Notícia

Correio Popular (Campinas, SP)

Corte de verbas ameaça ensino na Unicamp

Publicado em 10 dezembro 1999

Por JOSÉ PEDRO MARTINS
O ensino universitário público, gratuito e de qualidade conquistado pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e outras universidades públicas está sob o risco de desintegração, a partir do ano 2000, em função de vários ingredientes que apontam para uma queda brusca nos orçamentos dessas instituições. No caso da Unicamp, as pressões derivam dos cortes em Ciência e Tecnologia promovidos pelo governo federal, das privatizações e das conseqüências da reforma tributária em discussão no Congresso Nacional. As inquietações da direção da Unicamp, relacionadas ao futuro do ensino e pesquisa de qualidade praticados na instituição, ficaram claras ontem, durante o lançamento do Anuário Estatístico da Unicamp - 1999, uma publicação produzida pela Pró-reitoria de Desenvolvimento Universitário. O Anuário contém informações que, na avaliação da Pró-reitoria, comprovam a expressiva melhoria do desempenho acadêmico e científico da Unicamp na década de 1990, que coincide com o período de vigência da autonomia universitária alcançada em 1989 (leia texto nesta página). Entretanto, na opinião da direção da Unicamp, todas as conquistas alcançadas estão ameaçadas pela grave crise conjuntural no País. O reitor da Unicamp, Hermano Tavares, é enfático no texto de apresentação do Anuário: "Não parece haver dúvida de que o ensino universitário público, gratuito e de boa qualidade, representado por um conjunto de instituições arduamente construído pela sociedade durante décadas, encontra-se sob risco de desintegração ou enfraquecimento face aos constantes ataques que vem sofrendo e a uma permanente controvérsia sobre as fontes de seu financiamento." De acordo com o reitor, a "gravíssima crise financeira na Unicamp - duplamente atingida pela insuficiência dos financiamentos públicos ao ensino superior e à saúde no biênio 1998/99 - que também aflige suas co-irmãs USP e Unesp", ameaça as conquistas acumuladas até o momento por essas e outras instituições. O Anuário divulgado ontem contém dados que ratificam os temores da direção da Unicamp. O número de bolsas de mestrado concedidas a alunos da Unicamp pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), uma das agências de financiamento à pesquisa do governo federal, caiu de 982 em 1995 para 465 em 1998. O número de bolsas de mestrado e doutorado concedidas pela Capes, igualmente ligada ao governo federal, também tem caído. Os reflexos da queda no número de bolsas concedidas pelas agências federais apenas têm sido compensa- dos pela concessão de um número maior de bolsas pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), agência vinculada ao governo paulista que tradicionalmente investe menos em bolsas. Outro ingrediente da conjuntura nacional que ameaça a qualidade do ensino e pesquisa praticados na Unicamp é a privatização. Muitos contratos na área de produção científica eram mantidos pela Unicamp com ex-estatais. Com a privatização, em especial nas áreas de telecomunicações e energia, o número de contratos de cooperação científica externa mantidos pela Unicamp tem-se mantido estacionado nos últimos anos. A reforma tributária em debate no Congresso Nacional também gera preocupação para a direção da Unicamp. A reforma em discussão projeta reformulações no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é hoje a principal fonte orçamentária da Unicamp e de outras universidades públicas de São Paulo. Atualmente, Unicamp, USP e Unesp recebem 9,57% do ICMS líquido recolhido em São Paulo. O orçamento da Unicamp para o ano 2000 é de R$ 457 milhões. Mas a Unicamp ainda tem pela frente a verdadeira "bomba relógio" representada pelo pagamento dos inativos. Hoje 17% da folha de pagamento da universidade são destinados para os salários dos aposentados. Esta proporção era de 2,5% em 1989. "A questão dos inativos é um grande desafio", diz o pró-reitor de Desenvolvimento Universitário, Luís Carlos Guedes Pinto.