A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e a coordenadora de Promoção à Política Linguística da Secretaria de Articulação de Direitos Indígenas (SEART) do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Altaci Kokama, participaram, nesta terça-feira (20), do evento de lançamento do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas realizado em São Paulo (SP). A iniciativa é fruto de articulação do MPI com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) em razão da Década Internacional das Línguas Indígenas (2022-2032).
Com investimento de R$ 14 milhões da FAPESP, o espaço é voltado ao incentivo da pesquisa, documentação e divulgação das culturas e línguas indígenas, com prioridade para fomentar ações que envolvam indígenas e suas comunidades. O centro é vinculado ao Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE/USP) e ao Museu da Língua Portuguesa (MLP), que inicialmente será a sede para o desenvolvimento das atividades. As três instituições são do Governo do Estado de São Paulo.
“O lançamento do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas representa o florescer de uma memória viva, um compromisso com o futuro. Ele nasce do encontro entre instituições que compreendem o valor que os nossos povos carregam: o valor da palavra, o valor da ancestralidade, o valor de uma cultura que resiste há mais de 500 anos e que segue viva, forte, alimentando a alma deste país”, afirmou a ministra Sonia Guajajara durante o evento.
Hoje, no Brasil, são faladas 274 línguas indígenas que possuem relações de parentesco entre si e são agrupadas em famílias linguísticas. As duas principais famílias linguísticas ou troncos linguísticos no Brasil são tupi e macro-jê. São chamados de troncos porque contêm subfamílias. Mas existem outras grandes famílias linguísticas: Pano, Caribe, Arauak, que não estão relacionadas às línguas isoladas. Há famílias pequenas e línguas isoladas ou de recente contato, além das línguas indígenas de Sinais e o Braslind, o português falado pelos povos indígenas.
“A ciência e a tecnologia têm um papel estratégico na preservação e difusão de línguas indígenas. A Antropologia e a Linguística, entre outras áreas do conhecimento, associadas às tecnologias digitais e de comunicação, possibilitarão que a sociedade conheça e valorize as línguas e os conhecimentos tradicionais, blindando as culturas originárias do risco do esquecimento”, disse Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP, sobre o centro.
Durante o evento, MPI e FAPESP também assinaram um Protocolo de Intenções com o objetivo de envidar os esforços necessários para promover a cooperação em pesquisa e difusão de conhecimento sobre os povos indígenas do Brasil, acerca de suas línguas, cultura, cosmopercepção e outros campos, para serem desenvolvidos em projetos e programas que envolvam as comunidades e pesquisadores(as) indígenas como protagonistas.
“Esse protocolo é mais uma forma de afirmar o que repetimos tantas vezes: nada sobre nós sem nós. Nenhuma política, nenhuma pesquisa, nenhuma decisão pode ser feita sem escutar a voz dos nossos povos. Sem respeitar o nosso tempo, a nossa forma de existir, o nosso modo próprio de pensar a vida e o mundo”, concluiu a ministra.
Próximos passos
Com um plano de trabalho de cinco anos iniciais, as atividades do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas começam com as reuniões do Conselho Consultivo e Comitê de Ética, a formalização das parcerias institucionais, o desenvolvimento técnico do repositório digital, a seleção dos bolsistas e a estruturação das pesquisas, a realização de encontros temáticos e a realização de um seminário internacional em novembro, que fará parte da programação da Temporada França-Brasil 2025.
A implantação do espaço será realizada a partir de parcerias sólidas com comunidades indígenas. O Centro atuará em três linhas principais de ação: pesquisa e documentação; construção do repositório digital de acesso gratuito no qual estarão armazenadas as coleções; e comunicação cultural que se concentrará em ações de mediação intercultural e de difusão. O objetivo é dar visibilidade a esta diversidade e contribuir para que a sociedade brasileira reconheça e valorize as línguas indígenas e os complexos sistemas de conhecimento desses povos.
As coleções digitais serão constituídas a partir da pesquisa e documentação linguística com foco nos territórios indígenas em Rondônia e na Região das Guianas, importantes áreas multilíngues do país; e de projetos de documentação antropológica voltados ao registro abrangente de práticas e conhecimentos indígenas, sob demanda e interesse das comunidades envolvidas. As ações de difusão serão realizadas em colaboração com instituições parceiras e comunidades indígenas por meio de seminários, oficinas, exposições, programação cultural, ações educativas e produtos editoriais, tendo como públicos-alvo as comunidades indígenas, pesquisadores, estudantes, professores, profissionais de museus e pessoas interessadas em geral.
Articulação
O diálogo entre MPI e FAPESP teve início durante agenda oficial da ministra Sonia Guajajara na França, em março de 2024, quando participou, como convidada de honra, da inauguração da exposição “Nhe’e Porã: memória e transformação”, na sede da UNESCO, em Paris. Na ocasião, ela se encontrou com o presidente da FAPESP, Antônio Zago, onde dialogaram sobre a possibilidade de futuras parcerias entre o ministério e a instituição.
“A partir dessa conversa inicial, a Secretaria de Articulação de Direitos Indígenas (SEART) assumiu uma grande articulação com a FAPESP, que contou com uma série de conversas e encontros, com a participação do GT Nacional da Década Internacional das Línguas Indígenas no Brasil. O resultado é esse Centro que lançamos hoje”, afirmou a coordenadora e primeira professora universitária indígena da Universidade de Brasília (UnB), Altaci Kokama, que comemorou: “na Década Internacional das Línguas Indígenas temos um novo balançar! Que soem os maracás, os tambores, nossas línguas indígenas têm novos parceiros”.
*Com informações do Museu da Língua Portuguesa