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Jornal Floripa

Controle de Putin sobre eleição anula efeito da morte de Navalni, diz pesquisador (11 notícias)

Publicado em 16 de fevereiro de 2024

Alexandr Cherstobitov vê ‘autoritarismo eleitoral' na Rússia e descarta possibilidade de grandes manifestações

A morte de Alexei Nalvani, o mais conhecido crítico do governo de Vladimir Putin, chacoalhou a população da Rússia, mas não terá qualquer impacto sobre a eleição presidencial do país prevista para o mês que vem. A avaliação é do cientista político russo Alexandr Cherstobitov, que descreve o sistema político local como um “autoritarismo eleitoral”, cujo espaço para dissidências é praticamente nulo.

Navalni, 47, foi declarado morto nesta sexta-feira (16) em uma prisão na remota região de Iamalo-Nenets, no Ártico. Segundo o Serviço Federal Prisional da Rússia, que não divulgou as causas da morte, o ativista se sentiu mal após uma caminhada, “perdendo quase imediatamente a consciência”.

A notícia reverberou em todo o mundo, e críticos do Kremlin afirmam que o opositor foi assassinado na cadeia. Na Rússia, onde Putin tem índices altos de aprovação, a morte foi recebida com luto, mas também com comemoração de apoiadores do presidente, segundo Cherstobitov. “Não há quase ninguém indiferente à notícia.”

Mas a polarização da sociedade não terá reflexo nas urnas, afirma o cientista político. Ele se refere ao pleito do mês que vem, com algum nível de sarcasmo, como um “evento do tipo eleitoral” controlado pelo que chama de elites políticas e cujo resultado —a reeleição de Putin— já é sabido de antemão.

“No entanto, as ‘eleições' ainda são importantes por vários motivos: legitimação do regime e dos autocratas, mobilização daqueles que estão envolvidos no funcionamento do regime, competição entre as elites internas etc.”, diz Cherstobitov. “Ao mesmo tempo, a administração de todos os procedimentos eleitorais está sob rígido controle e, portanto, o assassinato de Navalni não terá impacto sobre eles.”

Desde o início da Guerra da Ucrânia, há quase dois anos, o governo russo ficou ainda mais autoritário, segundo o especialista. Ex-professor universitário de ciência política em São Petersburgo e pesquisador independente, ele atualmente mora em São Paulo e dá aula como professor convidado pelo programa Pesquisadores em Risco, da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

O pesquisador descarta a possibilidade de haver grandes protestos na Rússia devido aos riscos de punição e de penas duras. Afirma, no entanto, que manifestações mais sutis devem ocorrer, como a organização de funerais simbólicos —nada, de novo, capaz de alterar o curso do pleito. Nesses casos, processos após eventuais detenções tramitariam na esfera administrativa, não criminal, em que a pena máxima prevista é bem menor.

Bastaram poucas horas após o anúncio da morte de Navalni para a Procuradoria de Moscou emitir um alerta contra protestos na capital russa. A legislação do país não permite que mais de uma pessoa se reúna em manifestações sem autorização do município. Atos maciços contra o governo mobilizados em 2017 por Navalni tentavam driblar a regra com convocações online e rápida dispersão.

Se as manifestações nas ruas devem ser tímidas, o governo Putin, por outro lado, deve explorar a morte de forma política, diz Cherstobitov. “Eles [autoridades] já começaram a falar. Dizem que sua morte é algo favorável ao Ocidente porque as elites ocidentais tentarão usá-la para culpar as elites russas e a Rússia. Ao mesmo tempo, Putin se manterá em silêncio. Para ele, mencionar Navalni significa que ele o reconhece como um oponente político.”

A Comissão Eleitoral Central da Rússia barrou na semana passada o único postulante a presidente abertamente crítico de Putin de disputar o pleito de março, o ex-deputado liberal Boris Nadejdin. Segundo autoridades, a postulação foi indeferida porque ele não conseguiu reunir as 100 mil assinaturas necessárias, o que ele nega.

Para Cherstibitov, a morte de Navalni também não vai influenciar os rumos da Guerra da Ucrânia, que completará dois anos no próximo dia 24. O ativista era crítico da invasão do país de Volodimir Zelenski. “A propaganda persuade as pessoas de que a única maneira de acabar com a guerra é vencendo.”