Uma equipe internacional de cientistas fez história ao simular, pela primeira vez, a quebra espontânea de simetria (SSB, na sigla em inglês) em temperatura zero, utilizando um processador quântico supercondutor. Com uma fidelidade superior a 80%, esse avanço representa um marco significativo na computação quântica e na física da matéria condensada.
O experimento partiu de um estado clássico antiferromagnético, onde as partículas exibem spins orientados em direções alternadas, e evoluiu para um estado quântico ferromagnético, no qual os spins estão alinhados na mesma direção, estabelecendo correlações quânticas.
“O sistema começou com uma configuração flip-flop de spins alternados e, espontaneamente, evoluiu para spins alinhados. Essa transição de fase é resultado da quebra de simetria”, explica Alan Santos, coorganizador do estudo e físico do Instituto de Física Fundamental do Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC), na Espanha. Anteriormente, Santos era bolsista FAPESP de pós-doutorado na UFSCar.
A pesquisa, conduzida em colaboração entre a Southern University of Science and Technology (Shenzhen, China ), a Aarhus University (Dinamarca) e a UFSCar, foi publicada na revista Nature Communications
O grande avanço deste estudo foi simular a dinâmica em temperatura zero. Anteriormente, investigações sobre transições dessa natureza foram realizadas apenas em temperaturas acima de zero. Santos afirma: “Ao zerar a temperatura, conseguimos observar a quebra de simetria mesmo em interações locais entre partículas vizinhas.”
Embora o zero absoluto não possa ser alcançado fisicamente, a equipe utilizou computação quântica para simular as condições desse estado. O experimento empregou um circuito quântico de sete qubits, permitindo interações somente entre vizinhos imediatos e aplicando um algoritmo para simular a evolução adiabática.
A transição de fase foi verificada através de funções de correlação e da entropia de Rényi, que evidenciaram a formação de padrões ordenados e emaranhamento quântico. O emaranhamento é uma propriedade fundamental da mecânica quântica, permitindo que dois conjuntos de partículas fiquem correlacionados de tal forma que o estado de um determina instantaneamente o estado do outro, mesmo a grandes distâncias.
Santos destaca a importância do emaranhamento e da superposição como recursos centrais na computação quântica. “A superposição possibilita que um sistema exista em múltiplos estados ao mesmo tempo, enquanto o emaranhamento cria correlações que não podem ser replicadas em computadores clássicos,” compara.
Em termos práticos, a diferença entre computadores clássicos e quânticos se reflete no desempenho. Ambos podem resolver os mesmos problemas, mas um computador quântico pode concluir cálculos complexos, como a fatoração de números grandes, de maneira significativamente mais rápida.
O estudo demonstrou a viabilidade de usar recursos de computação quântica para simulações de sistemas quânticos. A implementação foi realizada com qubits supercondutores, utilizando ligas de alumínio e nióbio, em temperaturas de milikelvin. Santos ressalta que a escalabilidade dos qubits supercondutores é uma grande vantagem, permitindo a construção de chips com centenas deles.
O conceito de quebra de simetria é fundamental em várias áreas da física, pois define as leis de conservação e permite a formação de estruturas complexas. “A simetria nos fornece as leis de conservação; sua quebra é responsável pela emergência de complexidade,” conclui Santos.
O artigo Digital simulation of zero-temperature spontaneous symmetry breaking in a superconducting lattice processor pode ser acessado em: Nature Communications
Informações da Agência FAPESP