
João Henrique Ghilardi Lago, pesquisador da Universidade Federal do ABC (UFABC) auxiliou nesse processo e André Gustavo Tempone explica que a descoberta foi fruto da colaboração de muitos outros especialistas também. “Com o apoio da universidade de Oxford, na Inglaterra, fizemos modificações químicas para esses compostos circularem no organismo igual a um fármaco”, define o pesquisador.
Atualmente, o estudo está na etapa de avaliação dos mais de 50 derivados químicos gerados a partir do protótipo encontrado pela manipulação e acredita-se que até o final de 2020 serão feitos testes em modelo animal. “O que nós buscamos é um composto que possa ser administrado por via oral, porque os que já estão no mercado são tóxicos ou não funcionam”, explica o pesquisador.
De forma complementar, uma pesquisa inédita no mundo feita por pesquisadores do Curso de Nutrição da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina, descobriu o poder da pitanga (Eugenia uniflora) e da cerejinha de Mattos (Eugenia mattosii), uma espécie em risco de extinção. O estudo verificou que os efeitos medicinais dos extratos das sementes dessas plantas podem estar associados à prevenção do câncer colorretal (no intestino grosso).
“No Brasil este tipo de câncer é o terceiro mais frequente em homens e o segundo entre as mulheres”, explica Sandra Soares Melo, professora que orientou a pesquisa. A pesquisadora ainda afirma que enquanto drogas e quimioterápicos, para o tratamento do câncer de cólon, exercem diversos efeitos colaterais, as plantas podem surgir como uma ação coadjuvante e menos agressiva.
Para chegar às conclusões, a pesquisa estruturou-se a partir do tratamento de 28 ratos com a substância, durante nove semanas. Inicialmente, o processo avaliou a capacidade das plantas de prevenirem mutações do DNA. “No grupo dos frutos que podem auxiliar no tratamento de diversas doenças, destacam-se aquelas de coloração avermelhadas e arroxeadas, devido às elevadas quantidades de polifenóis (substâncias antioxidantes)”, comenta Melo.
Após a realização de estudos, se nenhuma toxicidade for detectada para o uso em humanos, Melo acredita que a ingestão desses extratos poderá ser feita por meio de cápsulas. O projeto já foi até premiado com o primeiro lugar no 15º Congresso Internacional de Nutrição Funcional, em São Paulo (SP).
Em caso destas doenças citadas o pesquisador do Instituto Adolfo Lutz alerta: apesar das propriedades estarem presentes nos frutos, a ingestão deles in natura não é suficiente para combater as doenças. Até que os medicamentos criados por esses pesquisadores estejam à disposição e apresentem eficácia, o ideal é recorrer a um hospital em caso de sintomas.