Em matéria de pecuária de corte, o Brasil pode ser definido hoje como um país que tem gente que nunca viu bife para um rebanho ao deus-dará que tem boi que nunca viu gente. A exclusão da carne bovina na dieta alimentar da semana ainda é de seis brasileiros em cada dez. E o rebanho nacional já ultrapassa 175 milhões de cabeças. Exatamente um boi para cada habitante. Cadê o meu?
Quem conta bois, vacas e rebentos nos pastos e nos currais? A prospecção por sensoriamento remoto via satélite. A mesma que sabe contar quantas sacas de café estamos colhendo neste ano-safra ou quantos hectares de terra estão cobertos de soja ou de milho.
A idéia de bois espionados do céu faz o sinal dos tempos. Já temos bois rastreados e bois não-rastreados nas raias do mercado. Os primeiros têm passaporte visado para as mesas da União Européia.
Desde o dia 15, o Ministério da Agricultura só carimba certificado sanitário para animais registrados no estreante Sistema de Identificação e Certificação de Origem Bovina - que atende pela doce sigla Sisbov, mais chegada a herói de videogame.
A rastreabilidade do gado bovino tornou-se exigência com data marcada para todos os países que disputam o obeso mercado da União Européia. Países ainda não de todo refeitos do trauma cinematográfico da vaca louca, a deles. Com vocação para principal fornecedor dos europeus e já na condição de maior exportador do mundo, o Brasil cuidou rapidinho de fazer essa lição de casa.
Já apelidada de RG do Boi, a rastreabilidade do rebanho ainda está na primeira infância. Mas já responde pela instalação de 19 empresas certificadoras para esse que tende a ser um mercado cativo de meio bilhão de reais. A certificação tornou-se obrigatória. Os exportadores foram os primeiros a buscar o registro no Sisbov. Para as vendas externas, em 2003, estamos abatendo 5,2 milhões de cabeças.
O serviço patina nesta decolagem por obra da acomodação da maioria dos criadores abaixo de mil cabeças. Eles ainda enxergam no certificado de rastreabilidade uma frescura européia que se traduz por uma nova despesa. Bem ao contrário, trata-se de investimento reprodutivo. No mercado interno, semana passada, a cotação da arroba do rastreado estava acima da cotação do não-rastreado.
O certo é que não há futuro para rebanhos fora do Sisbov. A moda vai pegar também entre os consumidores brasileiros, cada vez mais informados e mais exigentes. A "cultura da rotulagem" aproxima-se dos bois no pasto num Brasil que acaba de iniciar a busca, pela Fapesp, do genoma do boi. No caso, um zebuíno da raça Nelore. Uma corrida contra o genoma do boi americano. O nosso, com dotação de US$ 3 milhões. O deles, US$ 50 milhões.
Notícia
Folha de Londrina