Notícia

Diário do Comércio (SP)

Da beleza das palavras à sanha dos tiranos

Publicado em 19 junho 2009

Nelida Pinón, integrante e presidente da Academia Brasileira de Letras, sempre escreve com encanto, gentileza e criatividade, e em Coração Andarilho - Memórias, publicado pela Record, conta como foi, mas muito mais como lembra de ter sido, a sua vida de mulher que alcançou a independência e a consagração a partir de uma situação muito mais complicada para as mulheres brasileiras do que a de hoje. Ela descreve, entre outras coisas, a fase áurea do Rio do Janeiro nos anos 1940 e 1950, com seu singelo Carnaval de rua. E revela que seu nome é um anagrama do nome de seu avô galego Daniel, coisa que ela não sabia até já ser uma escritora famosa. Um livro imperdível para quem ama a beleza, particularmente a beleza das mulheres, a beleza das palavras e a beleza interior.

Em A Igreja Universal e seus Demônios - um estudo etnográfico, edição conjunta da Fapesp e da Editora Terceiro Nome, o antropólogo da Universidade de Campinas Ronaldo de Almeida, que já faz duas décadas pesquisa o neopentecostalismo, analisa como este difunde práticas muito mais consentâneas com a economia atual, junto às camadas mais carentes, do que outros credos religiosos. E como isso é particularmente correto no que se refere à Igreja do bispo Edir Macedo, que oferece, em troca da devoção e do dízimo, o caminho para a prosperidade terrena, a qual continuará depois da morte no Paraíso. Almeida documenta em especial como a Igreja Universal demoniza as religiões afrobrasileiras, muito difundidas entre alguns de seus principais públicos-alvo, e as quais ela aponta como cultos ao diabo.

Autor do romance Carlos Magno-A Vida do Imperador do Sacro Império Romano, lançado pela Ediouro, o escocês Allan Massie segue a linhagem de seu compatriota do século XIX, Walter Scott, verdadeiro criador do romance histórico. Massie já publicou as vidas romanceadas de Júlio César e do rei Artur, e nesse livro sobre Carlos Magno reconstrói o cotidiano da Europa Ocidental nos séculos VIII e XIX. Mais do que sobre o imperador, no entanto, fala sobre um de seus defensores nos combates contra os mouros, Rolando (o título original, aliás, teria de ser traduzido para Carlos Magno e Rolando). O autor faz uma reconstituição bastante boa do ambiente social da época, mas introduz no linguajar expressões atuais.

Diretor de criação dos documentários de história da BBC, o inglês Laurence Rees transformou em livro um documentário que fez sobre a Segunda Guerra Mundial, livro agora lançado no Brasil pela Larousse com o título de Stálin, os Nazistas e o Ocidente - A Segunda Guerra Mundial Entre Quatro Paredes, sendo o que vem depois do travessão o título original do livro. O tema central é como Hitler de um lado, e Roosevelt e Churchill de outro, se preocuparam em cortejar o autoritário dirigente soviético. Com base em arquivos soviéticos inacessíveis antes da queda do comunismo e entrevistas de sobreviventes que testemunharam o cotidiano soviético durante a Segunda Guerra Mundial, iniciada com a invasão da Polônia pela Alemanha Nazista, invasão possibilitada pelo famoso Pacto Germano-Soviético, Rees discute se realmente Stalin era "menos pior" do que Hitler. Seu retrato de Roosevelt e Churchill também não é tão lisonjeiro assim. Em Fuga do Iraque - A História Espetacular de um Homem que Escapou do Caos, do iraquiano radicado na Inglaterra Lewis Alsamari, cujo nome original é Sarmed Alsamari, e que havia passado a infância em território inglês, também editado pela Larousse, conta como escapou em 1994 do regime de Saddam Hussein, logo após ter sido recrutado para o serviço militar. Como sabia inglês, foi designado para servir num grupo estreitamente ligado a Saddam, mas desertou, embora a pena mínima para desertores fosse o corte da orelha direita. E fugiu do país, atravessando o deserto infestado de beduínos às vezes cruéis e de lobos acostumados a devorar seres humanos, testemunhando atrocidades cometidas pelo regime de Saddam contra a população iraquiana. Chegou à Jordânia e aí começou outra odisséia sua: para retirar do Iraque a mãe, o irmão e a irmã, presos quando as autoridades do regime de Saddam descobriram que ele saíra do país.