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Caverna de Rondônia abriga novas espécies de carrapato (1 notícias)

Publicado em 06 de setembro de 2010

Por Valéria Dias, da Agência USP

Pesquisadores da USP encontraram novas espécies de carrapatos em uma caverna na selva amazônica, no Parque Natural Municipal de Porto Velho (conhecido como Parque Ecológico), em Rondônia. Das cinco espécies encontradas, duas são totalmente inéditas para a ciência: a Nothoaspis amazoniensis (descrita em 2010) e a Carios rondoniensis (descrita em 2008).

Das outras três espécies encontradas, duas foram descritas na caverna em 2008: Antricola guglielmonei e Antricola delacruzi, sendo que ambas já haviam sido relatadas em Sergipe. Já a outra espécie, Ornithodoros marinkellei, foi encontrada pela primeira vez no Brasil: anteriormente ela já havia sido descrita na Colômbia, no Panamá e na Venezuela.

"Carios rondoniensis", "Nothoaspis amazoniensis" na parede da caverna e "Ornithodoros marinkellei" são exemplos de reversão de parasitismo

De acordo com o professor Marcelo Bahia Labruna, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP, nos últimos dez anos já foram coletadas cerca de 30 espécies de carrapatos em Rondônia. "Este número representa metade da fauna de carrapatos existente em todo o País. Em virtude das descobertas em Rondônia, já produzimos, ao longo desses anos, cerca de 15 artigos científicos sobre os carrapatos e as doenças relacionadas a eles", completa. Esses dados mostram o potencial para pesquisa envolvendo a descoberta.

As pesquisas foram iniciadas no ano 2000 por meio de um Projeto de Auxílio-Pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Também participa da iniciativa o professor Luis Marcelo Aranha Camargo, do Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, coordenador do Centro de Pesquisa Avançada da USP, no município de Monte Negro, em Rondônia.

De acordo com Labruna, a caverna é habitada por uma grande quantidade de morcegos. É um local pequeno e escondido pela mata fechada da selva amazônica. A temperatura média anual gira em torno de 37 graus Celsius, tanto durante o dia como à noite. Para entrar nela, é necessário usar máscaras químicas, pois a grande quantidade excrementos de morcegos (guano) presentes no local deixa o ar ambiente cheio de amônia impedindo que se entre lá sem o uso devido de equipamentos.

"Estamos estudando a fisiologia desses carrapatos para entendermos como eles conseguem sobreviver em um ambiente tão hostil", relata o pesquisador. O que já se sabe é que eles se alimentam do sangue dos morcegos apenas durante a fase de larva. Quando se transformam em adultos, eles não se alimentam de sangue e passam a viver no chão da caverna. "Apesar de esta característica já ter sido descrita em outros carrapatos, ela é bastante rara", diz.

Reversão de parasitismo

Segundo Labruna, essas novas espécies são bastante interessantes para a acarologia básica, pois são exemplos vivos de reversão de parasitismo. "A maioria dos carrapatos se alimenta em todas as fases da vida do sangue do animal hospedeiro", explica. O professor cita a teoria da evolução das espécies para lembrar que os carrapatos nem sempre foram parasitas. Eles somente passaram a ter relações de parasitismo com hospedeiros a partir de um determinado momento da evolução: antes tinham uma vida livre do parasitismo.

Por este motivo, as espécies encontradas na caverna se tornam tão interessantes para pesquisadores de várias partes do mundo, do ponto de vista evolutivo, por se alimentarem do sangue dos morcegos apenas durante a fase larval. "A glândula salivar desses ácaros é atrofiada", conta o pesquisador. Segundo ele, ainda não se sabe qual é a base da alimentação desses carrapatos. Também não foi possível criá-los em laboratório.

A caverna é um local bastante hostil, habitada por morcegos, e onde o ar é repleto de amônia, mas carrapatos se adaptaram ao lugar

Desmatamento

Labruna observa que a descoberta desses carrapatos abrem grandes perspectivas para as pesquisa na área. Entretanto, ele faz um alerta: a destruição da floresta amazônica pode prejudicar essas descobertas. "Começamos a coleta de carrapatos em outras regiões de selva no ano 2000. Desde então, vários desses lugares foram totalmente desmatados, dando origem a pastagens para criação de gado e a ocupações ilegais", alerta o pesquisador.

O professor conta que os morcegos se alimentam à noite de insetos da floresta. Quando ocorre o desmatamento, a população de insetos entra em desequilíbrio. Isso pode ocasionar a extinção desses insetos e, consequentemente, a extinção dos morcegos e de carrapatos. "Ainda existem muitas espécies para serem descobertas. O progresso é sempre bem vindo, mas é preciso destacar a importância da conservação das matas para a ciência", finaliza.

Mais informações: (11) 3091-1394 / 7701 ou email labruna@usp.br

(Envolverde/Agência USP de Notícias)