Estratégia combina controle biológico e vacina de dose única para ampliar a proteção
O Brasil tenta conter uma das maiores crises de saúde pública da região: os surtos de dengue, que em 2024 atingiram recordes de casos e mortes. Para enfrentar o problema, o país aposta em duas frentes — a produção local de uma vacina inédita e a liberação de mosquitos infectados com a bactéria Wolbachia, que bloqueia a transmissão do vírus.
A estratégia ganhou reforço em julho, com a inauguração em Curitiba da maior biofábrica do mundo dedicada a esse método. A instalação tem capacidade de gerar 100 milhões de ovos de mosquitos por semana e pretende proteger, por ano, até 14 milhões de pessoas. O Brasil lidera a adoção global da técnica, também testada em países como Indonésia, Vietnã e Colômbia.
Paralelamente, o Instituto Butantan concluiu os estudos clínicos de uma vacina de dose única. Os testes em mais de 16 mil voluntários apontaram até 89% de eficácia em pessoas que já haviam contraído dengue e 74% entre não expostos. A expectativa é que, após aprovação da Anvisa, o imunizante comece a ser distribuído em larga escala pelo SUS.
Limitações das vacinas importadas
Até agora, a única vacina aplicada no país é a Qdenga, da farmacêutica japonesa Takeda. Apesar de já incorporada ao sistema público, a cobertura segue restrita: o governo comprou apenas nove milhões de doses em 2024, suficientes para 4,5 milhões de pessoas. Além do preço alto, a produção global não atende à demanda brasileira. Outro ponto sensível é que o imunizante não demonstrou eficácia uniforme contra os quatro sorotipos do vírus.
Com a vacina nacional, o governo aposta em preços mais baixos e maior independência. O presidente Lula anunciou a intenção de comprar 60 milhões de doses anuais a partir de 2026, reforçando a prioridade dada ao programa. O Butantan já iniciou a fabricação para garantir rapidez após a autorização regulatória.
Enquanto a imunização avança, a Wolbachia oferece uma camada adicional de proteção. A bactéria não elimina o mosquito, mas altera sua biologia, reduzindo a capacidade de transmissão do vírus. Para especialistas, a combinação dos dois caminhos — vacina nacional e controle biológico — pode colocar o Brasil à frente na luta contra a dengue em escala mundial.