Em evento na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP15), em Copenhague (Dinamarca), o governador de São Paulo, José Serra, defendeu o potencial do etanol brasileiro como fonte de energia limpa capaz de contribuir com os esforços de mitigação e de adaptação ao aquecimento global. Ao apresentar as ações ambientais do governo paulista, Serra destacou o papel da pesquisa científica e, em particular, dos programas da FAPESP voltados para mudanças climáticas, bioenergia e biodiversidade.
O evento "Agricultura - Florestas Plantadas - Bioenergia", promovido pela Aliança Brasileira pelo Clima no dia 14, reuniu cerca de 30 organizações não-governamentais que atuam no Brasil, além de empresários e autoridades como o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o secretário do Meio Ambiente de São Paulo, Francisco Graziano, e o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz.
Serra criticou a visão de algumas lideranças internacionais sobre o etanol brasileiro e classificou como "mitos" as ideias de que a produção de etanol possa invadir a Amazônia ou resultar na escassez de alimentos no mundo."Essa fantasia do etanol como fator de destruição da Amazônia e causa de crise alimentar é uma confusão que parte do menosprezo ao progresso tecnológico que, no entanto é uma variável crucial.
A produtividade da cana-de-açúcar por hectare em São Paulo aumentou cerca de 40% desde a década de 1970 só com base em inovações de institutos de pesquisa no Estado e do setor privado", disse. Para o governador, a exploração irracional da madeira e a expansão da pecuária e da soja são os verdadeiros problemas ambientais para a região amazônica - e não o etanol. "Os centros produtores de cana-de-açúcar estão a 2 mil quilômetros da Amazônia. Não vejo essa ameaça à floresta por causa do etanol", afirmou.
O Estado de São Paulo ainda teria potencial imenso de aumento da produtividade do etanol de cana-de-açúcar, uma vez que apenas um terço da energia da planta é utilizada para a produção do biocombustível. Segundo Serra, com investimentos em pesquisa científica, como o melhoramento genético, será possível maximizar consideravelmente a produção de etanol sem aumentar a área plantada."O fomento e a coordenação de pesquisas científicas nessa área têm sido feitos por meio da FAPESP", disse.
O governador destacou três programas que têm contribuído para o combate ao aquecimento global: o Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG), o Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN) e o Programa Biota-FAPESP. "O PFPMCG, inclusive, é associado ao governo federal, que entra com metade dos recursos, sendo que o programa todo dispõe de R$ 64 milhões. O BIOEN tem parcerias com a iniciativa privada e se dedica a pesquisas que vão da fisiologia da planta à alcoolquímica. E o Biota-FAPESP, que produz estudos sobre a biodiversidade, é um dos maiores programas de pesquisa do mundo", apontou.
Outra política ambiental do governo de São Paulo mencionada por Serra foi a Lei de Mudanças Climáticas. "A lei paulista prevê uma redução absoluta das emissões - isto é, não se baseia em cortes por unidade de PIB, nem em mera desaceleração. Trata-se de redução em termos absolutos. E isso não é uma tarefa fácil, até porque a energia utilizada em São Paulo é mais limpa que a de outros centros industriais", afirmou. "Ciência e tecnologia estão no cerne do debate mundial sobre mudanças climáticas e meio ambiente e os programas da FAPESP contribuem para que as estratégias do Brasil possam ser, sempre que o governo assim desejar, baseadas em conhecimento, como tem demosntrado o Governo de São Paulo ao promulgar recentemente resoluções e decreto baseados nos resultados obtidos pelo Biota-FAPESP", destacou Brito Cruz.
Brasil na liderança
Serra se declarou otimista em relação ao papel brasileiro no contexto mundial de esforço pela mitigação e adaptação às mudanças climáticas, já que o país é líder no uso de matrizes energéticas renováveis, que deverão ganhar importância crescente."Um dos grandes cacifes do Brasil no plano internacional é a energia renovável. O que está acontecendo no mundo é uma crise do modelo de desenvolvimento da revolução industrial.
Um modelo que vem do fim do século 18 e é baseado fundamentalmente na energia fóssil. Estamos assistindo uma mudança de paradigma e uma nova revolução industrial, que será baseada em tecnologias de baixo carbono", disse.Os países que se adiantarem na busca do novo paradigma terão uma posição de liderança no futuro, segundo o governador. E o Brasil está adiantado, já que mais da metade da frota de automóveis utiliza etanol, que tem um balanço energético muito melhor que o etanol de milho, por exemplo."Nossa ideia é que o Brasil deveria apresentar uma proposta, nos fóruns internacionais, que classificamos como E-10. Isto é, que o mundo adote como padrão uma mistura de 10% de etanol no tanque de gasolina. Por si só, essa medida trará um avanço enorme. E é algo factível em um horizonte de 20 anos", disse.
Com essa proposta, segundo ele, o Brasil estaria na liderança mundial, com impacto positivo importante em termos de emprego e renda. "Alguns países desenvolvidos alegam que o etanol só é viável quando subsidiado, mas falam isso porque estão pensando em seus próprios insumos. No contexto deles, a produção de etanol consome combustíveis fósseis. Mas isso não ocorre com o nosso etanol", disse.Para Serra, no entanto, há duas barreiras para que o etanol tenha o alcance desejado pelos brasileiros. Uma delas é que, para ser adotado globalmente, o biocombustível precisa ser transformado em commodity."Isso implica padronização, estar na bolsa de valores e ter garantia de oferta. Estamos, em São Paulo, contribuindo com esse encaminhamento, mas o setor privado tem aí um papel indispensável.
Também é importante destacar que não queremos monopolizar o mercado: é até importante que haja mais produtores. Só assim poderemos formar um mercado confiável", afirmou.A outra barreira para o etanol brasileiro, segundo Serra, é o protecionismo. Os países desenvolvidos impõem uma taxa de US$ 0,54 centavos por galão do biocombustível. Além da tarifa, países como os Estados Unidos adotam, para sua própria produção de etanol de milho, subsídios que chegam a US$ 10 bilhões. "O protecionismo é exercido com cinismo pelos Estados Unidos", disse Serra.
Para demonstrar o excesso de protecionismo, Serra leu uma declaração recente de Arnold Schwarzenegger, governador da Califórnia, estado norte-americano que consome mais etanol que toda a produção do Brasil."Subsidiando o etanol baseado no milho e impondo tarifa de US$ 0,54 centavos por galão, o governo norte-americano tenta desestimular a importação do etanol mais importante que existe, que é o do Brasil. Isso é uma loucura. Para atingir a meta proposta de 15% de biocombustíveis na próxima década, teríamos que consumir mais que toda a colheita de milho dos Estados Unidos. Não faz sentido, é loucura e definitivamente não é do interesse dos consumidores norte-americanos", disse Schwarzenegger, em texto lido pelo governador paulista.
Planeta Universitário / Agência FAPESP