Cerca de 51,1% do participantes relataram ter percebido declínio da memória após internação por COVID-19
Em um estudo realizado pela Universidade de São Paulo (USP), foi observado uma alta prevalência de déficits cognitivos e transtornos psiquiátricos em pacientes que se recuperaram das formas moderada e grave da infecção pela COVID-19.
A pesquisa, que teve início em 2021 e foi publicada recentemente, contou com 425 participantes avaliados entre seis a nove meses após alta hospitalar do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).
Para fazerem as avaliações, os pesquisadores tiveram como método entrevista psiquiátrica estruturada, testes psicométricos e uma bateria cognitiva.
Os resultados completos foram divulgados na revista General Hospital Psychiatry e contou com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Depressão, ansiedade e estresse pós COVID-19
O principal intuito do estudo era entender se o coronavírus e a doença por ele causada têm impacto no longo prazo, produzindo manifestações tardias no sistema nervoso central.
Segundo os resultados da pesquisa, cerca de 51,1% dos participantes relataram ter percebido um declínio da memória após a infecção, enquanto outros 13,6% desenvolveram transtorno de estresse pós-traumático.
O transtorno de ansiedade generalizada (TAG) foi diagnosticado em 15,5% dos voluntários, sendo que em 8,14% deles o problema surgiu após o coronavírus.
Já o diagnóstico de depressão foi estabelecido para 8% dos pacientes, em 2,5% deles somente após a internação.
"Nenhuma das alterações cognitivas ou psiquiátricas observadas nesses pacientes se correlaciona com a gravidade do quadro", conta ao Jornal da USP, Rodolfo Damiano, médico residente do Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP e primeiro autor do artigo.
O médico esclarece que também não foi observada nenhuma associação com a conduta clínica adotada no período de hospitalização ou com fatores socioeconômicos, como perda de familiares ou prejuízos financeiros durante a pandemia de COVID-19.
Conclusão da pesquisa
Este foi o primeiro estudo a acessar as taxas de morbidade psiquiátrica e cognitiva após formas moderadas ou graves de COVID-19 usando medidas padronizadas.
Para o professor e pesquisador Eurípedes Constantino Miguel Filho, o fato de não ter sido encontrada uma correlação clara entre a condição psiquiátrica e a magnitude da doença na fase aguda ou a fatores psicossociais indica que as sequelas deixadas pela presença do vírus no corpo - como inflamações e a presença do vírus no cérebro - teriam ligação direta com o surgimento de transtornos como a depressão e ansiedade.
"A presença de manifestações clínicas, como perdas cognitivas, cefaleias, anosmia [perda do olfato] e outras alterações neurológicas nesses pacientes contribuem com evidências adicionais de que essas alterações psiquiátricas possam refletir a ação do sars-cov-2 no sistema central", explica o médico.
Atualmente o grupo de pesquisadores estudam para descobrir se há correlação entre o grau de inflamação durante a fase aguda da COVID-19 e o desenvolvimento de sintomas neuropsiquiátricos.
Para quem já foi afetado, os pesquisadores indicam vacinação e acompanhamento psiquiátrico, além de meditação, exercícios físicos e reabilitação cognitiva.