Segundo pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da USP, consumo moderado da bebida é benéfico à saúde
O consumo habitual de mais de três xícaras de café de 50ml por dia aumenta em até quatro vezes a chance de pessoas geneticamente predispostas apresentarem pressão arterial alta. É o que afirma estudo desenvolvido na Universidade de São Paulo e publicado na nova edição (referente a agosto/19) da revista Clinical Nutrition, jornal oficial da ESPEN (European Society for Clinical Nutrition and Metabolism, ou Sociedade Europeia para Nutrição Clínica e Metabolismo).
Estudo anterior mostra, por outro lado, que o consumo moderado de café (de uma a três xícaras por dia) tem efeito benéfico sobre alguns fatores de risco cardiovascular – particularmente a pressão arterial, assinala a Agência Brasil.
A principal autora do estudo, Andreia Machado Miranda, hoje pós-doutoranda no Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da USP, explica que essa conclusão chama atenção para a importância da relação entre o consumo de café e a prevenção da pressão alta. “Como a maior parte da população não tem ideia se é predisposta ou não para desenvolver a pressão alta, o ideal é que se faça um consumo moderado de café. Até onde nós sabemos, pelos nossos estudos e por outros já publicados, esse consumo moderado é benéfico para a saúde do coração”, apontou.
Foram considerados como pressão arterial elevada valores acima de 140 por 90 milímetros de mercúrio (mmHg), ou “pressão 14 por 9” na linguagem popular.
A pesquisa, apoiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), é baseada em dados de 533 pessoas entrevistadas no Inquérito de Saúde do Município de São Paulo (ISA), de 2008. O levantamento estadual obteve dados sociodemográficos e de estilo de vida, como idade, sexo, raça, renda familiar per capita, atividade física e tabagismo por meio de um questionário aplicado a mais de 3 mil participantes.
Para a pesquisa desenvolvida por Andreia, foi utilizada uma mostra representativa de adultos e idosos.
“Com todos esses dados, fizemos o estudo de associação entre pressão arterial, genética e influência do café. Foi aí que concluímos que indivíduos que tinham uma pontuação mais elevada no score, ou seja, que eram geneticamente predispostos [a pressão alta], e que consumiam mais de três xícaras de café por dia, tinham uma chance quatro vezes maior de ter pressão alta em relação a quem não tinha predisposição”, explicou a pesquisadora.
A escolha do café para avaliar essa associação se deu por ser uma das bebidas mais consumidas entre os brasileiros. A pesquisa aponta que ele pode ser protetor para a saúde do coração se usado de forma moderada, mas também pode ser vilão para pessoas predispostas a hipertensão e em doses exageradas. Segundo Andreia, isso ocorre porque o café é uma mistura de mais de 2 mil compostos químicos.
Cafeína
“A hipótese do nosso estudo é que mais de três xícaras podem aumentar as chances [de pressão alta] pela presença da cafeína. A cafeína está associada com a resistência vascular, ou seja, a dificuldade com a passagem do fluxo nos vasos, e também provoca vasoconstrição, que é a contração a nível dos vasos sanguíneos, o que dificulta a passagem do fluxo e tudo isso faz com que haja um aumento da pressão arterial”, explicou.
Os polifenóis, por sua vez, seriam os responsáveis pelas ações benéficas. “São compostos de origem vegetal que não são sintetizados pelo organismo, então precisam ser obtidos pela dieta. Eles têm elevado poder antioxidante, tem uma ação antitrombótica, que significa que impedem a formação de trombos nos vasos, e promovem uma melhoria da vasodilatação, ao contrário do efeito da cafeína”, elencou a pesquisadora.
Publlicado originalmente em agosto do ano passado, o artigo "The association between genetic risk score and blood pressure is modified by coffee consumption: Gene-diet interaction analysis in a population-based study", de Andreia Machado Miranda, Josiane Steluti, Marina Maintinguer Norde, Regina Mara Fisberg e Dirce Maria Marchioni, pode ser lido aqui (em inglês).
Nova etapa
A pesquisa de doutorado de Andreia Miranda foi orientada pela professora da FSP-USP Dirce Marchioni. Agora, no pós-doutorado, também com apoio da Fapesp, o objetivo é avaliar o efeito do consumo de café em pacientes portadores de doença cardiovascular – particularmente a síndrome coronariana aguda, causada por obstrução na artéria coronária, que irriga o coração.
Os pesquisadores vão avaliar, durante quatro anos, os dados de acompanhamento de 1.085 pacientes que sofreram infarto agudo do miocárdio ou angina instável e foram atendidos pelo Hospital Universitário da USP.