O mundo em que vivemos caracteriza-se por sentir a cada dia o impacto da ciência e da tecnologia. As autoridades de todos os países, inclusive do Brasil, manifestam de maneira clara e contundente a certeza de que são molas mestras para o desenvolvimento sustentado. O desenvolvimento de um parque científico e tecnológico depende de dois fatores básicos: recursos financeiros e recursos humanos. Vamos analisá-los separadamente.
No que se refere ao primeiro, a situação, do Brasil é lamentável. As duas principais agências de financiamento do Ministério da Ciência e Tecnologia, o CNPq e a Finep, não liberam os recursos aprovados há cerca de dois anos. Quando o fazem é de gota a gota, procurando evitar a completa asfixia dos grupos. Os mais importantes grupos, de pesquisa, com exceção daqueles localizados no estado de São Paulo, não têm a menor condição de planejar o desenvolvimento dos projetos. As teses dos alunos de pós-graduação já não são desenvolvidas dentro do espírito ideal em que se planejam, experiências necessárias para dar respostas às perguntas levantadas e sim planejando-se o que pode ser feito dentro das inúmeras limitações existentes e que vão desde falta de equipamentos modernos até a manutenção dos existentes.
Ressaltei acima que São Paulo é uma exceção. Realmente a existência da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo permite que os bons grupos de pesquisa daquele estado possam trabalhar com certa tranqüilidade, fazendo com que aumente a cada ano a distância entre São Paulo e os demais estados. A distância no desenvolvimento científico e tecnológico reflete-se rapidamente na distância do desenvolvimento industrial e econômico, no nível e na qualidade de empregos. Neste contexto, a situação do Rio de Janeiro é crítica. Aqui encontramos importantes instituições científicas federais, que vêm atravessando dificuldades sucessivas em face da quase falência do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro, que deveria desempenhar papel semelhante a da Fundação paulista, vive patinando ao longo de sucessivos governos. O novo projeto de interiorização da ciência, com a Universidade Estadual do Norte Fluminense, localizada em Campos, há 13 meses só recebe recursos mínimos para manutenção, desmotivando a equipe de implantação e impossibilitando a chegada de novas equipes.
No que se refere à formação de recursos humanos, o apoio do CNPq e da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, e de várias fundações estaduais e das universidades, permitiu que a comunidade científica e tecnológica brasileira realizasse bom trabalho. Contamos hoje com grande número de bolsistas desenvolvendo atividades dentro das possibilidades decorrentes da situação do financiamento.
É como decorrência da política de formação de recursos humanos, aliada à intensa dedicação de numerosos membros da comunidade científica brasileira, que se pode comemorar o fato de que o Brasil alcança a 23a posição entre os países que mais têm contribuído com artigos (cerca de 3.300, selecionados entre cerca de 70.000) publicados nas principais revistas científicas de circulação internacional reconhecidas pelo Instituto de Informação Científica, sediado nos Estados Unidos. A contribuição brasileira representa 0,6% de toda a produção científica internacional, suplantando países como a Noruega (0,5%), África do Sul (0,4%) Argentina, (0,3%), México (0,3%) e todos os chamados tigres asiáticos. Ao mesmo tempo em que temos razões para comemorar esses índices, devemos também tomar consciência de que esta não deveria ser a nossa posição em face dos índices econômicos que nos colocam como oitava ou nona potência econômica. No campo da produção científica este posto é hoje ocupado pela Itália, que produz 3,3% do total. Devemos fazer um grande esforço para que dobremos nossa participação na comunidade científica internacional nos próximos cinco anos, o que nos colocaria em posição semelhante à da Bélgica, Israel e China. É importante assinalar os que estão na nossa frente, como os Estados Unidos (30,8%), Japão (8,2%), França (5,6%), Canadá (4,3%), Rússia (4%), Itália (3,3%), Holanda (2,2%), Austrália (2,1%), Espanha (2%), Suécia (1,8%), Índia (1,6%), Suíça (1,6%), China (1%), Israel (1%), Bélgica (1%), Dinamarca. (0,9%), Polônia (0,9%), Formosa (0,8%), Finlândia (0,7%) e Áustria (0,6%). A comunidade científica brasileira se encontra preparada para dar um salto significativo. Precisa, no entanto, ver as autoridades federais e estaduais se articularem para que seus discursos se transformem em prática.
Membro da Academia Brasileira de Ciências; ex-diretor do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ; ex-reitor da Universidade Estadual do Norte Fluminense.
Notícia
Jornal do Brasil