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Cultura quebrada, debate na Semana do Meio Ambiente da USP

Publicado em 31 agosto 2004

Na abertura da 2ª Semana do Meio Ambiente da USP, pesquisadores e representantes das comunidades tradicionais concordam: políticas públicas ambientais não podem esquecer do ser humano. Eduardo Geraque escreve para a 'Agência Fapesp': Famílias de pescadores habitavam a região há pelo menos 200 anos quando, na década de 1980, entre as opções de se construir no local loteamentos ou uma usina nuclear, o movimento ambientalista conseguiu que a região virasse uma unidade de conservação. Pela lei, isso significava que as comunidades tradicionais que viviam na área, formada por centenas de famílias, também teriam que romper com o passado. A história, que se arrasta até hoje, não ocorreu nos confins amazônicos. Tudo se passou em SP. 'Infelizmente o caso da Juréia (reserva localizada no litoral sul do Estado) é um exemplo de como as coisas não deveriam ser resolvidas', disse a pesquisadora Mareia Nunes, do Núcleo de Apoio a Pesquisa sobre Populações Humanas e Áreas Úmidas Brasileiras da USP, à 'Agência Fapesp'. A pesquisadora, que estuda as comunidades do litoral sul paulista, participou da mesa-redonda Políticas públicas: implicações nas comunidades e no ambiente, realizada durante o primeiro dia da 2a Semana de Meio Ambiente da USP, que foi aberta nesta segunda-feira (30/8), no campus da universidade na capital paulista. Segundo Mareia, como a região onde se criou a reserva já era habitada, isso deveria ter sido levado em consideração na época. 'Os abalos sócio-ambientais perduram até hoje. As comunidades não puderam continuar com a roça, com a extração do palmito ou com os seus hábitos de pesca', explica. O diagnóstico da pesquisadora é bastante claro. Para ela, não se trata de ser contra a unidade de conservação. Muito pelo contrário. 'Para se tentar resolver o problema, o que poderia ser feito hoje é criar uma reserva de desenvolvimento sustentável na área em que as comunidades viviam', disse. Segundo ela, como a área é muito grande - cerca de 79 mil hectares -, não é toda a unidade de conservação que precisaria ser aberta para as comunidades tradicionais. 'Para manter a comunidade e a sua cultura, é fundamental que as pessoas fiquem na mata', explica Dauro do Prado, um dos líderes da comunidade caiçara da Estação Ecológica Juréia-Itatins, que também participou do evento na USP. Segundo ele, uma das principais conseqüências desse processo no litoral paulista foi a marginalização daquele povo. 'Muitos que saíram da Juréia acabaram nas periferias das principais cidades da região e até de SP', disse Prado, pescador na Barra do Ribeira, município de Iguape. O exemplo da Juréia-Itatins, segundo Mareia, não é algo isolado. 'Isso ocorre em 80% das unidades de conservação brasileiras', disse. O líder xavante Hiparidi TopTiro, também presente ao debate, relatou um problema até mais grave, que a comunidade dele está vivendo no Mato Grosso, em pleno cerrado brasileiro. 'De dois anos para cá, por causa das condições precárias que vivemos, a mortalidade infantil das nossas famílias aumentou', disse. Os xavantes, que estão brigando na Justiça, foram expulsos de suas terras matogrossenses na década de 1960. (Agência Fapesp, 31/8) JC e-mail 2507, de 31 de Agosto de 2004.