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Cientistas empregam técnica usada pela Nasa para detectar mercúrio em chorume (1 notícias)

Publicado em 25 de outubro de 2017

A espectroscopia de emissão ótica com plasma induzido por laser (LIBS, na sigla em inglês), foi usada pela agência espacial norte-americana, a Nasa, para detectar água e elementos químicos no solo marciano.

Agora, os pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP) empregaram a LIBS para detectar mercúrio em amostra superconcentrada de chorume de um aterro sanitário de Cachoeira Paulista, interior do estado. Chorume é um líquido escuro poluente gerado pela decomposição de resíduos orgânicos e o mercúrio é um dos elementos químicos mais tóxicos para a saúde humana e prejudicial ao meio ambiente. O trabalho foi detalhado no artigo “Análise semiquantitativa de mercúrio em lixiviados de aterro usando a espectroscopia de emissão óptica com plasma por pulso duplo de laser”, publicado com destaque no periódico Applied Optics, da Sociedade Óptica (The Optical Society - OSA).

Desenvolvida pela Embrapa, a técnica vem sendo utilizada pela pesquisadora Débora Milori em outras aplicações, mas é a primeira vez que é empregada para detectar e avaliar os níveis de mercúrio em chorume de aterro sanitário. Os resultados obtidos abrem um leque de possibilidades para continuar a investigação, incluindo a detecção de outros elementos poluentes. Os cientistas buscam, agora, melhorar o limite de detecção de mercúrio, atualmente em 76 partes por milhão (ppm).

A aplicação de LIBS na avaliação dos níveis de mercúrio em percolados líquidos de aterro sanitário, conhecido como chorume, é uma técnica ambientalmente limpa, porque não requer preparo de amostras utilizando reagentes químicos. É também considerada rápida, uma vez que realiza medidas em tempo real e muito mais barata comparada a outras técnicas. Métodos convencionais exigem preparação de amostras e geram resíduos químicos.

O estudo é resultado de um trabalho de pós-doutorado do físico Gustavo Nicolodelli, supervisionado por Débora Milori, em parceria com os professores Carlos Renato Menegatti e Hélcio José Izário Filho da Escola de Engenharia de Lorena da Universidade de São Paulo (EEL-USP), e Bruno Spolon Marangoni, do Instituto de Física da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS).

Nicolodelli disse que nesse trabalho foi utilizado um sistema LIBS com dois lasers (DP-LIBS) para obtenção de um plasma mais intenso. O projeto de desenvolvimento do DP-LIBS foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp - projeto nº 12/24349-0). “A vantagem do sistema DP-LIBS é melhorar o limite de detecção da técnica, tornando-a mais precisa e sensível quando comparada a sistemas LIBS convencionais”, esclarece.

Para detectar a presença do mercúrio, a pesquisadora Débora Milori explica que o chorume foi liofilizado para produzir um material sólido, em seguida foram fabricadas pastilhas com o material. “Ao incidir o laser na pastilha de chorume, o material absorve a energia e passa por um processo de aquecimento e ruptura de moléculas gerando um plasma na superfície. A temperatura inicial do plasma gira em torno de 50.000 K (próximo à temperatura na superfície do Sol). A luz emitida por este plasma pode ser capturada e analisada por um espectrômetro, e essa informação espectral pode viabilizar uma análise de vários elementos químicos presentes na amostra, e particularmente, pode-se medir a quantidade de metais pesados como o mercúrio em minutos”, diz.

É possível fazer essa análise utilizando-se técnicas convencionais, como a espectroscopia de absorção atômica, fluorescência de raios X, espectroscopia de emissão de plasma acoplado indutivamente e espectrometria de massa de plasma acoplado indutivamente. Mas a cientista esclarece que esses métodos, embora bastante precisos, em geral têm um custo alto de análise por amostra ou exigem processos longos de digestão. Outros ainda possuem fontes de energia que necessitam cuidados especiais para a proteção do operador. “Isso impede a realização de teste em tempo real, sendo que algumas dessas técnicas ainda geram resíduos químicos”, informa.

