A poluição da baía de Santos, localizada no litoral de São Paulo , já é um problema conhecido entre especialistas.
Em meio a vários resíduos que ameaçam o ecossistema da região, a cocaína , detectada tanto nas águas como em materiais sedimentares e em organismos marinhos, vem acendendo um alerta na comunidade científica.
Uma análise da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) identificou graves efeitos toxicológicos em alguns animais, levando pesquisadores a considerarem o poluente um contaminante emergente preocupante. O tema foi discutido durante a FAPESP Week Illinois , evento que visa estimular parcerias científicas entre São Paulo e o Centro-Oeste dos Estados Unidos, ocorrido em Chicago.
Uma pesquisa de 2017 identificou pela primeira vez o alto acúmulo de cocaína em água superficial na baía de Santos.
Na época, os pesquisadores acreditavam que a contaminação era uma consequência do Carnaval, período em que a pesquisa foi conduzida.
Porém, um monitoramento prolongado mostrou o contrário. A cocaína continuou presente na região durante todo o ano, inclusive contaminou mexilhões.
Investigando mais a fundo, os pesquisadores identificaram graves efeitos toxicológicos em mexilhões-marrons, ostras de mangue e peixes.
Os resultados dos estudos levaram os pesquisadores a considerar a cocaína um poluente perigoso, que poderá acarretar grandes problemas para o ecossistema no futuro.
A cocaína hoje é, de fato, um contaminante da baía de Santos. Encontramos contaminação pela droga espalhada por toda a região
Camilo Seabra, um dos pesquisadores durante a FAPESP Week Illinois,
A cocaína que vai parar na água da baía de Santos acaba sendo absorvida por organismos que vivem ali. Os pesquisadores descobriram um alto nível de dopamina e serotonina em mexilhões, que são consequências da contaminação e podem afetar o sistema reprodutivo dos animais. Enguias expostas à droga também mostraram problemas na formação de óvulos e na produção de hormônios. Já nas ostras de mangue, a droga teve efeitos citotóxicos e genotóxicos graves.
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A Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), quando questionada pela Agência FAPESP sobre o assunto, afirmou que monitora a qualidade das águas costeiras, mas concluiu que as concentrações encontradas na baía de Santos não representam riscos imediatos para os mexilhões estudados nem para os banhistas.
Estudos geoquímicos indicam que a cocaína começou a se acumular no estuário de Santos desde os anos 1930, mas suas concentrações aumentaram nas últimas décadas. Isso é atribuído à região ser uma rota chave do tráfico da droga da América do Sul para a Europa e ao aumento do consumo de drogas ilícitas, como cocaína e crack, na região.
A falta de tratamento de esgoto também é apontada como um fator, contribuindo para as altas concentrações de cocaína na baía de Santos. Para entender melhor o problema, os pesquisadores planejam iniciar um programa epidemiológico baseado em águas residuais para identificar o consumo de drogas na população.
Além da cocaína, os pesquisadores também estudam outro contaminante emergente, o material particulado atmosférico, que tem origem na indústria metalúrgica e pode ter efeitos tóxicos em organismos aquáticos.