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Conheça o inseto que transforma baratas em “zumbis”

Publicado em 15 janeiro 2020

Por Gabriela Brumatti, Terra da Gente

Uma vespa-joia se aproxima de uma barata. Com duas ferroadas, atordoa o animal e deixa-o em estado de transe, como um “zumbi”. Então começa a guiá-lo para um esconderijo desejado, onde poderá depositar seus ovos no corpo do inseto e, ainda vivo, fazê-lo servir de alimento para os futuros filhotes.

O flagrante curioso (e meio sinistro) foi registrado por um atento observador da fauna de Itanhaém (SP). O fotógrafo e funcionário público Carlos Eduardo Quaresma já desenvolve trabalho com as aves da cidade, monitorando e mapeando as espécies através de registros fotográficos do município. As descobertas desta vez, porém, não vieram através de seus animais preferidos.

O observador responsável pelo registro da vespa e da barata flagra as aves de Itanhaém (SP)

“Elas (as vespas) sempre aparecem aqui no quintal de casa e, quando percebi que estava carregando a barata, busquei rapidamente a câmera para realizar o registro”, descreve o observador, que já havia ouvido falar do fenômeno através de documentários.

A interação entre os insetos é considerada uma relação entre predador e presa, como descreve Fabio Nascimento, professor da USP de Ribeirão Preto e coordenador de estudos sobre o comportamento social de vespas e abelhas, com apoio da Fapesp.

Ele explica que a ação começa assim que uma fêmea de vespa-joia percebe que está próxima da época de deposição dos ovos e vai atrás de um local seguro para “dar luz” aos filhotes. Com as ferroadas que aplica no cérebro da barata, inibe os sentidos do inseto para que fique à mercê dos comandos da predadora. “Elas ferroam a presa não com o objetivo de matar, mas de anestesiar. O veneno é um neurotóxico, que paralisa as baratas”, explica Nascimento.

Segurando pelas antenas, a vespa vai puxando a barata para algum refúgio nas redondezas. A estratégia mantém o corpo da vítima ainda quente: um berçário para futuras vespinhas. O fotógrafo responsável pelo registro descreve o processo: “No local abrigado, (a vespa) irá depositar seus ovos diretamente nas articulações das patas das baratas, um local mais fácil para seus filhotes, quando eclodirem dos ovos, comerem todo o interior da vítima, deixando apenas uma casca vazia”.

O professor Fabio Nascimento explica ainda que as vespas são capazes de caçar diversos outros insetos ou até aracnídeos, muito maiores do que elas, para servirem como “hospedeiro” dos filhotes. “O corpo da aranha ou da barata mantém o ambiente estável, o que favorece todo o desenvolvimento de larvas até a fase adulta, dentro do corpo da presa”, relata.

Se a interação curiosa parece até fábula, o professor da USP explica que a arte imita a vida. “Os filmes de ficção científica, como “Alien”, se baseiam muito na biologia desses insetos. Naquele caso, o alienígena se desenvolvia no corpo do astronauta, uma relação semelhante à observada”, descreve.

Carlos, que nunca tinha assistido a esse ataque das vespas ao vivo, conta que achou muito interessante e, com humor, descreve uma das lições que tirou. “Depois de alguns dias, consegui outros registros delas com as baratas já atacadas, então percebi que precisava dar uma boa exterminada nas baratas daqui, pois onde há alimento, há o predador”, comenta ele.

Já o pesquisador afirma que essa relação ocorre por todo o Brasil, mas em ambientes urbanos esse fenômeno é mais difícil de ser visto, já que o animal precisa do solo “nu” para se abrigar. Em períodos chuvosos isso muda, com a abundância de insetos, a situação se torna mais comum de ser verificada.

Se a fotografia de natureza já era paixão do observador Carlos Quaresma, que carrega a câmera até quando vai ao supermercado na expectativa de conseguir um flagrante, a prática provou a capacidade de encontrar fenômenos inusitados envolvendo a vida de pequenos insetos. “É um novo mundo quando você consegue ampliar os detalhes destes seres tão fascinantes”.

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