Mas calma: o achado não quer dizer que a deficiência da substância causa o transtorno
A deficiência de vitamina D é uma condição de saúde global, que tem sido relacionada a várias condições psiquiátricas e comportamentais, incluindo o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)
Além disso, alguns estudos têm mostrado que a suplementação de vitamina D pode melhorar os sintomas do TDAH , quando utilizada em conjunto com os tratamentos clássicos.
Uma pesquisa conduzida por mim e pelo psiquiatra Fernando Neves, liderada pela Profa. Verônica Contini e publicada no Nutritional Neuroscience , explorou como genes relacionados à vitamina D podem influenciar também no surgimento de desatenção, hiperatividade e impulsividade.
O estudo envolveu dois grupos de indivíduos adultos, e é produto de uma colaboração científica entre pesquisadores da Univates, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) e da Universidade de São Paulo (USP).
Nós analisamos tanto o impacto de genes específicos, envolvidos na metabolização da vitamina D , quanto da variabilidade do genoma que modula os níveis desse hormônio no sangue. Para isso, calculamos um escore poligênico, um cálculo que estima os níveis de vitamina D de acordo com todas as variantes do nosso genoma que impactam nessa medida.
Como resultado, encontramos uma relação entre menores escores poligênicos para vitamina D e mais sintomas de desatenção . Para hiperatividade, a associação foi na direção oposta : a arquitetura genética relacionada a menores níveis de vitamina D estava associada à menor hiperatividade.
Esse estudo abre novas perspectivas sobre como a substância pode influenciar no transtorno e enfatiza a necessidade de mais pesquisas para explorar essas complexas interações. Vale destacar que a pesquisa não sugere que a deficiência de vitamina D cause o TDAH , mas sim o que chamamos de pleiotropia , onde os genes estão relacionados a várias características, e não só a uma, como vemos nas famosas ervilhas de Mendel.
Esse conceito é muito importante, pois muitas pessoas confundem pleiotropia com causalidade. Em outras palavras, alterações genéticas que já nascem com a gente podem, ao mesmo tempo, desregular os níveis de vitamina D e aumentar sintomas de depressão , ansiedade, desatenção, hiperatividade, etc.
Os dados disponíveis na literatura científica também não apoiam a ideia de que o déficit seja a causa do TDAH. De forma geral, os resultados sugerem que a substância se correlaciona de forma diferente com cada sintoma, inclusive em indivíduos sem diagnóstico clínico
Devido à heterogeneidade clínica, muitos estudos podem perder nuances importantes do transtorno, como sintomas mais ou menos exacerbados em cada indivíduo.
Pesquisa brasileira sobre TDAH busca voluntários
Atualmente, sigo investigando o TDAH como pesquisadora de pós-doutorado na USP, na Rede de Pesquisa TDAH Brasil. O estudo desenvolvido pela rede envolve importantes financiamentos nacionais e internacionais, e avalia a diversidade genética do transtorno em brasileiros, bem como suas relações com sucesso acadêmico, profissional e outros transtornos psiquiátricos
No momento, precisamos de voluntários do sexo masculino , pois tivemos anteriormente uma maior participação e engajamento de mulheres. Interessados de São Paulo e região metropolitana devem entrar em contato pelo e-mail tdahbrasil@usp.br, e os de Porto Alegre e região metropolitana pelo e-mail tdahbrasil@ufrgs.br.
Os trabalhos citados neste artigo tiveram apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
*Cibele Edom Bandeira é bióloga e pesquisadora em Genética e Biologia Molecular da Universidade de São Paulo (USP)