Equipe de cientistas brasileiros explorou alternativas de manejo de irrigação que podem otimizar a forma como o arroz é cultivado
O arroz é um dos alimentos mais consumidos no mundo, essencial para a segurança alimentar de milhões de pessoas. Porém, o cultivo tradicional de arroz, em áreas constantemente alagadas, está associado a altas emissões de metano (CH4), um gás de efeito estufa que contribui significativamente para o aquecimento global . Agora um estudo pioneiro, liderado por pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em parceria com a Embrapa e com apoio internacional da University of Florida, está mudando esse cenário.
Utilizando o modelo agrícola mais usado no mundo, o DSSAT, uma equipe de cientistas brasileiros explorou alternativas de manejo de irrigação que podem otimizar a forma como o arroz é cultivado. Pela primeira vez, o modelo DSSAT foi testado para simular emissões de metano em sistemas de arroz sob diferentes práticas de irrigação em condições subtropicais no Brasil. Além disso, os pesquisadores aprimoraram o código do modelo, ajustando parâmetros relacionados ao solo e ao ciclo da água , permitindo maior precisão na simulação das emissões em condições específicas, como a irrigação intermitente e a irrigação por aspersão.
O estudo de campo foi realizado pela Embrapa ao longo de quatro safras consecutivas (2019–2023) na região de Capão do Leão , no Rio Grande do Sul . Durante esse período, os cientistas testaram duas práticas de manejo hídrico principais: irrigação por inundação ou irrigação intermitente
Os resultados mostraram que a irrigação intermitente pode reduzir as emissões de metano em até 80%, dependendo das condições do solo, sem prejudicar a produtividade do arroz. Essa técnica, amplamente estudada em outros países, foi adaptada para as condições específicas das áreas subtropicais brasileiras, com solos caracterizados por alta densidade e baixa drenagem natural.
Esse estudo também avaliou a irrigação por aspersão como uma alternativa ainda mais sustentável. Em cenários de longo prazo, simulando 30 anos de dados climáticos históricos , os pesquisadores descobriram que a irrigação por aspersão, acionada quando o solo atinge 50% de sua capacidade de água disponível, apresentou os melhores resultados. Essa prática não apenas reduziu significativamente as emissões de metano, mas também economizou água e manteve altos níveis de produtividade.
O índice de produtividade água-metano (CWMP), desenvolvido pelos pesquisadores para medir a eficiência entre o uso de água, produtividade e emissões, mostrou que a irrigação por aspersão foi 52% mais eficiente em relação aos sistemas tradicionais. Isso representa um avanço considerável para a sustentabilidade na produção de arroz, especialmente em um contexto de mudanças climáticas e escassez de recursos hídricos.
Além dos resultados práticos, o estudo foi um marco científico. A equipe de cientistas não apenas utilizou o DSSAT para explorar essas questões, mas também realizou ajustes fundamentais no código do modelo, incluindo a calibração para simular emissões de metano em condições não alagadas, algo que nunca havia sido feito antes. Esses ajustes incluíram a otimização de parâmetros como a regeneração do solo após a drenagem e a fração de poros preenchidos por água que ativa a produção de metano
Esses resultados científicos têm implicações globais, pois colaboram com uma base científica sólida para o uso de modelos agrícolas como uma ferramenta para gerenciar o impacto das práticas de manejo na sustentabilidade dos sistemas agrícolas, não apenas no Brasil, mas também em outras regiões subtropicais e tropicais. A colaboração com instituições internacionais, como a University of Florida, reforça a relevância do estudo no cenário global. Esse estudo contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).