Um computador que é parceiro do médico na hora de diagnosticar o paciente e que a cada exame analisado, se aprimora. Esta não é uma situação hipotética ou diretamente retirada dos roteiros de filmes de ficção científica, mas algo que está sendo desenvolvido em terras cearenses há alguns anos e até já faz parte do dia a dia de algumas unidades de saúde pública. O nome do método é auto-explicativo: diagnóstico assistido por computador, conceito que une fundamentos de Inteligência Artificial (IA) e aprendizado de máquina (no caso, do software que é executado no computador).
A figura do médico continua sendo essencial para a avaliação da saúde do paciente e diagnóstico. O sistema nada mais é do que um "tira-teima" ou uma segunda opinião para o trabalho de profissionais radiologistas e médicos. "Digamos que eu tenha a imagem de uma jogada em uma partida de futebol. É importante saber onde está o último jogador da defesa, para saber se o atacante está impedido. No entanto, apontar onde está o último zagueiro não quer dizer que o atacante esteja em impedimento - quem vai decidir é o árbitro, de acordo com as regras. Da mesma forma, acontece com os médicos. A partir das informações dadas a ele por meio dos exames e do software, é que se vai decidir se o paciente tem uma doença ou se precisa de novos exames", exemplifica o professor Pedro Pedrosa, coordenador do Laboratório de Processamento de Imagens, Sinais e Computação Aplicada (Lapisco) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE). O Lapisco está desenvolvendo, em parceria com universidades nacionais e estrangeiras, uma versão alternativa de programas de auxílio ao diagnóstico que já existem em alguns países, mas em versões pagas e com valores de licença de uso inacessíveis a boa parte das instituições de saúde.
"O que os softwares para auxílio a diagnóstico médico fazem é aprender a partir de exemplos anteriores, ou seja, a partir de imagens com diagnósticos já dados. Assim, ele aplica esse conhecimento que veio do banco de dados e ajuda no reconhecimento de uma informação nova, que é a doença da qual ainda não se tem conhecimento, no exame específico que o programa está analisando. Isso se chama 'machine learning', pois a máquina está 'aprendendo', a cada diagnóstico e, por meio de Inteligência Artificial, se torna apta a identificar novos casos", destaca.
Um método similar é utilizado, por exemplo, em programas que fazem reconhecimento de pessoas em multidões. Ao ser alimentada com a foto do rosto da pessoa, o computador pode localizá-la em outros contextos - ao passear na rua ou assistir a um show, por exemplo. Outra aplicação da Inteligência Artificial é o reconhecimento de placas de veículos e de rostos por sistemas de segurança, a exemplo do Sistema Policial Indicativo de Abordagem (Spia), utilizado pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS).
Na indústria, a IA é utilizada pela Usina Termelétrica do Pecém como etapa no processo de manutenção que utiliza realidade aumentada e realidade virtual. "Estamos usando uma rede neural artificial, que permite simular em computador o comportamento humano no processamento e tomada de decisões", afirma Tarcísio Pimentel, engenheiro de manutenção.
"Por exemplo, em relação às caldeiras: elas oferecem dados relativos às vazões de ar e comportamento do moinho. A rede neural seleciona os melhores resultados de cada índice para indicar quais as configurações geram menores consumos, algo que está diretamente ligado à eficiência energética", aponta. "A ferramenta de Inteligência Artificial é interessante porque ela aprende e tira padrões, sugerindo saídas até mais interessantes para problemas e objetivos que a gente encontra no dia a dia", destaca.
Assinatura genética é capaz de indicar sobrevida de pacientes com câncer de mama
Segundo os pesquisadores, o motivo de o estudo ter sido feito especificamente com câncer de mama está na disponibilidade de dados da doença Por Agência Fapesp
Pesquisadores identificaram uma assinatura genética com valor prognóstico capaz de prever a sobrevida de pacientes com certos tipos de câncer de mama. A descoberta leva também a uma melhor compreensão sobre os mecanismos moleculares de um processo de vascularização conhecido como angiogênese patológica, essencial para o desenvolvimento de diversas doenças.
A pesquisa, publicada na revista PLOS Genetics, combinou estudo sobre genes envolvidos na retinopatia patológica – lesões oculares que também servem como modelo para o estudo de angiogênese – e dados da expressão gênica (transcritoma) de bancos de dados públicos sobre o câncer de mama.
Realizado por pesquisadores do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP) em colaboração com o Instituto de Pesquisa do Câncer de Ontário (OICR, da sigla em inglês), no Canadá, o estudo contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
“Identificamos um conjunto de genes cuja expressão no câncer de mama se correlaciona com o grau de vascularização (angiogênese) patológica do tumor. Trata-se, portanto, de uma assinatura gênica para a angiogênese que é prognóstica e mais robusta que as assinaturas identificadas anteriormente, dada a correlação existente entre a angiogênese e os tumores de modo geral”, disse Ricardo Giordano, professor do IQ-USP e autor do estudo.
No estudo, os pesquisadores brasileiros identificaram 153 genes alterados entre retinas normais e retinas patológicas em camundongos. A partir dessa lista foram identificados 149 genes humanos equivalentes. O resultado foi utilizado como base da pesquisa sobre a assinatura gênica, com a parceria do grupo canadense. Para isso o grupo utilizou um banco de dados com informações de pacientes com câncer de mama. Desse total, 11 genes-chave envolvidos na angiogênese patológica foram os que tiveram o melhor desempenho para uma assinatura de prognóstico.
Câncer de mama e retinopatia têm em comum o processo de angiogênese. “O fato de essas duas doenças compartilharem esse processo e de a angiogênese ser fundamental para desenvolvimento de cânceres nos levou a tentar fazer a ponte entre retinopatia e câncer de mama”, disse João Carlos Setubal, coordenador do Programa Interunidades de Pós-Graduação em Bioinformática da USP, também autor do artigo.
Segundo os pesquisadores, o motivo de o estudo ter sido feito especificamente com câncer de mama está na disponibilidade de dados dessa doença. “Precisávamos ter acesso a dados públicos em vasta quantidade, pois existe muita variação de pessoa para pessoa. E justamente para câncer de mama havia um conjunto de dados disponível para nosso estudo, com informações de 2 mil pacientes”, disse Setubal.
A partir dessa assinatura, os pesquisadores pretendem encontrar aplicações, sobretudo em terapias contra o câncer de mama. “Nosso objetivo agora é dar continuação ao estudo da angiogênese no câncer. Estamos interessados em identificar genes nessa lista que possam ser alvo para o desenvolvimento de novas drogas ou reaproveitamento de drogas existentes”, disse Giordano.
É importante ressaltar que a assinatura gênica para a angiogênese poderá ter uma possível aplicação clínica muito diferente daquela do gene marcador BRCA1. O gene – assim como o BRCA2 – ficou conhecido mundialmente em 2013, quando a atriz norte-americana Angelina Jolie se submeteu a duas mastectomias após ter descoberto, a partir de um exame, mutações específicas nesse gene, indicando que teria risco de 87% de desenvolver câncer de mama.
“O BRCA1 é um gene do genoma. Uma mulher com mutações nesse gene tem maior risco de desenvolver a doença, porém ela não necessariamente vai desenvolver câncer de mama. Portanto a presença do gene com mutações serve para ajudar a prever o aparecimento da doença. A assinatura do nosso estudo se mostrou promissora para prever o desenvolvimento da doença depois que ela de fato apareceu”, disse Setubal.