Um homem com câncer, submetido anteriormente a quatro linhas de terapia sem sucesso, obteve diagnóstico de remissão da doença após passar por um tratamento até então inédito no Brasil. Vamberto Luiz de Castro, de 62 anos, teve retiradas de seu sangue células do sistema imune que foram geneticamente alteradas em laboratório e devolvidas a seu organismo para atacar o tumor.
A técnica, chamada de terapia de células CAR-T, foi implementada de maneira integral no país pela primeira vez no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (SP), vinculado à USP (Universidade de São Paulo). Vamberto de Castro, um funcionário público aposentado de Belo Horizonte, descobriu um linfoma há dois anos e não reagiu bem a intervenções por quimioterapia e radioterapia. Ele foi selecionado para a terapia experimental.
O paciente foi incluído em um projeto que formou uma equipe para uso de CAR-T no Centro de Terapia Celular, do hemocentro ligado ao hospital. As células de Castro foram alteradas em esforço coordenado pelos médicos Dimas Tadeu Covas (também diretor do Instituto Butantan) e Renato Cunha, do Laboratório de Terapia Celular Avançada, da USP de Ribeirão Preto.
O trabalho, que envolveu apenas instituições públicas, ofereceu ao paciente uma classe de terapia que, no sistema privado, costuma ultrapassar US$ 1 milhão, quando somados os custos do material terapêutico (acima de US$ 400 mil) e da expertise médica necessária.
— Não gastamos nem 10% desses 400 mil dólares, porque a tecnologia é toda nossa, e não pagamos royalties. A gente quer ter o nosso produto validado para uso, mas para licenciar pelo SUS — diz Renato Cunha.
O projeto em Ribeirão Preto foi bancado com recursos da Fapesp (Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do CNPq, um órgão federal.
Outros dez pacientes serão selecionados
A Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo informou que outros dez pacientes devem ser selecionados para o projeto nos próximos seis meses. A indicação clínica da terapia hoje é para tipos específicos de leucemia e linfoma que respondem bem a ela. Serão escolhidas pessoas que reagiram mal a outras terapias e já tenham entrado no perfil de uso "compassivo" do novo tratamento. Um ensaio clínico controlado, no qual um grupo tratado com CAR-T é comparado ao outro em terapia convencional, ainda não se iniciou.
As células CAR-T são um tipo de imunoterapia, que usa o sistema imune, a linha de defesa do corpo humano, para atacar o câncer. A terapia é feita por meio da avaliação das características moleculares do câncer a ser combatido, extração dos linfócitos-T do paciente e alteração do DNA dessas células para que identifiquem o tumor adequadamente e o ataquem. Castro, o primeiro brasileiro submetido à terapia, deve obter alta na semana que vem, e continuará a ser monitorado pelos médicos.