Aplicação

A espectroscopia de emissão óptica com plasma induzido por laser, do termo em inglês Laser-Induced Breakdown Spectroscopy (LIBS), é uma técnica analítica bem conhecida para análise de sólidos, líquidos, gases e aerossóis. Contudo, Nicolodelli explica que a técnica apresenta uma menor sensibilidade quando comparada com outros métodos espectrométricos. Uma das aproximações para suprir essa limitação é o uso da configuração pulso duplo, no inglês double pulse (DP). “Dessa forma, a sensibilidade do LIBS pode ser aprimorada devido ao melhor acoplamento da energia do laser no alvo e no material ablacionado, levando a uma produção mais eficiente de átomos do analito no estado excitado”, afirma.

Contribuição na análise

O gerenciamento e a destinação dos resíduos sólidos das cidades brasileiras estão entre os maiores problemas enfrentados pelos governos municipais, estaduais e federal. Aterros sanitários, embora se apresentem como solução, são também um motivo de preocupação das autoridades, porque são carregados de metais pesados tóxicos como mercúrio, chumbo, cobre, cromo e arsênio.

Esses fluídos contaminam não só o solo, mas os lençóis freáticos e são prejudiciais à saúde humana. O mercúrio, por exemplo, pode provocar problemas neurológicos e má-formação de fetos e comprometer o desenvolvimento infantil.

Por isso, a legislação brasileira determina que as concentrações ambientais aceitáveis de mercúrio em chorume de aterro sanitário não podem ultrapassar 0,5 ppm (parte por milhão), mas muitas vezes chegam a 160 ppm.

Assim, cabe aos administradores de aterros sanitários fazer a coleta, a drenagem e o tratamento do chorume antes de serem despejados no meio ambiente, sob o risco de multas e até a paralisação dos serviços do aterro.

A técnica LIBS contribui nessa etapa do processo que analisa e fornece dados, assegurando os níveis permitidos por lei. O professor Carlos Renato Menegatti conta que, como já conhecia o trabalho desenvolvido pela pesquisadora Débora Milori na aplicação de LIBS para análise de solos, sugeriu o estudo da técnica para avaliar metais pesados em chorume de aterro sanitário.

A pesquisa teve início no final de 2015 e em setembro de 2016 Menegatti relata que já era possível observar os primeiros resultados positivos da aplicação de LIBS. Segundo ele, foram avaliadas dez amostras sólidas superconcentradas, produzidas por meio do processo de destilação do percolado líquido, o chorume.

Detectar e avaliar os níveis de mercúrio não é uma tarefa fácil. “O mercúrio é um elemento volátil, pesado, e a heterogeneidade das amostras acaba criando um desafio maior para sua quantificação. Porém, com a técnica LIBS, foi possível detectar e quantificar os níveis de mercúrio”, explica.

Os testes foram realizados com base em amostras oriundas do Aterro Sanitário de Cachoeira Paulista, interior de São Paulo, que reúne resíduos sólidos de parte dos municípios do Vale do Paraíba. Milori explica que as amostras de chorume foram preparadas com concentrações conhecidas de mercúrio para a construção da curva de calibração da técnica. “Baseando-se nessa curva, estimou-se que o limite de detecção do sistema LIBS utilizado foi de 76 ppm”, lembra.

O professor Bruno Spolon Marangoni, que auxiliou o grupo na análise dos espectros obtidos das amostras de chorume, conta que a técnica LIBS permitiu uma quantidade enorme de informações sobre outros elementos presentes na amostra e suas composições atômicas.

Entusiasmados com os resultados obtidos com o mercúrio, os pesquisadores já trabalham com outros metais, como chumbo, arsênio e cádmio. Segundo Menegatti, a expectativa é tentar melhorar os níveis de detecção.

Reconhecimento internacional

O artigo “Análise semiquantitativa de mercúrio em lixiviados de aterro usando a espectroscopia de emissão óptica com plasma por dois pulsos de laser” foi destaque no Applied Optics. A Sociedade Óptica (OSA) chegou a enviar uma carta à pesquisadora Débora Milori destacando a importância da pesquisa. “Não é comum na comunidade científica uma carta de parabenização pelo impacto causado pela publicação de um artigo. A carta recebida da OSA nos deixou muito orgulhosos, pois é um reconhecimento de uma sociedade centenária e internacional de óptica sobre a qualidade do trabalho realizado pelo grupo”, pontua a pesquisadora.

 

fonte: Embrapa