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Composto produzido por coral invasor elimina o parasita da doença de Chagas (48 notícias)

Publicado em 07 de fevereiro de 2023

Os resultados do estudo, apoiados pela FAPESP, foram reconhecidos em artigo publicado na revista ACS Omega, da Sociedade Americana de Química

A partir da década de 1980, um animal marinho conhecido popularmente como coral-sol (Tubastraea tagusensis) começou a ser observado no litoral brasileiro, ancorado em plataformas de petróleo na Bacia de Campos, no Rio de Janeiro. Hoje, essa espécie invasora, originária do Indo-Pacífico, já se manifesta por mais de 3,5 mil milhas (km) da costa brasileira e é considerada uma ameaça à diversidade biológica por destruir outras espécies de corais, se reproduzindo rapidamente e não ter um predador natural.

Ao analisar as toxinas produzidas pelo coral-sol para se defender contra a predação por peixes e outros organismos e competir por espaço e substratos, pesquisador do Instituto Adolfo Lutz, da Universidade Federal do ABC (UFABC) e do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (Cebimar-USP) constatou que uma das substâncias secretadas pelo animal é capaz de combater o Trypanosoma cruzi, parasita causador da doença de Chagas.

Os resultados do estudo, apoiados pela FAPESP, foram ouvidos em artigo publicado na revista ACS Omega, da Sociedade Americana de Química.

“Se por um lado o coral-sol é um vilão para a biodiversidade marinha, por outro tem potencial de ser benéfico para a vida humana ao produzir uma substância química com potencial farmacológico para combater uma doença que afeta 7 milhões de pessoas e carece de tratamentos eficazes”, diz à Agência FAPESP André Gustavo Tempone Cardoso, pesquisador do laboratório de novos fármacos para doenças negligenciadas do Instituto Adolfo Lutz e coordenador do projeto.

O cientista teve o primeiro contato com o coral-sol na década de 1990, ao mergulhar na Ilha Grande, em Angra dos Reis (RJ).

“Naquela época eu não sabia que esse coral, que é muito bonito, é uma espécie invasora”, afirma Tempone.

Ao falar de suas impressões sobre o coral-sol com Álvaro Esteves Migotto, o pesquisador do Cebimar e coautor do estudo refletiu que o animal produzia toxinas que matavam outros corais encontrados no litoral brasileiro, como o coral-cérebro (Mussismilia hispida), e que estava dominando as paisagens marinhas.

Com base nessa observação, eles examinam a coleta de amostras do coral-sol no canal de São Sebastião, litoral norte de São Paulo, onde está localizado o Cebimar, para analisar os compostos químicos produzidos pelo animal.

O estudo foi cuidado durante o doutorado de Maiara Romanelli Silva, primeira autora do artigo e orientanda de Tempone.

“Há muitos estudos sobre a biologia do coral-sol, mas ainda não existiam pesquisas relacionadas à atividade farmacológica dos compostos que ele produz”, afirma Tempone.

Composto candidato

Por meio de fracionamento guiado por bioatividade, os investigadores identificaram compostos químicos produzidos pelo coral-sol com potencial ação antiparasitária. Empregando técnicas de ressonância magnética nuclear e espectrometria de massa de alta resolução, eles conseguiram isolar e caracterizar quimicamente uma substância candidata para combater o Trypanosoma cruzi.

Já estudos tratados pelo pesquisador João Henrique Ghilardi Lago, professor da UFABC, permitiram elucidar a estrutura da molécula e tratar-la como um alcaloide indólico 6-bromo-2 de metilaplisoposina.

“Essa substância pertence a uma classe de compostos muito interessantes do ponto de vista farmacêutica por apresentar atividades biológicas de interesse para o tratamento de doenças humanas”, explica Tempone.

Os pesquisadores testaram o composto químico puro contra o T. cruzi em células de mamíferos (in vitro) nas fases extracelular (tripomastigota) – presente na fase inicial da doença de Chagas, em que o parasita ainda está circulando no sangue – e intracelular (amastigota) ), presente na fase crônica da doença, quando o parasita desaparece da circulação por já ter invadido as células, principalmente as do coração e dos músculos digestivos.

Os resultados dos ensaios indicaram que o composto foi capaz de eliminar o parasita nestas duas fases, sem apresentar efeitos tóxicos nas células mesmo na concentração mais alta.

Já os resultados dos estudos de controle de ação do composto no T. cruzi sentiram que a substância afetava os níveis de cálcio do parasita, alegre na mitocôndria a geração de ATP [adenosina trifosfato] – uma fonte de energia celular.

“O composto danifica a única mitocôndria que o parasita possui e que fabrica o ATP”, explica Tempone.

Por meio de um estudo computacional (in silico), também foi avaliada a semelhança de compostos químicos com fármacos disponíveis no mercado para o tratamento da doença de Chagas, com base em suas propriedades físico-químicas e parâmetros farmacodinâmicos.

As análises indicaram que o composto tem propriedade semelhante a de diversos fármacos aprovados no mercado. Um dos únicos medicamentos disponíveis hoje para o tratamento da doença é o benzonidazol, que, apesar de reduzir a carga de T. cruzi em pacientes crônicos, não evita danos cardiológicos causados ​​pela enfermidade e nem outros sintomas, como o aumento do cólon, além de causar graves efeitos colaterais.

“Agora estamos dedicados a conseguir fazer a síntese total de compostos derivados dessa molécula, com maior potência, e testá-los em modelo animal”, diz Tempone.

Elton Alisson
São Paulo, SP

Agência FAPESP