Pesquisa liderada por brasileiros e divulgada na revista Nature Communications propõe uma estratégia combinada de combate ao câncer de mama que tem como alvo duas proteínas essenciais para a progressão do tumor: a HuR e a enzima glutaminase.
As necessidades metabólicas das células tumorais estão associadas a um grande consumo de glutamina para a produção de energia, e o primeiro passo é a sua conversão em glutamato. Isso é feito pela ação da enzima glutaminase, que possui três isoformas (GAC, KGA e LGA) que se relacionam de forma diferente em relação à progressão tumoral. Por isso mesmo, apontam os pesquisadores, é um bom alvo para tratamentos.
“A glutaminase é importante pois transforma a glutamina em compostos que alimentam o ciclo de energia e de produção de insumos das células – essencial, portanto, para células cancerosas, que têm um metabolismo muito ativo para sustentar seu rápido crescimento”, explica o pesquisador Douglas Adamoski, primeiro autor do artigo e bolsista de doutorado da FAPESP.
Agir sobre a glutaminase, portanto, reduzindo sua ação, é importante foco de tratamentos. Porém, o grupo de pesquisadores combinou outra estratégia e melhorou ainda mais os resultados. O trabalho inova ao focar em como o metabolismo do RNA da glutaminase é regulado pela proteína HuR.
“Outro ponto importante do trabalho é que explora de maneira inédita o papel de HuR no controle mais amplo do metabolismo celular. No trabalho, mostramos como essa proteína regula o metabolismo das células tumorais, afetando genes metabólicos importantes. Isso inclui vias como glicólise, ciclo de Krebs e síntese de ácidos graxos, por exemplo”, destaca Sandra Martha Gomes Dias, pesquisadora do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) apoiada pela FAPESP em estudos diversificados que destrincham o papel da glutaminase na atividade tumoral.
Níveis elevados de HuR estão correlacionados ao aumento da expressão de genes que apoiam a proliferação e a sobrevivência das células de câncer, sugerindo mau prognóstico do paciente. Assim, a regulação dessa proteína também pode ser um bom alvo terapêutico. “Inibidores de pequenas moléculas de HuR já foram identificados e novas formulações para sua entrega direcionada a células tumorais foram desenvolvidas com atividade anticâncer promissora”, ressalta Dias.
Isoformas
Os pesquisadores mostraram que a proteína HuR, que é frequentemente superexpressa em vários tipos de câncer, desempenha um papel vital na escolha da produção de diferentes formas da enzima glutaminase. “Quando a HuR está em níveis reduzidos, aumenta a produção da isoforma GAC – que transforma glutamina em glutamato mais rapidamente”, diz Adamoski.
Ao reduzir a expressão da HuR, o grupo conseguiu, então, diminuir a isoforma KGA e aumentar a GAC, tornando o metabolismo das células cancerosas ainda mais dependentes da glutamina. “Ao reduzir a HuR e, ao mesmo tempo, inibir quimicamente a glutaminase, conseguimos diminuir significativamente o crescimento e a invasão das células de câncer de mama”, diz Adamoski.
Estiveram envolvidos no estudo pesquisadores ligados ao CNPEM, à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Washington University School of Medicine (Estados Unidos), University of Medicine Iuliu-Hatieganu (Romênia) e Universidade do Texas (Estados Unidos).
A linha de pesquisa contou também com outros apoios da FAPESP (20/16030-0, 14/18061-9, 20/09535-8 e 16/06625-0).
As descobertas sugerem que uma estratégia terapêutica combinando a inibição da glutaminase e da HuR pode ser uma abordagem promissora para o tratamento do câncer de mama. O trabalho vem na sequência de outro estudo relevante apoiado pela FAPESP, do qual também participaram Sandra e Adamoski, com artigo publicado na Nature Structural & Molecular Biology.
Esse trabalho prévio ajudou a elucidar as estratégias da glutaminase para ter maior atividade metabólica, que é pela formação de filamentos dentro da mitocôndria. Foi uma descoberta importante, então, porque a desregulação do metabolismo tumoral desempenha um papel crucial para a progressão do câncer e metástases, e é associada a um pior prognóstico em pacientes com câncer de mama.